Quem Faz A Alma Do Mundo?

 


Dr. Manhattan - Dave Gibbons


"(...) Quem faz o mundo? Talvez o mundo não seja feito. Talvez nada seja feito. Talvez simplesmente seja, tenha sido, será eternamente… um relógio sem artesão."


Dr. Manhattan 

in~ Watchmen: Edição Definitiva

pag. 136




Inomináveis Saudações a todos vós, Realistas Leitores!


O metafisicamente intrigante Capítulo IV de Watchmen,  intitulado Relojoeiro, apresenta perto de seu final as reflexões que mais me impactaram advindas do Dr. Manhattan. Em todo o Capítulo, O Tempo, O Espaço e O Ser foram sendo perscrutados pelas memórias do ultrapoderoso personagem que um dia foi um simples Ser Humano, o Doutor Em Física Nuclear Jonathan Osterman. Que É O Tempo? Que É O Espaço? Que É O Ser? No jogo das idas e vindas pelo Presente, Passado e Futuro, Alan Moore plantou aqui muitas ideias sublimes sobre Teorias Existencialistas que causam ainda em nós eterníssimas questões que jamais respondermos. Dr. Manhattan não respondeu diretamente ao próprio questionamento mentalmente feito e eu mesmo não poderia responder neste Ensaio ao mesmo. Pensamento tolo querer tocar em Verdades acima da Humana Realidade, em densos tomos de Livros que não foram escritos para a Mente Humana. E nem para a Mente de um Ser como o único Metahumano de seu planeta capaz de caminhar em Sóis e navegar no meio de Tempestades Cósmicas. Ironia notável no meio de tanta ênfase por quase todas as páginas de Watchmen nas quais o único personagem com Superpoderes é praticamente visto como Aquilo que a Humanidade do mundo dele e do nosso concebe como A Origem De Tudo. 


Uso esta denominação porque "Deus" é muito vago e remete a permanentes equívocos que rotineiros embotam qualquer raciocínio. E para dar uma noção muito mais ampla da complicada armadilha de se voltar para raciocínios além dos limites mentais, dentro ou fora dos Quadrinhos, remeto ao antigo modo dos Antigos se referirem ao nosso Universo, chamando-o de Mundo. A Alma deste, conforme a clássica concepção de Platão, assim é explicada por Donald Tyson no Apêndice II de Três Livros De Filosofia Oculta, da Autoria de Henrique Cornelius Agrippa von Nettesheim, páginas 906 e 907:



"(...) Para Platão, como ele relata em Timaeus, o Deus Superior foi o Criador, o que é Incognoscível, Eterno e Perfeito, 'A Melhor Das Causas'. O mundo, criado à sua imagem, é necessariamente belo, e a beleza do mundo é um espelho para o esplendor do Criador. Desejando trazer ordem ao caos da esfera visível para que 'todas as coisas fossem como Ele É', de pura bondade e livre de todo ciúme, ele fez surgir uma cópia de si mesmo, tão exata quanto possível, para daí gerar toda e qualquer coisa secundária. As características dessa 'melhor das criações' foram determinadas por sua natureza essencial.


Ele fez o mundo inteligente porque a inteligência é mais bela que ininteligência. Ele deu ao mundo uma Alma porque a inteligência não pode residir onde não há Alma. Ele pôs a Alma em um corpo porque 'aquilo que é criado é, por necessidade, corpóreo, e também visível e tangível. (...)"



Dois milênios passaram-se e muito mudou no Pensamento Humano, dotando as concepções acima de uma contestável antiguidade. Por mais que eu respeite Platão e tudo do seu legado, levo em consideração as diversas atualizações sobre a Alma do nosso Universo que, a cada época, impulsionaram novas visões e conceitos. Segundo minha pessoal interpretação do pensamento de Immanuel Kant, nós somos limitados dentro de nossas experiências cognitivas e somente podemos apreender as coisas dentro de tais limites, sendo a Intuição Pura um caminho possível para interpretações mais corretas da Realidade. Entretanto, como os limitadíssimos Seres que somos conseguiriam reais interpretações sobre A Origem, A Necessidade e A Imanência do Mundo? Meio-termo entre Platão e Kant é Baruch Spinoza, metodologista de uma filosofia na qual afirmava que apenas há uma Substância e nós, assim como todas as coisas vivas e mortas, presentes e ausentes, passadas e atuais e futuras, somos atributos Dela. Amplificando e reinterpretando agora o que concebo da filosofia espinosista, somos atributos limitados de um Conceito Cósmico que se vale por Princípios especulativos que se reduzem a pó pela História a cada novo pensamento ou descoberta científica, nos afastando daquela Única Substância e fazendo a caótica massificação do enredo de nossas Existências e Essências aprisionadas ao Acaso. Se toda a Filosofia em muitos de seus conceitos é assassinada pelas descobertas de novos ramos científicos, até mesmo a ideia do Acaso é Extinta. E, com isto, não há razão de minha parte para crer que haja quem Faça o Mundo, talvez nunca tenha havido uma Manifestação Consciente com um Propósito determinado dentro do Tempo e do Espaço a modelar toda a História Cósmica. E até a Anti-Cósmica, o Acausal, muito mais complexo do que a Realidade Vital aparentemente Causal onde habitamos. E se tanto o Acausal quanto o Causal forem definições que a nada confiável mente humana elaborou para que uma possibilidade de alcance de alguma certeza sobre nossas dúvidas existencialistas fossem respondidas?


