DEMOLIDOR DE CHIP ZDARSKY- O TRÁGICO CICLO DO HOMEM SEM MEDO

 


DEMOLIDOR DE CHIP ZDARSKY- O TRÁGICO CICLO DO HOMEM SEM MEDO

Um dos meus super heróis favoritos é Demolidor.  Desde que teve suas histórias redefinidas pelo Frank Miller, na década de 80, Matt Murdock foi de um herói light e ousado para um vigilante badass e complexo, com suas histórias passando a ter um tom noir e abordando temas como corrupção, violência urbana e, principalmente, a moralidade x ato vigilante.





Esse assunto era refletido pelo protagonista e a contradição que ele representa. Por um lado, Matt Murdock é um advogado, dedicado a servir a lei, além de ser um homem religioso, sendo crítico em relação a ações violentas. Por outro, ele é Demolidor, um vigilante, alguém que opera fora da lei. Sempre que ele sai para combater o crime, Matt tem que encarar esse dilema, tentando fazer a coisa certa e preservar seus valores profissionais e religiosos. 



Mas o que acontece se Matt falhasse? E se, mesmo que por acidente, ele acabasse cometendo erro que quebrasse esses valores?

É essa a pergunta que Chip Zdarsky explora em sua fase do Demolidor, colocando o protagonista numa jornada de autodescoberta, envolvendo não só ele como também todo o mundo.



Mas que jornada foi essa? Como que ela afetou o Demolidor e seu elenco de apoio, aliados e inimigos?

Eu vou explicar...

TRAMA PRINCIPAL

Tendo escrito essa história em Demolidor vol 6 nº1 a 36 e vol 7 nº1 a 14, Zdarsky já começa a fase mostrando Demolidor lidando com sua vida caindo em pedaços: Durante um interrogatório, Matt acidentalmente provocou a morte de um ladrão. Este incidente não só contribui para o Rei do Crime, agora prefeito de Nova York, torna o Demolidor um fugitivo, como também deixa Matt arrasado emocionalmente. Ele está sozinho e consumido pela culpa, não conseguindo se concentrar na luta.





Depois de ser quase morto numa luta contra a gangue do Coruja, Matt, seguindo o conselho do Aranha, opta por desistir de ser Demolidor, encerrar essa vida que o fez quebrar seus valores. 



Porém, como demonstrado em muitas histórias de heróis, essa decisão tem consequências: Sem Demolidor, Hell’s Kitchen se torna um campo de batalha entre gangues, disputando o controle do submundo, com civis inocentes tendo que se defenderem.

Diante desse cenário, Matt acaba tendo que encarar a culpa que carrega, se perguntando se ele pode se reinventar como um herói melhor.

UMA HISTÓRIA VELHA E NOVA

Só de lerem a trama principal, muitos devem tá apontando que essa história, onde o herói desiste mas é forçado no final a voltar a ativa, não é nada novo, já tendo sido mostrado em histórias como “Homem Aranha Nunca Mais”.



Porém, o que ajuda uma história a se destacar das outras não são suas semelhanças mas sim diferenças e a fase do Zdarsky é bem diferente das outras histórias. Ao contrário de heróis como Peter, o motivo do Matt ter desistido não se deve a dificuldades que sua vida de herói traz nos seus relacionamentos e compromissos, mas sim pela culpa por ter quebrado os valores que ele sempre seguiu. Ele teme que seu alter ego como Demolidor esteja se tornando tóxico, viciante, com ele não acreditando mais que pode continuar ser um herói se isso significa recorrer a violência que contradiz seu valores como advogado e um homem religioso. 



Mas, ao mesmo tempo, Matt não consegue escapar dos problemas ao seu redor. Não importa aonde ele vá, sempre se encontra com pessoas que o lembram dos problemas que Hell's Kitchen está passando, e acaba tendo vários ataques de ansiedade diante dessa realidade.



Por isso, a pergunta que Matt se faz não é apenas se ele deve voltar a ser um herói ou não mas sim se ele pode encontrar método diferente para ajudar sua cidade.

É aí que a temática principal dessa fase se revela...

PODE UMA PESSOA MUDAR?

Se tem uma palavra para descrever a fase de Chip Zdarsky no Demolidor, ela é “redenção”. Todo o desenvolvimento do Matt gira em torno do erro que ele cometeu e a forma como ele busca se redimir, não apenas aceitando seu fracasso e continuando a mesma abordagem que causaram seu problema mas sim procurando uma solução diferente.

A parte interessante é como essa jornada não se aplica só ao Matt. Ao invés do arco ser apenas uma história pessoal, Zdarsky expande a temática, apresentando outros personagens também tendo suas jornadas de autodescobrimento, sejam novos como o detetive Cole North, que começa como um policial transferido buscando prender o Demolidor para se tornar seu aliado no combate a corrupção na polícia, ou personagens clássicos como a Elektra, que, para conseguir a ajuda de Matt numa missão envolvendo o Tentáculo, adotaria seu manto e aos poucos vai abraçando a ideologia de seu amado.




No entanto, o personagem que melhor representa esse paralelo entre Demolidor e seus elenco de apoio é ninguém menos que seu arqui inimigo, Wilson Fisk, o Rei do Crime. 



