Míriam Lane

Míriam Lane
Às vezes, até parece que eu e o Jotabê, o filho pródigo do Blogson Crusoe (e também o pai e, quiçá, o espírito santo), ficamos disputando para vermos qual de nós é o mais velho. Ou, pelo menos, para vermos quem de nós conhece mais velharias, detém mais cultura inútil das antigas.
Em um comentário feito na postagem Brightburn, Jotabê elogia minhas reflexões sobre o bom mocismo do Super-Homem etc e, ao final, se diz do tempo em que a Lois Lane era Míriam Lane.
Pois eu também sou do tempo em que Lois era Míriam. Li muito gibizinho do Super-Homem, publicados pela lendária EBAL (Editora Brasil-América Limitada), em que a amada do homem de aço era tratada por Míriam Lane.
Tanto que, quando da estreia de Super-Homem, o Filme, o clássico de 1978, com Christopher Reeve, eu muito estranhei - e muito me incomodou - aquele nome que surgia nas legendas sempre que alguém se dirigia ou se referia à repórter mais gostosa do Planeta Diário : Lois Lane. Cheguei a pensar que fora um erro do tradutor, ou do cara que digitara as legendas - que nas décadas de 1970 e 1980, mesmo que o filme tivesse um público infanto-juvenil, não tinha essa moleza que tem hoje de versão dublada, não; a molecada tinha que ler o tempo todo - ainda bem.
Então, assistindo ao filme, sentado em um dos degraus acarpetados em vermelho do saudoso Cine Bristol, entre duas fileiras de suas poltornas, pois os seus mais de 700 lugares estavam ocupados, apurei meus ouvidos e "vi" que o nome dito pelos atores era este mesmo, Lois. 
Lois nunca fora Míriam. Foi um soco no estômago. Uma das primeiras de minhas jovens surpresas a cair. O tradutor do filme não errara em seu ofício; aliás, neste caso, ele nem mesmo o praticara, ele a nada tinha traduzido, apenas mantido o nome verdadeiro da personagem, Lois.

A equipe da EBAL é que se metera a "traduzir" Lois para Míriam.

Muito tempo depois, alguém me disse, ou eu li em algum lugar, que o rebatismo de Lois para Míriam se dera pela preocupação dos editores da época de que o nome da repórter, incomum para nós, brasileiros, pudesse vir a ser confundido com Luís. Será que os editores pensaram que tal confusão pudesse levantar suspeitas e aleivosias a respeito da masculinidade, da macheza do homem de aço?
Qual o nome da namorada do Super-Homem? - alguém pergunta. Luís! - um gaiato responde. Pããããããta que o pariu!!!
"De viado, já basta o Batman" - posso imaginar o editor a justificar sua decisão -, "bota Míriam e pronto". É bem verdade que poderia ter sido mudado para Luísa, mas, enfim...
Se não me engano - e aqui, embora ele nem fosse nascido à época, o Ozymandias Realista pode me ratificar ou me retificar -, Míriam só virou Lois por definitivo, em terras brasileiras, lá pelos meados da década de 80, acredito que em 1984. Quando a Editora Abril abraçou vários títulos da DC Comics e a partir do evento da Crise nas Infinitas Terras, uma maxissérie que teve a intenção de organizar o universo DC e que, na minha opinião, só o bagunçou ainda mais. Em 1984, Míriam Lane morreu, e ressurgiu como Lois Lane.
Lois Lane
Mas o que, provavelmente, muito pouca gente sabe, acho que nem o Jotabê, é que existiu mesmo uma Míriam Lane. Repórter e radialista. E brasileira.
Mírian Cléa dos Santos Tavares Barcelos Garcia, natural de Muzambinho (MG), tornou-se em Míriam Lane e comandou por anos um programa noturno na rádio Jovem Pan da cidade de São Paulo. Míriam Lane era uma das poucas vozes femininas nas rádios FMs da década de 80.
E que voz, meus caros, que voz. Sensual sem ser vulgar, como se uma atendente de telessexo tivesse recebido educação suíça. Rouca e aveludada ao mesmo tempo. Uma voz que acolhia, abraçava, agasalhava. Um moletom, uma pantufa de voz, a de Míriam Lane. Míriam Lane muito fez companhia às minhas madrugadas insones e muito povoou as minhas fantasias eróticas de adolescente. 
Até que, numa triste noite (eu ainda de nada sabia), a rastrear a Jovem Pan no dial de meu velho rádio-gravador Sanyo - na época, eu morava em São José dos Campos, a 100 km da capital paulista, e só conseguia sintonizar a Jovem Pan à noite, quando o ar estava mais livre de interferências -, chegou-me a fatídica notícia : o programa de Míriam Lane não seria exibido naquela noite. Nem nunca mais.
Na flor de seus 21 aninhos, em janeiro de 1984, Míriam Lane fora assassinada em frente ao prédio em que residia. Lex Luthor, Brainiac, em vendeta contra o Super-Homem? Nada disso, meus caros. Estamos no Brasil. Um mero assaltantezinho de merda, mesmo. Um filho da puta rastaquera qualquer havia posto fim à vida de Míriam Lane.
Coincidência, Míriam Lane ter sido assassinada em 1984? No mesmo ano em que sua homônima dos quadrinhos deixou de ser Míriam para ser Lois Lane?

O que sei, tristemente, é que não houve, para a nossa Míriam Lane, um Super-Homem que a socorresse. Míriam Lane, em uma das duas únicas fotos que consegui achar na net.

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