In memoriam: Sidney Poitier

 


Infelizmente, faleceu ontem, dia 6 de janeiro, aos 94 anos, Sidney Poitier, o qual acredito ser o primeiro grande ator negro a se destacar em Hollywood. A meu ver, o adjetivo “negro” é um tanto reducionista, pois o que importa em sua essência é a atribuição do talento como ator. Porém, se levarmos em conta a época em que Sidney Poitier realmente alcançou os holofotes, os anos 60, década bem turbulenta em questão do reconhecimento dos direitos civis nos EUA, reconheço que faz certo sentido a ênfase no adjetivo. E até hoje chamamos Denzel Washington ou Morgan Freeman de “grandes atores negros”, em vez de simplesmente “grandes atores”.

Admito que, ao contrário dos outros atores, lamentavelmente não conheço a fundo a carreira de Sidney Poitier. Assisti a alguns de seus filmes e estou ciente de sua importância na indústria, principalmente por ter sido o primeiro ator norte-americano negro a ganhar o Oscar, mas ele não é um ator do qual posso me gabar de saber muitos detalhes a respeito.


Nascido em Miami e tendo crescido nas Bahamas, Sidney Poitier fez sua estreia no filme No Way Out (O Ódio é Cego) de 1950, mas foi somente com Uma Voz nas Sombras (Lilies of the Field) de 1963 que ele ganhou enfim sua fama e inclusive o Oscar de melhor ator. No enredo, Poitier interpreta Homer Smith, um viajante que acaba por providência do destino tendo de construir uma capela para cinco freiras, ainda que sem remuneração.


Outro dos filmes mais marcantes de Poitier é sem dúvida alguma Ao Mestre com Carinho (To Sir, With Love) de 1967, em que ele interpreta Mark Trackray, um engenheiro desempregado que aceita o emprego de professor em uma escola na periferia de Londres, com uma turma barra pesada. Apesar de ter um enredo com elementos que podem ser considerados clichês atualmente, como o professor que consegue redimir jovens, mesmo sofrendo preconceito, o filme teve um grande impacto na época e praticamente sedimentou a fama de Poitier, inclusive por conta da música-tema, interpretada pela cantora Lulu, que também cantou a música-tema de O Homem da Pistola de Ouro, da franquia James Bond.


E não posso deixar de mencionar Adivinhe Quem Vem para Jantar? (Guess Who’s Coming to Dinner?), filme dirigido por Stanley Kramer, em que Poitier faz o papel de John Wayde Prentice, um médico sul-africano que se torna noivo de Joey Drayton, interpretada por Katharine Houghton, uma jovem norte-americana. Joey enfim apresenta John para seus pais, Matt e Christina, vividos por Spencer Tracy e Katharine Hepburn, respectivamente. O interessante é que, a despeito de Matt e Christina serem essencialmente boas pessoas, inclusive cultas, com pensamento liberal e até mesmo left wing, o casal não consegue esconder o estranhamento e até certa preocupação com o fato de sua filha se envolver com um homem negro, o que comprova que até mesmo pessoas educadas e esclarecidas podem manifestar posturas racistas, ainda que involuntárias. Creio que Adivinhe Quem Vem para Jantar? inclusive foi o filme que apresentou o primeiro casal inter-racial, algo que nos anos posteriores não foi tão representado nos filmes. Ao contrário de nós, brasileiros, os norte-americanos não são um povo muito miscigenado, e tenho notado casais inter-raciais terem mais incidência em filmes apenas de uns vinte anos para cá.



Por fim, vale ainda uma curiosidade: Sidney Poitier serviu de base para a aparência de John Stewart, o Lanterna Verde que é o primeiro herói negro da DC. Isso é admitido até por Neal Adams. Imagine só como seria um filme do John Stewart interpretado por Poitier. Na realidade, acho que é melhor não imaginar, porque um filme do Lanterna Verde nos anos 70 teria efeitos especiais muito toscos, para dizer o mínimo.

Enfim, R.I.P., Sidney Poitier. Seu legado na história do cinema perdurará para sempre, até mesmo por conta da “representatividade”, expressão tão em voga em nossos dias.

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