FANFIC - Hellblazer: O Crânio Do Poeta Sem Nome

Arte de Glenn Fabry 


Deposito minha espada, 

Espada que em todas

As antigas batalhas 

Por mim travadas

Foi uma espada 

Amada, 

Por mim amorososamente

Forjada, 

Na cova desgraçada minha, 

Onde finda-se sempre 

Toda a minha desencorajadora

Jornada. 

No rastro da minha

Encontrável mortalha, 

Dou menos do que sete passos 

Em direção ao meu 

Finalizar detestável 

Na curva da suja esquina 

Da rua perdida

Mais sem adrenalina

Ou o peso das ruas

Que são ruas perdidas. 

Na sala estraçalhada

Da minha entristecida 

Interior morada, 

Morada de sonhos esquisitos, 

Morada de sonhos aflitos, 

Morada de sonhos extintos, 

Sabiamente emito 

O mais bravo extremo gemido. 

Os meus lutos são mudos, 

Os meus rumos são surdos, 

Os meus muros são cegos, 

Na lama sou concreto, 

No deserto sou inseto, 

Na cidade sou dejeto. 



Somente tive tempo de chegar depois que os últimos versos foram recitados por uma voz parecida com uma mistura de Marilyn Manson, Alice Cooper e Rob Zombie em um dia de temporal. Mais 125 corpos acabam de se somar aos anteriores 405 defuntos de operários que tentaram mexer neste cemitério. Aceitei esta investigação aqui apenas porque nunca conheci esta parte perdida da Escócia, a Cidade de Scarfskerry, realmente localizada dentro do cu do mundo. Os dados que me deram, entretanto, me deixaram bem curioso e chamei o Chas para me trazer aqui, sob protestos da querida esposa dele que tanto me odeia. Eu pedi para ele me aguardar porque meu trabalho aqui será bem rápido, sei exatamente o que vou fazer e não será nada demorado. 


Quem me contatou foi um bilionário escocês residente em Falkirk que é dono de quase toda a Escócia, Sir Harold Kent Langley XII, um abastado de 87 anos, bem conservado e inexplicavelmente atlético. E bastardo que explora mão-de-obra barata em todos os Continentes, com boatos de suspeitas de mão-de-obra escrava em alguns casos. Os negócios dele envolvem somente suspeitas construções  de shoppings em cidades pequenas, empregando a população local e exercendo o hipócrita papel de "fomentador social do crescimento de pessoas menos favorecidas", como ele declarou na Times no ano passado, quando eleito pela porra daquela revista como "A Personalidade do Ano". Se os putos jornalistas daquela merda farejassem melhor o rastro do sujeito pelo mundo, como eu fiz antes de aceitar vir para cá, descobririam que o canalha está envolvido com Tráfico de Drogas, Tráfico de Escravas Negras, Tráfico de Escravas Brancas, Pornografia Infantil, Comércio Pedófilo Intercontinental, venda de armas a terroristas e organizações criminosas… Descobri com meus contatos no Submundo Astral tantos crimes desse cara que enojariam os maiores filhos da puta da História Mundial. Nunca foi pego durante os 65 anos de Crime, ele compra até mesmo países pobres inteiros e é o financiador secreto de todos os Governos, cujos órgãos investigativos fazem vistas grossas para seus crimes. Mas, parece que alguma coisa neste cemitério não está nada feliz com a chegada dele nesta cidade. 


E estou aqui para resolver este assunto após uma conversa com o meu "contratante", por assim dizer, há dez dias atrás… 


— "Quem me indicou?" 

— "O Professor Chester Trautmann, filho de um dos meus amigos mais íntimos."

— "Ah, Chester, aquele escocês arrombado que ajudei há seis anos por estar sendo perseguido por Bacantes Canibais e ainda por cima quis comer uma namorada que eu tinha na época."

— “Bom Deus, Chester nunca me disse que foi dessa maneira que o conheceu…"

— “É muito bom que aquele filho da puta jamais ponha os pés de novo na Inglaterra e se enterre em algum rabo das vagabundas que ele adora. Se eu soubesse que ele me indicou a você, nem teria vindo aqui."

