A Noite de Arthur




-->Texto escrito por : Silvio Antonio <--


Para aqueles que gostam de estudar xadrez principalmente com pequenas partidas “miniaturas” e composições de problema; trago hoje essa lenda que traz em si algumas atividades de reprodução e enigmas:


Certa vez em uma época remota, uma civilização rica e avançada; seus habitantes viviam em harmonia, eram livres e felizes. De lá partiam navios para todos os cantos do mundo levando a ciência, a medicina, a agricultura e as artes; também, para lá seguiam peregrinos em busca de conhecimentos avançados.
Na formação dos jovens, havia uma matéria que tratava da manifestação humana mais cruel e violenta: que é a guerra; porém eles eram civilizados e com sabedoria ensinava sobre a guerra; pacificamente com uma arte chamada xadrez.
Após muitos anos de estudo, os jovens deveriam partir para uma grande jornada que os levaria a conhecer terras distantes e lugares desconhecidos; eles se preparavam desde a infância, primeiro com a ajuda dos pais e depois com a ajuda de mestres dedicados.
Antes de partir havia o ritual da despedida; havia no centro de uma praça o “Templo Itinerário”, onde cada jovem entregava seu plano de viagem; pois aprendiam desde crianças, que um viajante sem plano é “um pássaro sem rumo”; sabiam que para controlar seus destinos era preciso um plano e determinação; assim, a entrega do plano representava essa intenção. No interior do Templo Itinerário os jovens receberiam dos três sábios conselhos e orientação para alonga jornada que começa logo na manhã seguinte.
Esta é a história de um desses jovens; o jovem Arthur; que depois de anos de preparação, pensava: “o que mais poderia aprender naquela única noite? Uma noite? Duvidas que se dissolveriam agora que ficaria a sós com cada um dos três sábios.

O Primeiro Sábio.

Arthur subiu as escadarias do templo, atravessou-o e viu-se diante de um jardim, onde o sol de fim de tarde, criava um ambiente misterioso e lá o esperava o primeiro sábio. Sentou-se de frente com um tabuleiro já montado entre eles e as peças claras voltadas para o seu lado; então deu inicio a partida:

1.e4; a6
2.Cf3; e5
3.Cxe5; c6.



Foi quando o Sábio falou:
 
-- Algumas nações progridem, outras desaparecem, algumas pessoas resistem, outras desistem. Onde está a diferença? Seria o destino, a sorte de cada um?
-- Na nossa civilização não pensamos assim... Disse o jovem.

4.Cxc6; dxc6...



-- A diferença está na visão que as pessoas tem de seu futuro; se você acreditar que terá sucesso na viagem, é muito provável que assim será. Se você, no entanto, acreditar que não terá sucesso, é certo que assim será...

5.d3; Bc5
6. c3; Cf6
7. Bg5; ...


-- As criaturas da guerra, com suas flechas pretas e seu desejo de destruição, também usam o otimismo, a competência, a persistência, a coragem, a criatividade, até mesmo a humildade! Um ladrão, um impostor, um bandido, todos esses também podem usar essas habilidades...

7... h6
8. Bh4; Cxe4...


-- Onde está a diferença? – Completou o sábio.
-- A diferença; disse o jovem, esta nos valores de cada um.
-- Sim, mas o que são valores? -- Perguntou o velho sábio.
-- Os valores estão contidos nos princípios éticos e morais de cada pessoa. -- Disse Artur.
-- Sim, mas onde é que tudo é espontâneo, natural, universal?
-- Então, finalmente Arthur percebeu que estavam falando do amor.



9.Bxd8; Bxf2+
10. Re2; Bg4#.


 
O Sábio abriu uma caixinha de madeira trabalhada e de dentro tirou um pergaminho de couro contendo essa composição:

Jogam as brancas.

Segundo Sábio.

 Estava escuro quando o segundo Sábio recebeu o jovem e o levou para dentro do templo, numa sala grande ampla com muitos livros; uma biblioteca e no centro da sala uma mesa com um tabuleiro e novamente de frente para as peças claras iniciou:


1. e4; c5 
2. Ce2; e6 
3. Cc3; Cc6



Estava começando a chover de forma que o ruído  na noite criava um ambiente místico de intimidade e harmonia e o Sábio falou:

-- Com certeza você vem se preparando durante todos esses anos. Entretanto, à medida que a viagem prosseguir, maior será a complexidade dos problemas; e você só continuará se estiver cada vez mais preparado.

