Depois de muito postergar, finalmente assinei o Disney Plus, o serviço de streaming da Disney. Afinal de contas, 27,90 não pesa tanto no orçamento; é mais barato que um ingresso de inteira no cinema, alguns encadernados de HQs ou um jantar. E comecei a assistir a WandaVision, primeira série da Marvel no streaming. Não vou mentir; já há alguns anos que ando com certa fadiga de tudo que envolve a Marvel, apesar de já ter visto todas as porcarias de seus filmes no cinema. No entanto, devo dar o braço a torcer; pode-se até questionar a qualidade dos filmes do Marvel Studios/Disney, mas que Kevin Feige conseguiu criar uma máquina de ganhar dinheiro, isso é inegável.
Não
é surpresa que, desde antes da pandemia, as pessoas estavam cada vez mais
viciadas em streamings, e a Marvel/Disney muito espertamente decidiu
investir em séries. A primeira é WandaVision, a qual assisti aos três
primeiros episódios. Mas, afinal de contas, a série presta? Hum, depende; está
longe de ser a melhor coisa do mundo, mas não chega a ser a porcaria que eu
imaginava. Na verdade, a série talvez afugente um pouco o público-alvo dos filmes
da Marvel, que é constituído principalmente por crianças e adolescentes. Não
que tenha algo impróprio; é totalmente family-friendly. No entanto, a série é bem
parada. Nos primeiros episódios, quase nada acontece. As crianças, que esperam
ver uma série de ação de super-heróis, ficarão entediadas, de saco cheio. O seriado assumidamente assume a estrutura dos sitcoms norte-americanos.
Tanto que o primeiro episódio é uma referência a I
Love Lucy e o segundo, a A Feiticeira. Na realidade, WandaVision
é uma mescla de I Love Lucy, A Feiticeira o gibi Superman’s
Girl Friend, Lois Lane. No quadrinho, sempre a Lois fazia alguma merda, e o Superman tinha de solucionar. Na série, Wanda faz
merda, mas também ajuda a resolver porque tem superpoderes. Tem gente
comparando WandaVision com Legion, mas não vejo muita semelhança.
Legion é bem mais estranha e pretensiosa; WandaVision é uma série
inusitada para os padrões de enredo da Marvel, mas não foge da fórmula
bem-humorada dos filmes. É basicamente uma série de humor com um pouco de mistério.
Poderia até se chamar Os Sintozoides Também Amam.
No
enredo, temos Wa
Ainda há a vizinha intrometida deles, Agnes, interpretada por Kathryn Hahn, que aparece sempre sendo invasiva. Santa inconveniência, Batman! No entanto, para ser justo, era muito comum a tal “política de boa vizinhança” norte-americana, que era uma forma de integrar recém-chegados em uma comunidade. Essa prática tem perdido força nas últimas décadas, mas é meio que uma tradição de lá, e, nos anos 50, na era Eisenhower, era bem estabelecida. Segundo as teorias, Agnes na verdade seria Agatha Harkness, que nos quadrinhos foi a mentora de Wanda nas artes da feitiçaria.
Outra personagem que aparece é Mônica Rambeau, vivida por Teyonah Parris. Nos quadrinhos, como alguns sabem, ela foi a Capitã Marvel original. Na série, ela deixa a entender que sabe a verdade sobre o casal e até menciona o nome de Pietro, o irmão gêmeo de Wanda. Mônica usa o símbolo da Espada, que é uma organização irmã da Shield que detém ameaças alienígenas.
A série basicamente mostra o cotidiano de Wanda e Visão como um casal tentando se integrar à comunidade. No primeiro episódio, que se passa nos anos 50, Wanda tem de fazer um jantar para o chefe do Visão, o sr. Heart, e tudo o que pode dar errado realmente dá errado. Destaque para Debra Jo Rupp, que interpretava a mãe de Eric Forman em The 70s Show, como a esposa do sr. Heart. No segundo episódio, situado na década de 60, Visão e Wanda são encarregados de elaborar um show de mágica beneficente para a comunidade, mas Visão acaba ficando bêbado porque ingere um chiclete! No terceiro episódio, já nos anos 70, em technicolor, Wanda está grávida de Visão em supervelocidade, e, na gestação incomum, nascem os gêmeos do casal.
No entanto, fica a pergunta? Por que Visão ama Wanda, a Feiticeira Escarlate? Nos quadrinhos, isso é bem explicado, mas na série, não. Vale dizer que Visão não foi o primeiro autômato dos quadrinhos; essa honra cabe ao Tocha Humana original, Jim Hammond, que era um androide criado pelo professor Phineas Horton. Uma curiosidade: existiu um Visão original da Era de Ouro que não era um androide, mas um fantasma.
O Tocha Humana original está intimamente ligado ao Visão. Até mesmo porque, por muitos anos, se pensou que ele seria o Tocha Humana original recriado por Ultron e reprogramado com os padrões mentais de Simon Williams, o Magnum, que estava “morto”. Enviado para destruir os Vingadores, Visão acabou por trair Ultron e integrou-se à equipe. Com o tempo, ele e Wanda desenvolveram sentimentos e se casaram. Depois, Wanda usou seu poder de alterar as probabilidades para engravidar de Visão e ter um casal de gêmeos. Todavia, os sentimentos “humanos” de Visão existiam por causa dos padrões cerebrais do Magnum, e a razão para ele ter se apaixonado por Wanda foi exatamente essa. Tanto que Simon também amava Wanda, e eles formavam um triângulo amoroso. Também é preciso entender que o Visão não é um androide comum, mas um sintozoide, que se trata de um ser artificial, mas com reproduções de órgãos e músculos, idênticos a um humano. Ele tem até um pênis. A grande pergunta é porque um sintozoide precisa de um pênis se não pode reproduzir, mas, para a felicidade da Wanda, ele não é eunuco. Para ela, o Visão é um vibrador com apêndice.