— “Senhor Constantine…"

— “Me chame de John, camarada."

— “John, o Chester nada tem a ver com o problema que me motivou a contar com a sua presença aqui. Ele me disse que as suas técnicas, qualidades, especialidades e habilidades incomuns no Reino das Artes Ocultistas seriam de muito valor para me ajudar. Eu aprecio o Ocultismo e resolveria sozinho o que está acontecendo se tivesse mais conhecimento, o que, infelizmente, não possuo.”

— “Você andou brincando com Mammon mais do que devia e, agora, ele está cobrando até o olho do teu cu como pagamento?” 

— “Mas, que linguagem obscena, lembre-se de minha idade!” 

— “Cara, vá direto ao assunto, a sua relação com o Chester me deixou muito puto! O que, afinal, está acontecendo com seus negócios? Ou é algo pessoal?” 

— “Vejo que você é um homem determinado sempre a ser direto e reto, John Constantine. Pois bem, também serei assim a partir de agora. Em uma cidade do interior deste meu país, estou há dez meses tentando construir um shopping  no lugar de um grande cemitério abandonado que pertenceu a Clã de Guerreiros e Poetas cujo nome se perdeu com o tempo. Tenho uma ligação bastante afetuosa com aquela cidade e gostaria de dar melhores condições aos moradores da mesma, mas o que ocorre lá no cemitério está atrasando meu empreendimento. 405 operários já morreram tentando pôr máquinas para trabalharem naquele lugar e de formas horrendas, por combustão espontânea, empalados pelos próprios instrumentos, esmagados pelas máquinas… Enfim, tudo que você puder imaginar em relações a mortes horríveis e inexplicáveis ocorreu naquele cemitério. E todas as vezes que ocorreram os incidentes, sempre durante o dia, como me relata sempre o chefe da Polícia local, toda a cidade ouve a recitação de um poema dantesco. É como uma Maldição lançada contra minha intenção de ajudar as pessoas que moram lá. Por isso, John, preciso muito que me ajude a solucionar este problema a fim de que as obras continuem para que a cidade cresça."

— “E com o seu dinheiro, esse tempo todo, você foi acobertando as ocorrências e atraindo futuros pobres coitados que se tornaram defuntos… Grande homem de negócios você realmente é…”

— “Todos os efeitos de escândalos em excesso por causa deste assunto apenas prejudicariam as minhas intenções, que são totalmente nobres. A Imprensa não pode saber disso, nem as autoridades.”

— “Até porque você comprou todo mundo neste país mesmo.”

— “Você veio me ajudar e às pessoas que quero ajudar ou me julgar, John Constantine?” 

— “Tudo bem, eu vou ajudar aquelas pessoas, não você, meu caro. Me dê alguns dias para investigar com meus contatos mais sutis e vou lá para resolver tudo.”

— “Quanto custará, John?” 

— “Não se preocupe em me pagar, mas de alguma forma vou te cobrar algum dia.”


E aqui estou eu, em pleno dia escocês ensolarado, passando por cima de cadáveres, no meio de um cemitério. É bem pior do que ele me disse, as próprias máquinas e instrumentos parecem ter criado vida e os estraçalhado das piores maneiras. Preciso fazer o que tenho a fazer antes que a equipe de limpeza do figurão chegue por aqui, já vi um motoqueiro passando três vezes perto, deve ser contratado dele para avisar sobre cada incidente. Aquela cripta ali é o que procuro, encontrarei o meu tesouro que quase ninguém quer ter para si. Esse cheiro de cemitério nunca me foi desagradável, afinal meu caminho é um amontoado de gente morta enquanto eu mesmo continuo resistindo a tudo de pé e fumando meus cigarros. Deve ter a ver com o sangue de Nergal toda esta minha resistência ou a vida que eu levo me retira das maiores estatísticas de mortalidade por eu não me arriscar nas luzes? Bem, não é hora para isso, eu preciso é pegar o que vim buscar agora mesmo. 