Assim como Matt desiste de ser Demolidor, Fisk faz o mesmo no seu posto como líder do submundo de Nova York para poder trabalhar melhor na sua nova posição como prefeito. Porém, não só o vazio deixado por ele acaba atraindo a atenção de outros chefes criminosos e provocando uma guerra de gangues (envolvendo Butch, o segundo filho do Rei do Crime), mas Fisk, mesmo como prefeito, encontra novos inimigos: Os Stromwyns, gêmeos ricos que buscam expandir sua influência através da corrupção.



A presença dos Stromwyns permite Zdarsky usar sua história para tocar em assuntos bem realistas, como corrupção em instituições, como o sistema presidiário, e abuso de poder e influência para ganhos pessoais. 



De certa forma ele torna Hell’s Kitchen uma personagem na fase, com a história da região e os arcos dos personagens condizendo com a luta do Matt em tentar criar uma cidade melhor e mais segura, tal como ele está tentando melhorar a si mesmo.



DE UMA HISTÓRIA PESSOAL PARA UM COMENTÁRIO META

Enquanto o primeiro volume da fase de Chip Zdarsky foi um sucesso, o segundo é onde alguns fãs começaram a ter suas dúvidas. Ao invés de se passar em Nova York, a história passou a focar numa batalha do Demolidor e a Elektra, agora casados e liderando sua própria organização: O Punho, numa guerra contra o Tentáculo, liderado pelo Justiceiro.







Durante essa aventura, Matt conhece Robert Goldman (conhecido como Goldy) um antigo colega de faculdade, que se revela sendo seu anjo da guarda e, sob as ordens de Deus, tem manipulado eventos na vida do Matt, explicando que o Homem sem Medo não pode quebrar o ciclo de problemas em sua vida visto a necessidade disso para que Matt possa crescer e continuar a demonstrar a força de vontade que o definiu...e já dá pra ver o problema que muita gente tem com essa parte da história.



As críticas a essa segunda parte são bem compreensíveis. É realmente mudança random ir de um drama urbano e pessoal para essa história fantasiosa, com anjos e clãs ninja. Parecia que Zdarsky estava tentado tornar a fase dele mais épica do que deveria. Além disso, para alguns, as palavras de Goldy tiravam o investimento na história, pois a interferência dele na vida de Matt parece mudar o contexto dos eventos, parecendo que Matt estava predestinado a passar por aquelas situações.



Porém, não acho que essas mudanças sejam tão prejudiciais como pensam, pois elas continuam a refletir a temática sobre redenção e mudança, com Zdarsky usando os elementos fantasiosos como sua vantagem.

A batalha entre o Punho e o Tentáculo se encaixa nesse ponto da história do Demolidor, agora mais confiante e buscando tornar o Punho numa organização que protege o mundo ao invés de tentar conquista-lo, chegando até mesmo recrutar criminosos e tentando ajuda-los a se redimir, um contraste ao Justiceiro e o Tentáculo, que não possuem a mesma compaixão.



Já a presença de Goldy contribui para o aspecto religioso (algo fortemente nas histórias do Demolidor pós-Miller) e meta. Durante esse arco, Matt possui uma forte confiança quanto a sua decisões, julgando que tudo dará certo, que esse é um sinal ou missão de deus. É aí que Goldy entra em cena, avisado o Matt para não ficar iludido, que suas escolhas sempre causam problemas em sua vida. O dialogo dos dois pode parecer um debate de livre arbítrio vs destino mas também pode ser vista como um comentário na situação do Demolidor como um personagem de HQs. Goldy é praticamente uma representação dos editores da Marvel, e seus argumentos são os mesmos que os escritores usam para justificar eles mexerem tanto com a vida de um personagem. É necessário que o personagem passe por experiências para que possa ter drama e tornar sua história interessante.






Claro que isso não tira a insatisfação dos fãs de que Goldy tem influenciado eventos na vida do Matt, julgando que ele está dizendo que o motivo dos problemas do Demolidor é porque “Deus quer que ele falhe”, mas Zdarsky desmente essa ideia, com Goldy se deixando ser preso, dando Matt a sensação de liberdade para escrever seu próprio destino e aumentando sua confiança, o que tornar o final dessa guerra ainda mais trágico.



A batalha do dois clãs termina com a organização do Matt sendo destruída, ele virando um fugitivo, sendo perseguido pelos Vingadores, e sendo separado de seus amigos, com alguns tendo o deixado, outros são capturados e presos. Sua missão o levou a lugar pior do que antes e pessoas pagaram as consequências das ações do Matt.



Isso não só prepara o cenário para um clímax bem épico, com Matt tentando resgatar seus amigos e aliados, como também desenvolve o Homem Sem Medo, mostrando Matt finalmente encarando seus erros, reconhecendo que ele não é infalível, mas, como Goldy disse, ele escolhe ajudar seus amigos, mesmo tomando decisões arriscadas, qualidades que tornam o Demolidor um herói tão imprevisível.



Esse detalhe cria uma perfeita ironia na fase incrível do Chip Zdarsky, um período em que vários personagens do Demolidor passaram por mudanças mas o protagonista principal ainda continua preso no ciclo trágico de sua vida. 



Então isso? O que vocês acham da fase do Demolidor do Chip Zdarsky? Sintam-se a vontade para colocar suas opiniões nos comentários abaixo.


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