Uma reparação Histórica (ou uma homenagem a um álbum injustiçado)

Capa do Álbum The Stage (2016), ela possui duas versões, porém essa com o tom roxo é a minha favorita.

INTRODUÇÃO
 

Há algum tempo acompanho Metal e procuro cada vez mais me diversificar dentro desse mundo, conhecendo as principais bandas e gêneros e me aprofundando cada vez mais até em bandas que ninguém dá muita moral. Esse amor e busca incessante por música nasceu a alguns anos por conta de uma banda que conheci no ensino fundamental, o Avenged Sevenfold.

O Avenged em sua versão clássica possuía um esquadrão formado pelo M Shadows (vocalista), Synyster Gates e Zacky Vengeance (Guitarras), Johnny Christ (Baixo) e The Rev  (Bateria). Essa capa faz alusão ao Gun's Roses, banda que influenciou fortemente a banda.

Logo quando descobri a banda, fui ouvindo os principais clássicos "A Little Piece Of Heaven", "Hail To The King", "Nightmare", etc. E a cada música que eu escutava, criava-se um grande interesse por eles, até que um certo dia comecei a ouvir os álbuns de forma cronológica (se quiserem algum texto de eu comentando a discografia completa de algumas bandas, me avisem). Sendo assim, em poucos dias cheguei ao álbum mais recente, o The Stage de 2016, e mesmo a banda sempre se variando a cada disco, aquele em especifico tinha me causado uma estranheza, uma sensação bem destoante do que eu já havia ouvido. E é sobre ele que falarei nesse texto. 

Capa do Single de The Stage.

SOBRE O ÁLBUM

The Stage é um álbum que foi propositalmente feito pra causar essa estranheza. Logo pela sua faixa "Self-Titled" inicial, em que logo após o início instrumental (diga-se de passagem, é maravilhoso) somos apresentados a um vocal bem único, diferente dos álbuns anteriores. Se ouviu as músicas mais do Avenged, sabe que o vocalista possui uma característica de ser bem agressivo na voz, como em faixas tipo "Turn The Other Way" (vale citar que nos dois primeiros álbuns, ele utilizava majoritariamente o gutural invés da voz melódica), e outras também como "Almost Easy", "God Hate Us", Etc. Em outras faixas, sua voz soava de forma parecida com o Axl Rose do Gun´s, como "Seize The Day", "Doing time", "Bat Country". 

Porém nessa faixa de abertura de The Stage era diferente de tudo que já havia tido antes, parecia que o Matt estava controlado, inclusive nos refrãos ele canta de forma mais "comportada". Isso se deve ao fato que o cantor andava passando uns maus bocados pela gritaria exagerada de antes, oque acarretou no problema das cordas vocais anos mais tarde, num show em 2018. 

Após esquecer a estranheza do vocal, somos bombardeados pela cadência da música em si, com uma bateria bem mais dedicada e destacada do que em Hail To The King (já que houve a troca do baterista Arin pelo Brooks Wackerman, que é conhecido pela época que tocava em Bad Religion). Não falarei tanto sobre as guitarras do disco porque o trabalho de Synyster e Zacky são indescritíveis, os dois são geniais em todos os discos da banda e aqui não perderam a mão. Assim como o Johnny Christ no baixo, fazendo o bom trabalho que sempre fez.

Se você for igual eu e ainda passa mal tentando entender inglês, recomendo buscar a tradução da letra para se surpreender pelo soco no estomago que ela nos faz levar. Assistir o clipe e entender a letra ao mesmo tempo é uma experiência que beira a catarse, que nos transcende em reflexões sobre a humanidade violenta e covarde que existe desde os primórdios, é sobre como nos portamos como humanos. Todas as referencias no vídeo com os bonecos são dignas de uma verdadeira aula de história, escancarando o prazer sórdido da sociedade na destruição. Um exemplo disso está na era dos gladiadores em Roma (também citado no clipe), os tais civilizados lotavam coliseus para assistir a desgraça alheia dos escravos, que apenas tinham a função de matar a sede de um público insaciável.

"A crueldade é um dos prazeres mais antigos da humanidade." 

                                                                                                                                   -Nietzsche

(aqui está o clipe legendado pra quem tiver interesse)


Após a primeira faixa, não temos folego suficiente porém vem mais uma pancada, Paradigm (minha faixa favorita).

Ela com seu refrão forte, define o tema do álbum. Todas essas reflexões sobre a existência e suas inúmeras incertezas demonstram a verdadeira natureza que o Avenged estava durante sua gravação. As influências de Cosmos estão mais que claras, Carl Sagan foi uma grande inspiração pra toda a construção do disco, com seus estudos sobre a razão da vida e toda a grandeza do universo.

"Eu estou acima, do tamanho de um deus

Além do alcance dos mortais
Eu derramei o meu lado humano
Mais distante, ó Pai, eu olho para o meu reflexo
Eu perdi esse menino lá dentro?

O paradigma final"

                                                                                                                  -Refrão de Paradigm.

Não falarei detalhadamente de todas as canções em si, porque quero que a leitura seja mais dinâmica, mas Sunny Disposition é outra excelente canção que versa sobre o distanciamento das classes sociais, com reflexões acerca disso de forma ainda mais claras que em The Stage, mostrando uma faceta mais progressista da banda. 