4. g3; d5  
5. exd5; exd5 
6. d4; Bg4 



-- Atrás do desempenho de um grande músico, ou de uma bailarina, ou de um carpinteiro, existe uma jornada de práticas, estudo, dedicação e acima de tudo método com competência. Alguns levam consigo suas cartas e sabem utiliza-las; continuou o sábio, acontece que muitas vezes as coisas não acontecem exatamente como foram planejadas. Uma tempestade inesperada, uma calmaria fora de hora, uma doença, ou um inverno incomum poderão adiar os planos. É ai que alguns desistem, e não tentam novamente; veja a vida dos rios, por exemplo. Na sua rota para o mar, também encontram obstáculos aparentemente intransponíveis; mas não desistem; modificam-se, se for preciso, criam novos meandros, passam pelos lados e pelos obstáculos e chegam ao seu destino.

        7. Bg2; Cxd4 
        8. Bxd5; Dxd5
        9. Cxd5; Cf3+ 
       10. Rf1; Bh3#
 

Então o sábio abriu uma gaveta e entregou um novo pergaminho de couro contendo essa composição:

Jogam as brancas.


O som de uma flauta indicou ao rapaz um novo ambiente onde estava o terceiro sábio. Uma sala despojada de qualquer tipo de adorno, mas era ampla e confortável. A noite tinha avançado bastante, e Arthur sentiu um pouco de fome; o sábio ao perceber compartilhou com ele chá e torradas. Neste terceiro sábio havia uma diferença que passava a impressão de ser um pouco mais jovem que os demais, e quando sentou de frente ao tabuleiro montado viu que desta vez estava com as peças escuras. O sábio então entregou ao jovem um pequeno frasco de vidro e lhe disse: 

O Terceiro Sábio.

 -- A areia deste frasco, trabalhada corretamente, ajuda a erguer um castelo; com a técnica certa esta mesma areia poderá ser transformada em vitrais. Leve-a consigo como alimento para sua criatividade. Deu inicio a partida assim:

1.e4; e5
2.Cf3; Cc6
3. d4; Cxd4

 
-- Todos nós nascemos com habilidades para criar coisas novas. Não existe nada definitivo, tudo pode ser melhorado. Porém, alguns acreditam que não nasceram com esse dom e seguem sempre do mesmo jeito, sem inovações, nem melhorias; muitas vezes o ato de criar é um ato de descobrir.

4.Cxe5; c5
5. Bc4; Ce6...


-- Todas as coisas já estão criadas, basta estar receptivo para captá-las. Continuou o Sábio. Se for preciso, abandone ideias preconcebidas, rejeite os preconceitos, destrua os mitos...

6. 0-0; d6




-- ...Deixe de lado suas inibições, suas preocupações e ansiedades. Assim você estará sensível às novas ideias, principalmente àquelas que sempre estiveram junto de você. Continue estudando e com sua determinação, você progredirá; talvez passe a se considerar mais virtuoso ou superior que os outros. Cuidado! Está é uma grande cilada que poderá até matá-lo, fisicamente ou espiritualmente! Somos imperfeitos. Aceite seus próprios erros, e anote-os em seu manual de erros do passado, para não repeti-los no futuro. Renove-se com eles.



7.Bb5+; Bd7
8. Cxd7; a6?!
9. Cf6+; Re7
10. Cd5#. 



Então o sábio retirou de seu bolso um pergaminho de couro, que entregou ao rapaz, contendo essa composição:

Jogam as brancas.


 Ele o conduziu até a saída, onde os outros dois sábios ali esperavam; o primeiro sábio que era o mais idoso, falou novamente:
-- O amor, será a única moeda aceita em todas as épocas e em todos os lugares por onde você passar. Ame o próximo, perdoe seus defeitos, não seja intolerante. Todos os viajantes que encontrar pelo caminho estão com você, e cada um à sua maneira, em busca da mesma paz de espírito; enquanto o homem tiver amigos, gente que ele ame e o ame, ele será feliz. Mas, se não tiver esse laço de amor com a vida, não terá razão para continuar vivendo. Despediram-se com um abraço; um abraço de alma. O ruído dos pássaros e o aroma das plantas indicavam que logo seria a hora de partir.




 [Pequena Homenagem]:


Esta é uma obra de ficção; porém escolhi o nome “Arthur” para fazer uma pequena homenagem à memória do Sr. Arthur Napoleão, um celebre pianista português; de grande importância para o xadrez brasileiro. Além da música, interessava-se pelo xadrez, tendo sido o autor da Caissana Brasileira, um livro com problemas de xadrez, publicado em1898.



Paz; Força e Honra.





Referencias:













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