COLEÇÃO THOR DE WALT SIMONSON - ROUND 1


Eu já vi falarem que na Marvel dos anos 80 houveram três séries bem expressivas onde um único artista desenhava e escrevia os roteiros, e acabaram sendo três das melhores séries que a editora já teve! Uma é o Quarteto Fantástico do John Byrne, outra o Demolidor do Frank Miller, e por último, o tema do post, o Thor de Walt Simonson. Desses três, o único que não recebeu nossa atenção foi o filho de Odin. A fase do Demolidor foi avaliada no especial do Frank Miller e do Byrne no round 2 do especial do Quarteto Fantástico. A revista do Thor foi uma das que Jack Kirby mais soltou sua imaginação na era de ouro da Marvel, competindo bem com a revista do Quarteto Fantástico. Mesmo havendo tantas adaptações da mitologia nórdica, a quantidade de invenções constantes desenhadas de forma maravilhosa e dramaticamente narradas pelo Stan Lee, ou seu irmão, o Larry Lieber, fizeram com que a versão kirbyana da mitologia nórdica se mantivesse cativante e inspirasse milhares de fãs. Um deles foi Walt Simonson, que pode ser visto na foto acima, dando risada com a Lady Sif no primeiro filme do Thor.


Simonson sabe ir bem na onda da mistura de mitologia medieval com space opera, e fica bem à vontade colocando alienígenas, como o famoso Bill Raio Beta, ao mesmo tempo que tenta incorporar mais elementos de como eram as histórias de Asgard nos contos nórdicos originais, como o Thor barbudo, o Ragnarok e outras questões. Enquanto o John Byrne infelizmente se demitiu da Marvel do nada deixando histórias incompletas, o Thor do Walt Simonson é uma longa série fechadinha em seus vários pontos, como o diabo do F. Miller, então poderemos ter o prazer de avaliá-la todinha para você!

POSTS DE ANÁLISE ANTERIORES



"Eu não tinha tantas ideias quanto Jack. Ninguém tem. Mas, definitivamente, queria começar minha fase em Thor com a maior quebra dramática com as edições anteriores que fosse possível." Walter Simonson

Além é claro, dos scans de Internet, essa série foi republicada na íntegra há muito tempo, e mesmo as edições usadas na Internet custam muito caro. A primeira linha da coleção Salvat publicou o início da série, mas faltava mais da metade, visto que são muitas edições. O encadernado se chamava "O Último Viking". Eis que recentemente, a própria Salvat republicou a série inteira em três volumes luxuosos que saíram de uma vez para compra exclusiva da Internet. O preço é bem salgado (e um tanto abusivo), dando 300 reais a coleção toda; mas o que não dá pra negar é que as histórias são um exemplo eficiente de histórias de aventura e fantasia. Essas últimas publicações foram recoloridas por Steve Oliff & Olyoptics 2.0, dando uma cara diferente.




A Balada de Bill Raio Beta (#337-340)

"O teu pai, ele não vai ficar nada feliz de ver outra pessoa usando tua roupa e carregando tua marreta."

A história já começa com um demônio cósmico de escalas divinas martelando uma espada gigantesca em uma bigorna. O som das batidas reverbera pelo infinito e, sem muitas explicações, fica subentendido que algo grande virá daquela criatura. Logo em seguida, somos levados para Terra, onde Nick Fury contata o poderoso Thor dizendo que tem uma missão que só o deus do trovão pode realizar. Se trata da intercepção de uma nave se aproximando da Terra em altíssima velocidade. A operação leva o loiro a entrar em combate contra Bill Raio Beta, o alienígena com cara de cavalo que viria a se tornar um coadjuvante eterno do Universo Marvel. Em pouco tempo, há um desfecho inesperado que você pode imaginar pela capa acima. Toda a sequência é baseada nas interações entre Thor e o alienígena, um personagem que é introduzido assim  de forma truculenta, quase aleatória, mas consegue ter uma boa história, bem divertida e com seus momentos de profundidade.


