O caso Geek Véio - Censura a canais nerds anti-lacração?

 



https://twitter.com/GeekVeio/status/1572970190232592391/photo/1

Talvez alguns tenham ficado alheios, mas na semana passada o canal do Geek Véio no YouTube foi deletado sem maior explicação e só ontem ou anteontem voltou à plataforma. Para quem não sabe, Leonardo “Geek Véio” é um dos expoentes da onda “antilacração” de alguns canais nerds/geek no YouTube, e o que se conjecturou foi que a exclusão do canal foi por conta de seu conteúdo, contra a hegemonia vigente nas grandes corporações e na cultura pop atual. Não é a primeira vez que o Geek Véio tem esse tipo de dor de cabeça; há um tempo atrás, ele tinha perdido a monetização do canal.


E não foi o primeiro caso: semanas antes, o canal Heróis e Mais, do Tony e Elvis, foi hackeado e quase perdido. Felizmente, foi possível recuperar todo o conteúdo. No entanto, isso significa que os tais canais nerd/geek antilacração têm de começar a ficar mais escaldados.

Mas por que esses canais incomodam tanto? Para entender isso melhor, talvez seja melhor fazer uma breve retrospectiva do que vem acontecendo na cultura pop com mais intensidade na ultima década e, particularmente, nos últimos cinco ou seis anos. Para quem acompanha HQs, filmes ou séries há muito tempo, sabe que política e diversidade sempre existiram nessas mídias. A cultura pop está em ressonância com a sociedade e até a espelha, em certa medida. Por exemplo: heróis negros já existem desde os anos 60 e 70, na Marvel e DC, como é o caso de Pantera Negra, Luke Cage, John Stewart, Raio Negro etc. Protagonistas femininas são destaques em clássicos como Alien e O Exterminador do Futuro, com Ellen Ripley e Sarah Connor, respectivamente. Personagens gays também já há muito tempo têm sua presença em HQs, filmes ou séries. Nos quadrinhos, temos exemplo do Estrela Polar, na Marvel, e de Flautista, Manto Negro, Maggie Swayer, Renee Montoya, entre outros, na DC.


Entretanto, a tal “esquerda lacradora” foi ganhando força nos últimos anos, constituída pelos identitários que infestam o Twitter. Infelizmente, um dos aspectos negativos de a cultura nerd/geek ter ficado mais mainstream foi o interesse oportunista desses grupos em ter mais representatividade nessas mídias. A maior parte dos identitários é constituída por gente que até ontem nem ligava para o que acontecia na cultura pop, mas que hoje em dia enche o saco no Twitter cobrando cada vez mais personagens mulheres, LGBTs ou de minorias em filmes, séries, HQs e jogos. E esses identitários têm grande ressonância nas grandes corporações de entretenimento, até hoje não sei dizer se apenas por lucro ou também por ideologia de alguns funcionários.

 






Há alguns anos atrás, era alheio à noção de “lacração”, e muita gente também era. Iniciou-se uma reação do tal “nerdola”, que é como chamam o fã tradicional, que foi escalando. Nós aqui reproduzimos o posicionamento de alguns pioneiros nos EUA. Um deles é o site Boulding Into Comics, que basicamente é o principal site anti-lacração na gringa e que serve como base de pauta para a maioria dos canais aqui. Há também alguns canais gringos anti-lacração de destaque como o Geek + Gamers e o Midnight’s Edge.


Pelo menos, quando começou há onda antilacração por aqui, havia poucos canais que falavam a respeito. Um deles era o Clock Up do Rider, que hoje em dia está inativo. Outro era o Canal Tragicômico, de Wagner Thomazoni, que não é bem um canal geek; ele tangencia o tema geek porque é um nerd/otaku, mas atualmente o canal dele é mais sobre política e particularmente contra os identitários e as feministas. Engraçado que, até há alguns poucos anos atrás, havia certa vergonha de falar mal de feminismo, porque quem fizesse isso seria considerado um “mascu” machista escroto. Que diferença para hoje, em que se abertamente critica o feminismo seja em canais anti-lacração ou canais masculinistas red pill e MGTOW. Anos atrás, houve uma explosão de canais conservadores no auge do governo petista da Dilma, e, mais recentemente, aconteceu essa explosão de canais nerds/geek anti-lacração e de canais masculinistas.









Entretanto, são realmente tantos canais nerds anti-lacração assim? Talvez não. Vejamos: alguns deles são extensões de páginas de Facebook, como o Quarto Mundo e Macho Geek. Outros são canais que surgiram nos últimos dois/três anos. Além do Geek Véio e do Heróis e Mais, temos o Linhagem Geek, do Andre Alba do Pânico, que tem a Jovem Pan por trás; há ainda outros canais como o OkNerd, o Jorgeta Hora Play, o Canal do Markoide, e alguns outros que posso ter esquecido de citar ou não ter lembrado. Esses canais podem sofrer repressões do YouTube, ter sua monetização suspensa ou serem deletados? Com certeza, em vista de seu conteúdo. Desses canais, o único que tem uma segurança maior é o Linhagem Geek, por conta de sua ligação com a Jovem Pan, um grande grupo de comunicação.




Há a dúvida se esses tempos de identitarismo na cultura pop está em um “ponto de inflexão” e talvez ocorra um recuo. Há indícios disso na Netflix, por exemplo, que perdeu inúmeros assinantes e demitiu vários de seus funcionários woke. Na Warner, David Zaslav, o novo CO, parece estar indo em uma direção mais tradicional de gerenciar uma grande corporação de entretenimento, cancelando o filme da Batgirl e objetivando o lucro. Inclusive, a DC Comics está sob auditoria, com risco de muita gente ser demitida e vários títulos, cancelados. Até há o boato de que a editora pode ser fechada e ter seus personagens licenciados para outras editoras, visto que “só o Batman estava vendendo”.



Na contramão, temos a Disney, que, apesar de seu CO, Bob Chapek, aparentemente ter tentado adotar uma linha de gestão mais ortodoxa, ele foi sabotado lá dentro por executivos woke como Kevin Feige do Marvel Studios e Kathleen Kennedy da Lucasfilm, com a ajuda do ex-presidente da empresa, que ainda tem bastante poder. Na Amazon Prime, ninguém sabe muito o que vai acontecer, mas a série Os Anéis do Poder tem sido bem criticada pelo progressismo e por não respeitar o cânone de Tolkien.

Enfim, como esse fenômeno da “lacração” é relativamente recente, ainda estamos percebendo que rumo as coisas estão tomando. O que é certo é que ainda haverá muito choro e ranger de dentes, e a maioria desses canais anti-lacração pode sim passar por maus bocados, como o Geek Véio e o Heróis e Mais passaram. Isso cai na delicada seara da liberdade de expressão e para qual lado ela vale.

 

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