Como virou tendência destacar apenas um breve recorte na vida de qualquer cinebiografado, o docudrama Hebe - A Estrela do Brasil, dirigido por Maurício Faria, a partir do roteiro de Carolina Kotscho, traz somente fatos ocorridos nos anos 1980, quando Hebe, com 40 anos de carreira, comprou briga contra a censura, os políticos corruptos, a igreja, os produtores e a televisão, para que tivesse a liberdade de falar o que pensasse e apresentar em seu programa, sempre ao vivo, quem ela quisesse, inclusive transgêneros, como Roberta Close. Nesse período de abertura censurada, ao sentir-se amordaçada e enquadrada em movimentos partidários, já que falava também dos menos favorecidos, clamou: A Hebe não é de direita! A Hebe não é de esquerda! A Hebe é direta!
Além dos atropelos da célebre apresentadora na frente e atrás das câmeras, na televisão, Hebe - A Estrela do Brasil expõe parcialmente um lado menos conhecido de Hebe Camargo (Andréa Beltrão, magnífica): a vida em família, onde o relacionamento harmonioso com o filho Marcelo (Carlos Horowicz) contrasta com a relação conturbada com o abusivo e ciumento marido Lélio (Marco Ricca). Também é tocante o registro sutil da sua solidão, nos bastidores dos holofotes, e a escassa vida social em meio a tanto luxo.
Hebe - A Estrela do Brasil não é um filme hilário, mas tem lá seus breves momentos de humor, num enredo por vezes pesado. A reconstituição de época é excelente. A montagem é ágil e os recortes fotográficos, com Hebe de costas, é genial. O elenco, assim como Andréa Beltrão, não imita, mas interpreta (por exemplo, Roberto Carlos ou Silvio Santos), o que valoriza a personificação. Uma vez que a Globo é a produtora, há que se louvar a liberdade aparentemente incontida das críticas de Hebe a ela e da citação dos canais Bandeirantes e SBT, palcos dos famosos programas. Se bem que não podia ser diferente se o que se busca e dar veracidade ao relato.
Enfim, esta pode não ser aquela cinebiografia ampla, geral e irrestrita, recheada de divertidas fofocas, que todo fã espera dos seus ídolos, mas vale pelo registro de seus dias mais emblemáticos, quando finalmente Hebe vence a hipocrisia política, religiosa e televisiva e conquista definitivamente o seu direito de dar voz a quem bem entendesse. O que não quer dizer que nas décadas seguintes sua vida tenha sido um mar de flores perfumadas.