O caso Crivella (ou como a lacração da Marvel chegou ao grande público e à mídia brasileira)


Esperei a poeira baixar para comentar melhor a respeito desse assunto. Uma mãe, que obviamente não é leitora de quadrinhos nem tem a obrigação de ser, comprou uma HQ dos Jovens Vingadores, uma equipe de super-heróis adolescentes buchas da Marvel, personagens de terceira categoria. Acontece que as versões do Thor e do Hulk nessa HQ são gays, e acontece um beijo deles na história.
Isso foi o suficiente para a mãe surtar e ameaçar processar a editora, a Marvel e todo mundo. O caldo entornou quando o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, mandou recolher o quadrinho. Em contrapartida, opositores do prefeito e militantes LGBT correram para comprar a HQ, que se esgotou rapidamente.
Disso, se tiram as seguintes conclusões: a mãe do moleque que comprou a HQ é obviamente leiga e se escandalizou ao ver dois caras se pegando no quadrinho. O problema é que já há décadas o público-alvo dos quadrinhos de super-herói não é mais criança, mas majoritariamente homens adultos, que trabalham para comprar suas HQs. A "gourmetização" das HQs de super-herói é prova disso. A mãe só comprou a HQ dos Jovens Vingadores porque ela estava com preço promocional. Se a HQ estivesse por 49,90, por exemplo, duvido que a mulher comprasse.



A questão é que, com os filmes da Marvel fazendo sucesso, uma mãe presumivelmente acharia que a HQ era para crianças pequenas, e não é. Na realidade, Jovens Vingadores até não tem classificação indicativa para maiores de 18 anos, não é "mature readers", mas a gente sabe que quem lê isso é marmanjo, no mínimo adolescente.
 A decisão equivocada do Crivella em censurar e tirar a HQ da Bienal é que botou merda no ventilador. Estava lendo que talvez legalmente ele até possa fazer isso, pois o espaço da Bienal é cedido pela prefeitura do Rio. Outro grande equivoco é tratar a HQ como LGBT, sendo que ela não é. Trata-se apenas de uma HQ de super-herói banal. E, devo dizer, uma HQ ruim, com uma história bem mal-escrita, por sinal, e personagens desinteressantes, que só foram criados para concorrer com a equipe adolescente da DC, os Novos Titãs.
No entanto, resta outro ponto bem delicado, que é a questão do exagero do politicamente correto e da representatividade forçada que tem acontecido nos quadrinhos de super-herói, em geral, e nos da Marvel, em particular. 
Nos últimos tempos, a Marvel comprou a agente da lacração da Disney fortemente, e está até desagradando seus leitores tradicionais. Prova disso é o gibi da Thor Jane Foster; empurraram a Thor mulher goela abaixo dos leitores, e as vendas caíram drasticamente. Tanto que voltaram com o Thor tradicional. Não que a inclusão seja uma coisa recente na Marvel. Nos anos 70, a editora tinha heróis negros, latinos, mulheres etc. Mas os roteiristas evitavam tomar partido. Quando havia uma discussão entre o Capitão América e o Falcão, por exemplo, o leitor é que optava por qual lado tomar. Não que não houvesse escritores mais progressistas, mas era tudo bem mais sutil. Hoje em dia, esfregam muito na nossa cara suas intenções e forçam muito a barra.

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