Já é bom aproveitar a deixa pra dizer que essas características se aplicam em toda a série. A trama tem vários momentos bem bobões de descontração, são partes realmente fanfarronas de brincadeira, assim como as partes épicas não se reservam muito antes de serem bem exageradas. O mesmo vale pro romance envolvendo algumas belas personagens femininas. É clichê como uma novela da Globo. Porém, as partes mais profundas são extremamente convincentes, e Simonson consegue te fazer passar por todas essas diferentes sensações de forma eficiente, o que torna a leitura tão satisfatória! O tom fabulesco também fica bem equilibrado com o de aventura espacial, provavelmente por isso sendo considerada a série definitiva do Thor junto com a de Jack Kirby.


Os personagens secundários de Asgard também vão sendo desenvolvidos desde o princípio. Lady Sif está em crise existencial buscando por lutas que sobreponham sua decepção amorosa. Balder, outrora corajoso, parece estar com um tipo de depressão ao retornar para Asgard de sua última jornada, as razões vão sendo explicadas pelo seu cômico colega Volstagg que conta o que aconteceu com ele. Loki e Lorelei por enquanto ficam nas sombras armando suas traquinagens enquanto Simonson nunca deixa o leitor esquecer que o demônio do espaço continua se preparando pra algo com um sinistro sorriso no rosto...



O Último Viking! (#341-344)

"Estranho, por um momento, senti como se ouvisse alguém chamar meu nome... Tal qual não ouço há mil anos."

Em uma história meio de transição, as tramas particulares dos personagens vão evoluindo. Thor precisa estabelecer uma nova vida na Terra com a ajuda de Nick Fury. Um velho inimigo, Fafnir, retorna, se mostrando muito forte. Também começa um novo romance, com a velha mocinha Jane Foster ficando esquecida. No meio disso, sem conseguir compreender como, Thor ouve baixo uma velha prece como fazia seu povo de vikings milênios atrás. É esse mistério que leva a emocionante "O Último Viking", que surpreende com muita sensibilidade e criatividade. Simonson junta um monstro gigante, um personagem secundário com uma necessidade dramática inteligente e consegue fazer uma história inesquecível! O inesperado é a forma que ele consegue utilizar a cultura religiosa dos vikings em uma trama que se passa no mundo moderno, mas nos apresentando as noções que um homem daquela época tinha sobre sua vida. As lutas, apesar de simples, também conseguem passar uma impressão épica.


Aqui as histórias já foram tão surpreendentes e divertidas que é difícil o leitor não ficar preso pra ver o que vem depois.


Malekith e os elfos negros! ( #345-348)

"A humanidade tem poucos inimigos tão letais, e nenhum deles supera o elfo negro em perversidade."

Aqui nos aproximamos mais da trama de Surtur, o demônio do espaço que vem preparando sua espada desde a primeira página da série. Quem vai ajudar o plano ainda não explicado do capetão é Malekith, líder dos elfos negros que havia sido exilado por Odin há muito tempo. Aqui é a estreia do personagem, mais um criado por Simonson após Bill Raio Beta. Thor está tendo problemas com uma feiticeira sedutora, o que atrapalha sua percepção. O deus do trovão se une a Roger Wilis, um americano médio de calça jeans, jaqueta e boné, ex-veterano de guerra que se compromete com a proteção da caixa do inverno eterno, que o líder dos elfos negros almeja usar. Saindo do meio termo para o plano completamente fantasioso, a trama do Balder vai recebendo cada vez mais atenção, alcançando pontos inesperados. O herói secundário chega a passar por percepções filosóficas abstratas, mostrando que o autor se comprometeu com a sua jornada de redenção, ficou realmente muito legal pra um personagem que estava em plano secundário.


O novo vilão dá muito trabalho para Thor e Roger, até que por fim a introdução acaba e Odin declara que começará a inevitável guerra contra Surtur.



Ragnarok & Roll! (#349-353)

"Asgard, lar dos poderosos deuses nórdicos, está vazia, com seus salões abandonados e ruas desertas..."