Vale dizer que o cérebro do Visão é inspirado no cérebro positrônico dos robôs de Issac Asimov, mas, infelizmente, até ele comete erros de julgamento. Em uma fase dos Vingadores, para garantir a paz mundial, o Visão chegou a controlar todos os computadores da Terra. Depois se deu conta de seu erro, mas já era tarde. Considerado como uma ameaça à segurança nacional de todo o mundo, Visão foi sequestrado e desmontado por cientista. Os Vingadores da Costa Oeste conseguiram recuperá-lo, mas já todo dissecado. Isso foi relatado na história A Busca pelo Visão, escrita e ilustrada por John Byrne. O Visão é reconstruído, mas fazem um whitewashing nele, de vermelho passa a ser branco, e também se torna frio e sem emoções, porque não tinha mais os padrões cerebrais do Magnum. É preciso dizer que quem definiu tudo isso foi John “fucking” Byrne. É por essas e outras que Byrne é um gênio. Ou seja, ele deu uma explicação para o que era óbvio e porque Visão amava Wanda. É o tipo de coisa que a gente pensa: “mas por que diabos ninguém tinha pensado nisso antes?”.
Nas
histórias seguintes, Wanda começa a ficar cada vez mais borderline, até mesmo
porque perde os filhos. Outro problema que Byrne resolveu foi essa história dos
filhos dela com o Visão, pois, afinal de contas, como um sintozoide poderia gerar
vida se, em tese, ele nunca esteve “vivo”. O que Wanda fez foi pegar dois fragmentos da alma de Mefisto, o Capiroto da Marvel, para serem seus filhos. No entanto, o vilão Mestre Pandemônio
apoderou-se dos pimpolhos. Mais tarde, os dois voltaram a aparecer como os
heróis adolescentes Wiccano e Célere.
Chegou
a um ponto em que Wanda acabou por se un
Não seria essa a última presepada de Wanda. Depois disso, ela sozinha destruiria os Vingadores porque voltou a se lembrar de seus filhos. A memória dolorosa da perda de seus bebês tinha sido apagada, mas volta em razão da burra da Janet van Dyne, a Vespa, ter mencionado isso em uma conversa na piscina da mansão da equipe.
Entretanto, a maior desgraça (ou não, depende do ponto de vista) da qual Wanda foi responsável foi dizer a frase “não mais mutantes”, o que acarretou a redução extrema do número de mutantes nas histórias da Marvel. Teve uma época em que praticamente havia mais mutantes que humanos na Marvel. A editora quis reduzir o número de personagens mutantes porque já naquela época estava querendo investir nos Vingadores para levá-los aos cinemas, e os direitos dos X-Men estavam ainda com a Fox. É a Marvel para variar sendo ingrata com os personagens que praticamente levaram a editora nas costas quando ela estava falida, no final dos anos 90. E a Marvel fez também a mesma coisa com o Quarteto Fantástico e está fazendo agora com o Justiceiro.
Quanto
a autômatos como parceiros sexuais, isso não é privilégio do Visão. No filme I.A.
– Inteligência Artificial, de Steve Spielberg, o personagem de Jude Law é
um androide gigolô. No quadrinho francês, A Sobrevivente, de Paul
Gillon, a personagem é uma mulher que acha que é a última sobrevivente da
humanidade, e fica tão na seca que acaba seduzindo e fazendo sexo com o robô
serviçal. Todavia, se formos considerar as dolls, as bonecas sexuais
japonesas, podemos dizer que os autômatos sexuais já são uma realidade. Está
ocorrendo até queda na taxa de natalidade do Japão. Óbvio que a culpa não é apenas das dolls,
mas elas são um indicativo. E, na verdade, há muita gente no Ocidente que gostaria
que as dolls fossem mais populares por aqui, mas os governos criam mais
empecilhos. No Japão, se o cara não comete crimes, não cria distúrbios,
trabalha e paga impostos, o governo não se mete em sua vida, e ele pode até ter
uma doll em casa sem problemas. No entanto, por causa da queda da
natalidade, o governo de lá já está tomando algumas providências contra as dolls.
No Brasil, se as dolls chegassem aqui, daria a maior merda, porque o governo costuma
intervir na vida do cidadão e também porque a gritaria viria tanto da direita
quanto da esquerda, de religiosos conservadores defensores dos bons costumes à
feministas lacradoras contra a objetificação das mulheres.
Enfim,
para assistir despretensiosamente, WandaVision é uma boa série. Ao meu
ver, não chega a ser uma série tão inteligente com alguns defendem. É bem light,
com episódios de mais ou menos trinta minutos. Entretanto, teria de assistir ao
resto do seriado, pois vi apenas três episódios, para ter uma opinião definitiva.
Imagino se a Disney não compraria os direitos do Ranxerox, outro androide
fornicador, para fazer uma série dele com a Lubna. Aí, sim, é que poderiam fechar
o Disney Plus de vez depois dessa, e fechar a Disney também.
0 Comentários