O roteiro até aqui nos leva facilmente ao Ateísmo e é muito fácil ser um Ateu diante de tantas irrealidades dialéticas propostas por filósofos, religiosos e livres-pensadores sobre o tema de uma Autoria para O Todo e O Nada. Respeito os Ateus em sua convicção natural de em nada crerem, mas não objetivo me direcionar no exame das palavras do Dr. Manhattan em direção ao Puro Ateísmo. Há muito mais nas letras anteriores a este texto que não levam para vias ateísticas; paradoxalmente, o que é uma outra cortante ironia da genialidade de Moore, o Relojoeiro que Fez Watchmen junto com os Ponteiros (Dave Gibbons), leva à corrente ateística de reflexões e opiniões. O muito mais nas palavras da citação que produziu meu interesse em escrever cada palavra aqui é um leque enorme de abordagens que, infelizmente, não caberiam em um espaço virtual como este, um blog. Por menos que queiramos, como leitores, não nos apegar demais a algo que nos enlaça existencialmente, a dificuldade em escapar disto é como escalar uma alta montanha onde nunca se chegará ao topo. Nunca conceberemos, como Seres Pensantes, afirmarmos com toda a certeza que Existe quem Faça o Mundo, reduzidos estaremos eternamente a deduções que nem a Física Quântica ou a Metafísica conseguirão confirmar como viáveis, sem sombras, sem dúvidas, sem caminhos e vias que possam ser contestados. Tudo que a História do Pensamento abordou até hoje sobre o Sentido de um Causador de toda a Causa e Não-Causa é mero vazio destrutível na mira de intelectos determinados a niilismos de todo tempero forte destinados a fazerem ruir gastos e ultrapassados conceitos, crenças, dogmas e rituais.


E mesmo que os niilistas de ontem, de hoje e do amanhã se integrem de destruições das supostas respostas a questões que Humanos como nós ou Metahumanos como o Dr. Manhattan não são capazes de responder, devemos continuar na busca de, pelo menos, algum consolo em meditações solitárias. O assunto nunca é desnecessário para quem nele faz um barco a fim de remar por mares onde o afogamento em mares de Verdades e Mentiras são comuns. Verdades que se tornam Mentiras; Mentiras que se tornam Verdades: isto não é Fazer um Mundo nascer, o nosso próprio Mundo Interior? Somos os Autores do Microcosmo Externo onde vivemos ou somente vivemos tudo a partir do nosso Microcosmo Interno? Quem nos Faz em nossos imperfeitos mundos interiores? Sabemos, se estudarmos a nós mesmos, a resposta porque indagamos à Autoria do nosso próprio Ser, nos conhecendo como Sócrates eternamente propõe. Somente sabemos de nós, nada do Universo, nada do Espaço, nada do Tempo, nada da Alma Do Mundo e nem de um suposto Quem que Faz esta Alma Expandir-Se nas Estradas do Infinito. O Relógio talvez funcione sozinho mesmo e não precise de conserto porque não foi construído, Construiu-Se Por Si Mesmo. Nem Relógio exista, também, cada termo usado para pôr a Existencialidade dentro de um laboratório de pesquisas é possível de ser esmagado e lançado ao vento do esquecimento. Talvez, nós mesmos não existimos como pensamos existir e nem tenhamos sido Feitos, tanto quanto o nosso Universo e todos os Universos. Quem ou não Faça a Alma Do Mundo pode ser ou não uma invenção humana ou a humana invenção de Alguém no controle tenha crescido a tal ponto que ultrapassa o limite de nossa própria limitação como pensantes. E isto se tornou a eterna quimera de nossa Humanidade. 


Sendo, sem ou com Autoria, O Mundo segue. Ser, com ou sem Autoria,O Mundo É. E se não É com ou sem Autoria? E se nunca Vier A Ser sem ou com Autoria? Quem Faz O Vir? Quem Faz O Ser? Quem É O Autor? Quem Faz O Autor? Quem Fez O Autor?


Saudades Inomináveis a todos vós, Realistas Leitores!





BIBLIOGRAFIA


Moore, Alan 

Watchmen: Edição Definitiva/Alan Moore: Roteiro; Dave Gibbons: Arte/Letras originais; John Higgins: Cores; [Jotapê Martins: Tradução]. — 4 ed. — Barueri, SP: Panini Comics, 2022.


Tyson, Donald

Três Livros De Filosofia Oculta/ Escritos por Henrique Cornelius Agrippa von Nettesheim; Compilação e Comentários de Donald Tyson; Tradução: Marcos Malvezzi. — São Paulo: Madras, 2016.





💀💀💀💀💀💀💀💀💀💀💀💀💀




Leia também:✒️O Mundo Inominável





Postar um comentário

0 Comentários