God Damn é a segunda música do álbum a ter clipe e é uma das favoritas dos fãs, possuindo um vocal mais agressivo do Matt e com um instrumental de primeira (inclusive vale destacar as ótimas linhas de baixo do Johnny Christ), de longe uma das minhas faixas favoritas. O vídeo dela se assemelha bastante com Chop Suey do System Of A Down e de certa forma é a música mais palatável do disco, sendo bem fácil de assimilar. 

Creating God fala sobre essa busca pelo divino e por algo que nos traga mais significado para nossa vida (cita até Darwin). Angels é a mais triste e possui um excelente vocal melódico do Matt, passando uma emoção comovente na música e seu tema lembra mais um arrependimento. Ambas possuem um ótimo instrumental

Simulation é sobre incertezas e questionamentos, possuindo um instrumental que me lembra bastante Angels (tanto que já confundi algumas vezes). Já Higher versa sobre sair do mundo, sentir a esperança na libertação das amarras terrestres.


A capa mais conhecida do Álbum, com o tom branco.

Roman Sky é outra pedrada, com um instrumental tão suave que nos faz realmente viajar pelos céus romanos numa tranquilidade. Com um vocal ainda mais melódico e refinado, Matt Shadows é outro nível nessa música e prova mais uma vez que é subestimado demais pela galerinha que ainda o considera apenas mais um na cena do metal.

Fermi Paradox é uma faixa que não curto tanto quanto todas as outras do disco, mas possui um excelente instrumental.

Agora chegamos em The Exist, a maior canção da história do Avenged, superando Strength of The World e Save Me. Em quesitos de duração parece mais Dream Theater do que A7X (Inclusive, amo DT). Pela duração, já se espera que seja muito instrumental e com várias partes diferentes como um verdadeiro Metal Progressivo, e é bem isso mesmo, para se ter uma ideia, o vocal só aparece a partir dos sete minutos com uma letra bem existencialista, novamente questionando sobre os próximos passos humanos, refletindo sobre oque há além do que temos conhecimento. A música ainda possui um texto falado por Neil deGrasse Tysson (um cientista muito influenciado pelo Carl Sagan, e que também tem uma puta autoridade em estudos acerca do Cosmos), e nesse texto é uma síntese de tudo que foi trabalhado durante o álbum, toda a reflexão acerca de nós, os humanos com suas religiões e atitudes no planeta, que beiram a insignificância se olharmos o todo, o quão o universo é algo expansivo e que somos uma pequena parte disso tudo, de todo esse Cosmos.

"Há mais estrelas no universo do que grãos de areia nas praias do mundo" 

                                                                                                                     -Neil em The Exist.

Contracapa do disco.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

E chegamos ao fim do álbum, finalizando a viagem pela magnitude do Cosmos, e percebemos que valeu a pena, que toda essa experiência muito diferente de todos os álbuns da banda teve um sentido muito claro, que acerta em cheio em tudo que tenta fazer, um verdadeiro discão maduro e inteligente, que acaba servindo como uma aula de filosofia e Astronomia. Ao ouvir o álbum, me despertou um certo interesse pela obra de Carl Sagan e fez crescer em mim, um amor inexplicável pela reflexão, pelos questionamentos acerca da nossa vida, de nosso destino. O sentimento proporcionado foi tão forte que até fico emocionado ao escrever esse texto.

Não consigo entender o motivo até hoje da baixa popularidade do disco, pois a banda sempre foi conhecida pelas mudanças de álbum para álbum, começando Metalcore nos dois primeiros discos, se tornando uma espécie de power metal em City of Evil, depois entrou numa vibe bem misturada nos álbuns seguintes até chegar no Hail To The King, em que era mais trabalhado no Heavy Metal tradicional, fazendo homenagens a várias bandas de sucesso dos anos 80/90. Esse The Stage merece muito mais reconhecimento pelo amadurecimento e criatividade da banda, que mais uma vez foi além da mesmice e foi se arriscar em algo totalmente novo, com propostas bem diferentes da sua discografia.

Vale citar que sua versão Deluxe possui vários covers, inclusive de Wish you Were do Pink Floyd, que sem sombra de dúvidas foi uma das bandas mais influentes para a construção do disco, já que bebe bastante do progressivo. Outro cover de destaque é Malaguenã Salerosa, musica tradicional mexicana, que é bem melosa mas é uma ótima oportunidade de ouvir o M Shadows cantando em outro idioma.


O Avenged Sevenfold irá lançar um disco no dia de aniversário do meu time de coração (02/06/2023) e já apresentou dois singles "Nobody" e "We Love You", são duas ótimas musicas e parece que seguirão numa linha similar a The Stage, mas com ainda mais experimentação, tendo em vista que a última tem até uma parte Trash, pra se ter ideia.

Capa dos dois singles de Life Is a But A Dream.


Enfim, obrigado pela leitura e espero que tenham curtido o texto. Até mais.

"A ciência não só é compatível com a espiritualidade, mas também é uma fonte de espiritualidade profunda."

                                                                                                                                   -Carl Sagan

Postar um comentário

0 Comentários