BOECHAT NÃO MAIS ALEGRARÁ NOSSAS MANHÃS



F
aleceu hoje, em um acidente de helicóptero, provavelmente um jornalistas mais irreverente e popular em ação, do tipo raro admirado por “gregos e troianos”. Aos 66 anos, o jornalista tinha mais gás que muito garoto para exercer seu ofício, praticamente “morando no trabalho”, ao qual chegava antes das 7 e saia mais que metade do dia depois. Gostaria de poder entregar um relato rico como muitos colegas e amigos de profissão como William Bonner, William Wack, Cid Moreira, Mirian Leitão (sem sessão espírita dessa vez) ou mesmo seus companheiros diários de rádio deram. De minha parte eu era mais um cara acordando atrasado, num sofá, começando o dia como toda as críticas ácidas – e muito bem aplicadas – que o “careca” aplicava sobre os mais diversos, fosse contra Trump, Obama, Lula, Bolsonaro, Dilma, a copa de 2014, STF e seus arroubos autoritários, Lava Jato, Malafaia (com direito a franca resposta em vídeo abaixo) o que fosse. Por mais que muito pretenso “militante de direita delirante” na internet tentasse diminuir sua figura apenas o chamando de “comunista” ou “Boechato”, apenas assinalava que o papel de todo bom questionador estava sendo feito em sua excelência, o primário e eterno “colocar o dedo na ferida”.



 Não que fosse impecável, ninguém o é, ainda mais se tratando de um profissional cujas funções envolvem diário e intenso estudo para articular sobre fatos, muitos os quais podem ser “revertidos” e se descobrirem “meias-verdades”. Boechat, por mais severo que fosse, se mostrava esperançoso (assim como eu) pelo brasileiro, mesmo que nas duras penas, está começando a se atentar tanto na escalação de ministros do governo, quanto de nossa suprema corte, com a mesma atenção que dava outrora a seleção brasileira de futebol. Por mais que tivesse uma posição de centro-esquerda, não se portava de maneira alienante, seletivo em ver falhas. A veracidade no que é apurado por um jornalista deve suplantar sua ideologia, ao que via da regra se aplicava ao velho Ricardo.




A sociedade civil, em especial por gozar de dezenas de fontes de informação na internet, e com razão se sentir feito de idiota por seu televisor, nutre um grande ranço pela mídia em geral. O jornalismo deixou de ser levado como atividade séria pela percepção pública, se tornando apenas uma forma de ativismo político contra A ou B. Instituições longevas estão perdendo prestígio e se tornando piada de bar; Não a toa, muitos profissionais do meio que prestaram homenagens a Boechat tocaram nesse ponto, desses “tempos sombrios e incerto para o jornalismo”. Contra toda essa cortina de fumaça das “fakes news”, “ascensão de extremas direitas no mundo”, “retrocesso moral” ou qual mais explicações que fujam de qualquer autocrítica da cisão cada dia mais exposta entre um público cada vez mais cínico em relação a emissoras e estas incapazes de reconhecer como o jogo mudou, perdemos um dos poucos que ainda poderíamos chamar por seu ofício sem ser um insulto, dadas as circunstâncias. Alguém em que até um presidente – em leito de hospital – (que levou, como qualquer outro, dezenas de pauladas quando deu suas “caneladas”) tem que ter a hombridade de reconhecer a parca razão em um mar de lama que tínhamos, fosse no jantar em horário nobre, fosse quando acordávamos no sofá pela manhã. Como o próprio diria sabiamente, estava lá não para ser ouvido, para fazer a população se ouvir. Claramente, um campeão na vida, dentro e fora de seu “ringue”.


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