Odin reúne todo o elenco asgardiano para anunciar a batalha, mas antes ele explica a origem antiquíssima do inimigo em uma narrativa memorável, onde retorna ao tempo quando era jovem, ou nas palavras do próprio deus, quando o próprio céu ainda era jovem. A aventura é digna de ser chamada de guerra, visto que se estende por cinco edições! Meio que tudo trouxe até aqui, já que logo a primeira página apresentada por Simonson já tinha o demônio Surtur, personagem introduzido por Jack Kirby e Stan Lee que antes só aparecia de forma secundária, aqui sendo um exemplar algoz. Após todas as preparações das forças de guerra; Thor, Lady Sif, os Três Guerreiros e companhia se juntam na Terra a heróis como os Vingadores e o Quarteto Fantástico, tendo o Senhor Fantástico e o Tocha Humana participações mais importantes.


Em paralelo aos esforços de Thor, a ação é constantemente intercalada pelo o que está acontecendo com outros personagens nos diferentes pontos da guerra! Bill Raio Beta e os outros heróis são mostrados enfrentando os demônios de fogo em Midgard; Balder é enviado para persuadir Karnilla, que o deseja, para ajudar na batalha. Frigga, esposa de Odin, parte com as crianças de Asgard para se protegerem do ataque devastador. É tudo digno de ser comparado com batalhas épicas narradas por Tolkien em Senhor dos Anéis, inclusive contando com uma clara homenagem à série da Terra Média no final. Interessante pensar como na época ainda não haviam os filmes do Peter Jackson, que só sairiam umas duas décadas depois. Simonson sucede em prender o leitor e convencê-lo que se trata de um evento grandioso, digno do título de Ragnarok, que no caso o autor brinca chamando de "Ragnarok & Roll". Há surpresas, um uso bem equilibrado de vários personagens cativantes e ao final o leitor não sai decepcionado com as expectativas que estava acumulando.



Juntando os pedaços (#354-359)

"Assim como não há vergonha em viver, não deveria haver nenhuma em morrer."

A aventura continua logo após a fatal guerra contra Surtur e suas hordas. Os sobreviventes percebem que terão que decidir como seguir com o destino de Asgard. Hela, a deusa da morte, surge como nova vilã que perseguirá Thor trazendo problemas com seus poderes fortes e rastejantes. Em luto pelo que perdeu, o deus do trovão vai se isolar em um deserto nevado, onde encontra um velho forte e gigantesco (capa acima) que o recebe em sua moradia para um jantar e cativa bastante com seus mistérios. Há a arte final do Sal Buscema, que torna a edição mais atraente que o resto. Após a guerra, Frigga segue com as crianças de Asgard e surgem alguns problemas no caminho. O esforço em resguardar os jovens, se preocupando com sua integridade física e a tranquilidade emocional, faz um contraste com as lutas envolvendo magia e força. O que beira o insuportável é quando volta a Lorelei e o Loki com a mesma ideia de seduzir o Thor. A ruiva é muito chata, só pensa em arranjar homem. Decepciona o Simonson não ter pensado em nada novo e investido no mesmo planinho que os dois personagens estavam usando desde o início.


Se antes estávamos tendo desfechos que eram comparáveis com as mais épicas guerras de fantasia, essas duas histórias contra a Lorelei parecem uma novela mexicana! Infelizmente, não chega a ser tão engraçado ao ponto de compensar a troca de clima. Como personagem feminina, a Lady Sif é mil vezes melhor, apesar de também estar sofrendo de amor, envolve uma crise existencial e ambivalência quanto aos seus sentimentos pelo Thor. Bill Raio Beta atua como defensor de Midgard enquanto o filho de Odin está ausente. O alien tem o desafio de enfrentar um exército de criminosos com alta tecnologia que são ex-veteranos da guerra do Vietnã e se sentem sacaneados pelo governo que não os reconheceu, querendo cometer um grande roubo para compensar seus sacrifícios. Também é simples e meio clichêzinho, mas é mais divertido. E de todas as histórias secundárias de amor, a do Bill é a melhor.