Sim, te encontrei agora… Antigo, muito antigo, muito mais do que o próprio mundo. É daqui a origem de tudo neste caso. 


— Vamos conversar um pouco, meu amigo. Relaxe agora, não sou comparsa daquele bosta que você não quer aqui. 





Feita a conversa que durou alguns segundos em outras Esferas, me mando em direção ao táxi do Chas. A equipe de limpeza chegou, bem silenciosa e discreta, no exato momento em que entrei na carruagem dourada do meu amigo de bebedeiras e tretas. 


— Direto para a casa do Sir Babaca, Chas. Sem uma pergunta, estou trabalhando nisto ainda. 


Ele me obedece e partimos, uma viagem que durará nove dias, com poucas paradas para lanches e repouso em pousadas de quinta categoria. Nada de bebidas, estou trabalhando e estabelecendo amizade com meu novo amigo envolvido por um pedaço da saia mágica da Madame Xanadu que rasguei enquanto ela dormia há 21 anos atrás, logo após a gente ter dado uma trepada... Meu amigo é bem informado, me detalhou tudo que eu queria saber sobre os motivos por trás de todo o interesse do Harold naquele cemitério em um verdadeiro fim de mundo. Fico admirado desta minha empatia com Seres assim, eu devia me fazer bilionário no YouTube com vídeos narrando minhas investigações filmados pelo Chas. Mas, não quero holofotes em cima de mim, meu trabalho nas Trevas ocorre de um modo mais dinâmico. Sou um velho dinâmico para tempos de conexões instantâneas. Mas, as conexões que eu quero são permanentes, como a que estabeleço com meu amigo sem pele. Darei um grande presente para ele.


.


.


.


Chegamos, enfim, à grandiosa e afrescalhada mansão de Sir Harold, "a mais bela obra de arte escocesa", como aquela merda da Times mencionou naquela porra de matéria endeusando esse verme. Chas vai ficar me aguardando, eu não vou, também, demorar muito por aqui. Mas, preciso entrar de outro modo para fazer algo antes de encontrar aquele velho escroto. Sugestão mental para fazer o porteiro abrir a entrada, eu passo invisível por ele; mais uma sugestão do tipo, para fazer o mordomo abrir a porta de entrada da mansão em si, passo por ele do mesmo modo anterior; empregadas não me vêem, o Manto de Hades que estou usando é o mais eficiente modo de me fazer inexistente aos olhos físicos; e aos psíquicos e espirituais, porque um homem como ele tem duas Guardas nos Planos Sutis onde ele mora que o avisariam imediatamente se eu tentasse alguma coisa estando visível aos olhos deles. Entro na biblioteca de 31.000 livros dele, duvido que ele tenha lido a metade ou iniciado qualquer leitura. Edições antigas e luxuosas adquiridas durante 440 anos pela Família Nobre dele, de onde saíram soberanos escoceses que tentaram se desvencilhar das garras da boa e velha Mãe Inglaterra. Eu ponho meu amigo acima da escrivaninha, guardando meu pedacinho de tecido mágico, me despedindo dele com um beijo. E vou ao encontro de Harold no jardim. 


Ele está lendo um jornal de finanças e me faço visível apenas para ele, que se encontra, para a minha sorte, sozinho. Ele mora sozinho nesta casa há 26 anos, depois da morte da esposa e dos seis filhos em um acidente de jato particular bastante estranho. Não estou aqui para investigar se ele matou a família e foi ao puteiro, somente quero dar algumas palavrinhas com o sujeito. 


— Está feito, Harold. 

— Cumpriu, então, com o que lhe pedi. Como foi? 

— Tão normal como trepar com três freiras na Capela Sistina. 

— O que acontecia por lá? 

— Um Elemental de Cemitério bem poderoso que eu convenci a deixar em paz os seus negócios a favor dos moradores da cidade que ele defendia. 

— Mas, um Elemental desse tipo se encarrega apenas de seu próprio ambiente, não de toda uma cidade! 

