Mulher-Hulk: Impressões do episódio-piloto

Enfim estreou no Disney Plus o primeiro episódio de Mulher-Hulk, e, a despeito de meus receios, resolvi assistir. Como episódio, achei até ok, não chega a ser o lixo que estão dizendo, mas também não chega a ser excelente. Ainda assim, não deixa de dar uma impressão de estranheza.


Não que não tenha suas cagadas. Já de início mudam a origem da personagem; Jennifer Walters, em vez de ganhar seus poderes via transfusão de sangue de seu primo, Bruce Banner, obtém os poderes em um acidente de carro, quando Bruce sangra em cima dela. Não entendi muito bem a razão da mudança, mas creio que foi para tirar o protagonismo heroico de Banner na origem das HQs. A primeira história da Mulher-Hulk é séria. Dizem as más línguas que a personagem foi criada por causa de treta de copyright. Chegou aos ouvidos de Stan Lee que a Universal, que detinha os direitos do Hulk para a série de TV estrelada por Bill Bixby e Lou Ferrigno, tinha planos de fazer uma série com uma versão feminina do Hulk. Lee então escreveu um roteiro a toque de caixa e deu para John Buscema desenhá-lo. Assim, nasceria a Mulher-Hulk, e seus direitos ficariam com a Casa das Ideias.




Mulher-Hulk nunca foi uma personagem para ser levada muito a sério, sempre foi galhofa. Pelo menos, nas HQs solo dela. Tentaram fazer com que ela fosse uma personagem séria, e ficou ridículo. Mulher-Hulk só é séria nas histórias em que é coadjuvante, como membro dos Vingadores ou do Quarteto Fantástico de John Byrne, em uma época em que substituiu o Coisa na equipe, enquanto ele estava na Zona Negativa. Após isso, ela ganhou sua revista mensal escrita e desenhada por Byrne, e deixou de ser a “selvagem Mulher-Hulk” para ser a “sensacional Mulher-Hulk”, e suas HQs passaram a ter a atmosfera de galhofa e humor escrachado, e a série vai nessa linha. Aliás, vocês repararam que no episódio a Mulher-Hulk usou uma camiseta muita parecida a uma que ela veste em uma HQ do Byrne?

O humor do MCU é meio imbecil, mas nesse episódio-piloto ele não está tão gratuito. Não tem muita coisa da celebrada fase de John Byrne no episódio, com exceção das cenas em que a Mulher-Hulk quebra a quarta parede e fala com o espectador, como falava com o leitor na HQ. O Hulk, interpretado por Mark Ruffalo, na maior parte do episódio em CGI, virou um babaca, pura e simplesmente; esculhambaram o personagem, mas essa é a linha atual da Marvel, que denigre os personagens homens para dar destaque às mulheres. Até acho que pode ter humor, sim, nas histórias do Hulk; um exemplo é a fase de Peter David nos quadrinhos, que, apesar de ter drama, também tinha humor, mas não era humor tipo pastelão, para desmoralizar o personagem.





A CGI ainda está bem tosca, mas deram uma melhorada na renderização. Está um pouco melhor que no trailer, o qual foi bem ridicularizado e não faltaram comparações com a Fiona de Shrek. A atriz, Tatiana Malasny, é boa, não vou negar; ela pegou bem a personalidade de Jennifer Walters e é muito carismática. É irônica e bem-humorada, como a personagem realmente é nas HQs. A vilã Titânia aparece só para apanhar, praticamente foi só um easter egg. A proposta é ser uma série de advogado estilo super-herói. Jessica Gao, a roteirista de Ricky e Morty, está creditada como escritora, mas havia outra escritora, Dana Schwartz, que andou fazendo declarações do tipo "tem de tirar das bibliotecas todos os livros escritos por homens brancos" e também falando mal dos nerds. Espero que tenham conseguido filtrar a ideologia nos roteiros, porque, se não fizeram isso, a qualidade da CGI será o menor dos problemas.


E, nesse episódio-piloto, há um bom verniz de feminismo. Em uma das falas, Jennifer diz que está habituada a controlar a raiva porque é assediada pelos peões de obra e também porque os homens costumam assumir um tom professoral na profissão de advogado, sendo que ela seria melhor advogada que ele. A Mulher-Hulk das HQs não era propriamente feminista, mas era independente e proativa. Por esse ponto de vista, toda mulher que trabalha, ganha dinheiro e luta por seu lugar é feminista. A Mulher-Hulk de John Byrne de certa forma era o arquétipo da profissional liberal yuppie dos anos 80, da Era Reagan. Completa a trinca a diretora Kat Coiro, que, diga-se de passagem, é muito bonita, uma gata. Há ainda umas piadinhas bem bestas, inclusive a da cena pós-crédito, sobre a virgindade do Capitão América. A grande diferença da Jennifer Walters da série com relação à das HQs é que a da série ainda reluta em assumir a persona da Mulher-Hulk, enquanto nos quadrinhos ela se sente muito mais à vontade como Mulher-Hulk e raramente fica em sua forma humana, de Jennifer. Uma é o ego e a outra, o superego.

Em suma, para um episódio-piloto, foi ok. Espero que a série melhore e não caia no lugar comum da panfletagem, apesar de que, venhamos e convenhamos, fatalmente deve cair. No entanto, creio que Tatiana Maslany deve segurar bem as pontas. Também espero que a CGI melhore, apesar de não ter muitas esperanças nisso.

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