O Vale das Sombras (#360-362)

"Tudo pronto, meu amigo. Penso que a longa noite se iniciou."

Thor e alguns colegas asgardianos que haviam ajudado com a guerra contra Surtur passam a se preparar para ir pra terra da morte enfrentar a deusa Hela e livrar as almas de alguns mortais que estavam presos lá graças aos problemas que Malekith havia causado. Para isso, Thor recorre pela ajuda de seu amigo Balder que conhece o caminho e o alerta de como será doloroso atravessar a estrada do inferno. Exatamente como vendem as capas com Thor e os asgardianos avançando violentamente em suas bigas, Simonson entrega toneladas de ação, apesar de parecer que não capricha tanto nos desenhos quanto em algumas histórias passadas. Volta a ter um pouquinho de noveleira, mas graças a Odin passa rápido e o foco fica mais na ação e na fantasia. A luta contra Hela é digna da espera. Uma trilogia intensa e divertida, com vários momentos significativos para os personagens, seja em lutas físicas ou dilemas internos. Sequência digna de ser adaptada para um bom filme ou videogame.



Balder, o bravo (#1-4)

"Assim como um povo deve lealdade à sua rainha, será que uma rainha também não deve ser leal a seu povo?"

Uma das maiores surpresas é a minissérie solo que foi feita para o Balder! Simonson deve ter notado o potencial que o personagem já estava tendo em sua jornada solitária durante as revistas do Thor e resolveu revisitá-lo. O personagem é diferenciado, sendo tão bondoso e amoroso que chega a se comunicar com os animais, como se fosse algum santo. A primeira edição mostra Balder no castelo de Karnilla enquanto seu antigo companheiro, Agnar, vem convocá-lo para a viagem contra Hela. Na primeira página é mostrada a origem da feiticeira Karnilla, e depois vemos o convívio espinhoso dos dois. A rainha é manipuladora e possessiva, mas Balder enxerga que por trás disso ela o ama. O bacana é como passa o temor de Simonson fazer maaaaaaais uuuuuuuuum clichêzão romântico, pois a aventura impressiona terminando como um épico amoroso mais envolvente, provavelmente pela Karnilla amadurecer e o leitor poder levar todo o contexto mais a sério com os grandes perigos que os personagens têm que enfrentar.

Na minissérie, Buscema volta a colaborar com a arte-final

Apesar de continuar com os cabelos brancos, vemos o deus superar sua imagem obesa e deprimida, voltando a parecer com um herói! Junto com o arco do Thor contra Hela que estava havendo nessa mesma época, dá pra perceber como o lado de aventuras de super-herói fica pra trás nessa fase, enquanto o tom de conto de fadas toma conta. O resultado é certeiro! O autor conseguiu fazer uma minissérie que vale tanto a pena ser conferida quanto a série principal do deus do trovão. Na última edição, Simonson demonstra claramente como se divertia em fazer essas histórias com a mitologia que tanto ama, se despedindo do leitor com uma arte de duas páginas com a mensagem: "E aqui vai uma última saudação de Balder e seus companheiros. Foi divertido, pessoal! - Ralph, Walt e Sal". Prova explícita do amor de fã que W. Simonson tinha por essa revistinha que acompanhava desde moleque, até que enfim teve a oportunidade de trabalhar com ela e deixou sua marca para sempre!

Eis a mencionada despedida
Bem, molecadinha, por enquanto é só, a próxima parte procurará fechar todas as histórias do deus loirão feitas pelo Simonson. Pode demorar um pouquinho, mas não acredito que chegue a muito mais de um mês. A real é que TÔ NA MERDA, então me sinto até mal em fazer outra coisa que não envolva resolver os meus problemas. Sabe aqueles momentos que você fica até com raiva das coisas que faz pra se distrair porque começa a considerar que devia ter entrado no exército??? Então... por aí... Mas como o Ozy tinha deixado uma indireta pra esse post, achei melhor dar uma adiantada, então vai ficar assim em duas partes, ok? Se não sair até o fim do ano eu devo ter morrido. Mas isso é bem improvável.

Continua...


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