SABE DE UMA COISA?



Texto da tag "Escritor Convidado", escrito por: Jotabê
Publicado originalmente AQUI.
 
 
Preciso confessar uma coisa: eu interrompi o texto do post "Antenado" não só pela dor no pescoço (real!), mas também por não estar imaginando como terminá-lo (continuo sem saber), pois aquilo que o motivou é parecido com o desconforto causado por gases justamente quando se está prestes a ser condecorado com o título de "Sir" - afinal, não dá para peidar na frente da rainha!

Falando sério, o motivo talvez seja uma implicância boba, rabugice ou que nome queiram dar. Como já disse várias vezes, sou contra o radicalismo e o fundamentalismo, sejam eles de cunho religioso, comportamental ou ideológico. Por isso, desprezo os “donos da verdade”, desconfio das certezas absolutas, duvido das verdades eternas e abomino quem diz coisas do tipo “quem não está comigo está contra mim”.
 
Por isso, já vou começar matando o pau e mostrando a cobra (ou será o inverso?). Vocês, caros leitores e caras leitoras, conseguem identificar as imagens abaixo e perceber o que elas têm em comum? Eu sei que quem acessa esta bagaça é o suprassumo da cultura, mas, mesmo assim farei a identificação (acho que estou bajulando mais que devia!). Bora lá.
 


- primeira imagem: local no Paquistão onde existia a maior estátua de Buda do mundo, com 55 metros de altura e esculpida no século VI. Foi destruída com uso de explosivos pelo Talibã (havia mais uma estátua de menor tamanho, que foi também destruída). Só sobraram os nichos;
- segunda imagem: estátua vandalizada do Rei Leopoldo II, da Bélgica;
- estátua de Edward Colston, traficante de escravos, sendo jogada no rio, em Bristol, Inglaterra;
- estátua vandalizada de Winston Churchill, ex-primeiro-ministro da Inglaterra, eleito como "o maior britânico de todos os tempos em uma enquete feita pela BBC em 2002".
 
Motivos e alegações para o vandalismo:
- primeira imagem: segundo o Talibã, estaria havendo uma suposta “idolatria” às imagens;
- segunda imagem: o monarca belga "é conhecido pelo genocídio de centenas de congoleses no período em que o país africano era uma colônia da Bélgica".
- terceira imagem: acho que nem precisaria explicar, não é mesmo? "Colston foi um traficante de escravos que foi membro do Parlamento Britânico e responsável pela morte de mais de 19 mil negros nas Américas e Caribes" (a estátua de Colston foi retirada da água e será levada para um museu);
- quarta imagem: "Churchill nunca escondeu sua crença na 'supremacia branca' e considerava os indianos uma 'raça inferior'. Ele também defendeu o uso de 'gás venenoso' contra curdos, afegãos e 'tribos não civilizadas'".
 
Independente de concordar ou não com as motivações alegadas, acho que está claro que essas atitudes têm uma raiz comum. Meu amigo Pintão dizia que não devemos julgar com nossos olhos de século XX (no caso dele) ações e comportamentos de séculos anteriores, especialmente em se tratando de crença religiosa ou mudança nos costumes. E eu nunca deixei de concordar com esse pensamento.
 
Para mim, o maior veneno social é formado por preconceitos de todos os matizes e origens e as atitudes radicais inspiradas nesses preconceitos. O que aconteceu com as estátuas do Buda é um caso especialíssimo onde a ignorância, o radicalismo e o preconceito religiosos agiram para destruir um patrimônio cultural da humanidade. Quanto aos outros exemplos, acho razoabilíssimo e justo que toda forma de racismo seja combatida com firmeza, mas discordo quando alguém resolve destruir, vandalizar ou mesmo remover bustos e estátuas de pessoas que tiveram comportamentos condenáveis aos olhos de hoje.
 
Para mim, monumentos contam histórias, cronometram, balizam e explicam as épocas em que surgiram. Por isso, não dá, em nome de um revisionismo exacerbado, tentar reescrever o passado e corrigir injustiças antigas simplesmente "cancelando" estátuas e bustos de quem as cometeu. Sinceramente, acho até infantil essa sanha de passar a limpo as tragédias de épocas passadas.
 
Fiquei assustado ao saber que uma estátua de Cristovão Colombo foi retirada pela prefeitura de São Francisco, Califórnia, do local onde estava instalada. Motivo? O colonizador espanhol teria sido "responsável pelo extermínio de milhares de indígenas nas Américas". Juro que eu não sabia que o Colombo estava com essa bola toda! Se ainda fosse o Cortez ou o Pizarro, eu até entenderia, mas, Colombo? Acho que preciso estudar um pouco mais de História. Parece que há também uma bronca em São Paulo com a estátua do bandeirante Borba Gato. Enfim...
 
Para mim, a atitude mais razoável e didática seria manter as estátuas onde e como estão, apenas acrescentando no pedestal uma placa indicando os crimes e injustiças cometidos por quem elas homenageiam. Mais que isso é revanchismo tolo e rancor represado. 
 
Para finalizar este post mal alinhavado, queria comentar uma (re)descoberta que fiz. Outro dia, em um programa de um canal a cabo, (re)descobri as sete maravilhas do mundo moderno e fiquei novamente surpreso com a inclusão nessa lista do Cristo Redentor do Rio de Janeiro. Para mim, As outras “maravilhas” são muito mais maravilhosas (devo ter complexo de vira-lata). Por isso, fiz até um ranking das sete escolhidas:
 
1- Ruínas de Petra – Jordânia
2- Machu Picchu – Peru
3- Coliseu – Itália
4- Grande Muralha da China – China.
5- Chichén Itzá – México
6- Cristo Redentor – Brasil
7- Taj Mahal – Índia
 
O lugar onde a estátua do Cristo foi instalada tem uma paisagem deslumbrante, característica comum a vários lugares da cidade, pois o que o Rio mais esbanja são suas paisagens espetaculares. (mas nunca é demais lembrar a frase de Elizabeth Bishop, poeta inglesa que viveu por mais de vinte anos no Rio: “O Rio de Janeiro não é uma cidade maravilhosa, é uma paisagem maravilhosa para uma cidade”). Por isso, apesar da imponência do Cristo Redentor, acredito que o “combo” estátua-paisagem pode ter influenciado em sua escolha.

Independente disso, se um dia este país virasse uma teocracia não cristã, você acharia razoável que alguém pichasse a estátua, pedisse a sua retirada ou, em último caso, tentasse explodi-la? Imagino que a resposta é um categórico "Não!" Pois é, guardadas as devidas proporções, é esse sentimento que eu tenho ao ver ações de vandalismo de cunho ideológico-comportamental contra monumentos que, afinal, são patrimônio cultural de toda uma cidade, estado ou país, não apenas de quem resolveu fazer um ajuste tardio de contas. E agora chega, pois o pescoço está doendo de novo.
 



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