Por que essa foto no post? WTF?! |
Transcrito do livro “O homem
que calculava – Malba Tahan”, pag. 12 – pág. 13:
Poucas
horas havia que viajávamos sem interrupção, quando nos ocorreu uma aventura
digna de registro, na qual meu companheiro Beremiz, com grande talento, pôs em
prática as suas habilidades de exímio algebrista.
Encontramos
perto de um antigo caravançará* meio abandonado, três homens que discutiam
acaloradamente ao pé de um lote de camelos. Por entre pragas e impropérios
gritavam possessos, furiosos:
-
Não pode ser!
-
Isto é um roubo!
-
Não aceito!
O
inteligente Beremiz procurou informar-se do que se tratava.
-
Somos irmãos – esclareceu o mais velho – e recebemos como herança esses 35
camelos. Segundo a vontade expressa de meu pai, devo receber a metade, o meu
irmão Hamed Namir uma terça parte, e, ao Harim, o mais moço, deve tocar apenas
a nona parte. Não sabemos, porém, como dividir dessa forma 35 camelos, e, a
cada partilha proposta segue-se a recusa dos outros dois, pois a metade de 35 é
17 e meio. Como fazer a partilha se a terça e a nona parte de 35 também não são
exatas?
-
É muito simples – atalhou o Homem que Calculava. – Encarrego-me de fazer com
justiça essa divisão, se permitirem que eu junte aos 35 camelos da herança este
belo animal que em boa hora aqui nos trouxe!
Neste
ponto, procurei intervir na questão:
-
Não posso consentir em semelhante loucura! Como poderíamos concluir a viajem se
ficássemos sem o camelo?
-
Não te preocupes com o resultado, ó Bagdali! – replicou-me em voz baixa Beremiz
– Sei muito bem o que estou fazendo. Cede-me o teu camelo e verás no fim a que
conclusão quero chegar.
Tal
foi o tom de segurança com que ele falou, que não tive dúvida em entregar-lhe o
meu belo jamal**, que imediatamente foi reunido aos 35 ali presentes, para
serem repartidos pelos três herdeiros.
-
Vou, meus amigos – disse ele, dirigindo-se aos três irmãos -, fazer a divisão
justa e exata dos camelos que são agora, como vêem em número de 36.
E,
voltando-se para o mais velho dos irmãos, assim falou:
-
Deverias receber meu amigo, a metade de 35, isto é, 17 e meio. Receberás a
metade de 36, portanto, 18. Nada tens a reclamar, pois é claro que saíste
lucrando com esta divisão.
E,
dirigindo-se ao segundo herdeiro, continuou:
-
E tu, Hamed Namir, deverias receber um terço de 35, isto é 11 e pouco. Vais
receber um terço de 36, isto é 12. Não poderás protestar, pois tu também saíste
com visível lucro na transação.
E
disse por fim ao mais moço:
E
tu jovem Harim Namir, segundo a vontade de teu pai, deverias receber uma nona
parte de 35, isto é 3 e tanto. Vais receber uma nona parte de 36, isto é, o teu
lucro foi igualmente notável. Só tens a agradecer-me pelo resultado!
E
concluiu com a maior segurança e serenidade:
-
Pela vantajosa divisão feita entre os irmãos Namir – partilha em que todos três
saíram lucrando – couberam 18 camelos ao primeiro, 12 ao segundo e
4
ao terceiro, o que dá um resultado (18+12+4) de 34 camelos. Dos 36 camelos, sobram,
portanto, dois.
Um
pertence como sabem ao bagdáli, meu amigo e companheiro, outro toca por direito
a mim, por ter resolvido a contento de todos o complicado problema da herança!
-
Sois inteligente, ó Estrangeiro! – exclamou o mais velho dos três irmãos.
–
Aceitamos a vossa partilha na certeza de que foi feita com justiça e equidade!
E
o astucioso Beremiz – o Homem que Calculava – tomou logo posse de um dos mais
belos “jamales” do grupo e disse-me, entregando-me pela rédea o animal que me
pertencia:
-
Poderás agora, meu amigo, continuar a viajem no teu camelo manso e seguro!
Tenho outro, especialmente para mim!
E
continuamos nossa jornada para Bagdá.
*Refúgio
construído pelo governo ou por pessoas piedosas à beira do caminho, para servir
de abrigo aos peregrinos. Espécie de rancho de grandes dimensões em que se
acolhiam as caravanas.
**Uma
das muitas denominações que os árabes dão ao camelo.
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Até o próximo.
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