— Quando um grande perigo na forma de um grande bem se aproxima de uma cidade, todos os Seres Mais Antigos do lugar saem em defesa dela, meu chapa. 

— Do que quer me acusar? Você me conhece bem, Chester havia me falado que você tem os mais diversos contatos no Subterrâneo. 

— Eu farejo de longe lixo como você, Harold. O que você fez naquela cidade está chegando para te cobrar. 

— Vai me denunciar, John? E quem vai acreditar em um Mago vagabundo, advindo de uma  família com moral bastante duvidosa e mais parecido com um gangster de sobretudo sempre com um cigarro imundo na boca? E que passou anos trancafiado em Ravenscar como um porco enlouquecido por ter sido o responsável pela morte de uma certa criança chamada Astra? Eles acreditariam, John Constantine, em mim ou em você? Eu tenho Poder e Poderes, homem, que você sequer imagina. A primeira vez que você chegou aqui, meus Seguranças Astrais te definiram para mim nos mínimos detalhes. Você pode ter ludibriado o Primeiro Dos Caídos e os outros Dois do Inferno, mas aqui no Plano Terrestre eu sou O Primeiro Dos Vencedores. Uma palavra minha agora e minhas Harpias te estraçalhariam vivo. Quer medir forças comigo, seu vagabundo maldito? 

— Você sempre teve condições de resolver tudo por lá sozinho, mas a sua consciência pesa toda vez que pensa naquilo que fez por lá. 

— Saia da minha moradia, seu inseto, antes que eu mesmo frite a sua alma! 

— Já estou saindo, seu babaca… Adeus.

— Desça para o Inferno, desgraçado! 

— Esse é um lugar que você não vai ver tão cedo, Harold. 


Eu saio da mesma forma que entrei, invisível para empregados físicos e invisíveis da mansão. Dou sugestões para que cada um deles me siga, dos três Planos do lugar inteiro, saindo pelo portão após minha saída, seguindo para suas casas no caso dos vivos e para muitas Moradas Astrais específicas no caso dos mortos. Eles não tem nada a ver com o que vai ocorrer com aquele velho seboso miserável. Os vivos sequer sabem dos mais escabrosos negócios dele e muitos dos mortos eram escravizados pelo Mago que ele é. Entro no veículo do Chas, abro a janela, acendo um cigarro e olho para a mansão. 


— Chas, você já viu uma mansão inteira desaparecer diante dos seus olhos? 

— Você não tem poder para fazer isso, John. Não que eu saiba… 

— Não tenho mesmo, parceiro, mas conheci um amigo durante os últimos dias que tem. Fique atento para o que vai acontecer, será um momento único para você. E para mim. 


Nesse momento, Harold deve estar continuando a ler o jornal, com a guarda baixa, atento às letras do papel e, não, aos textos sendo escritos nas paredes do paraíso artificial dele. Ele é um Mago Natural bastante forte, que sabe de cada um dos nuances da Arte como poucos, um criador de um Sistema Mágicko próprio que o ligou aos Sistemas Naturais do mundo. Os shoppings construídos em locais de forte magnetismo apenas reforçam a influência mundial dele. Legiões colhem para ele Energias das quais se alimenta e, a certo ponto da vida atual dele, ele conseguiu o propósito que estabeleceu como o maior ao iniciar sua Vida Mágicka: alcançou a Imortalidade. Eu nunca poderia ser capaz de bater de frente com esse cara, sou ousado, mas não burro de me meter com um sujeito bem mais perigoso do que eu. O meu amigo encontrado no cemitério me contou isso tudo e muito mais acerca desse calhorda. 


Aos 27 de novembro de 1951 iniciou-se toda a sequência de eventos que se concluirão hoje, 27 de novembro de 2020. A Sincronicidade manda lembranças entre as paredes do Tecido Invisível Das Eras e eu, apostador nela, apenas quero assistir o fim de camarote. Naquela cidade, com dezoito anos, Harold e os amigos tão cafajestes quanto ele costumavam frequentar os bordéis sujos e fedidos, gastando a grana toda que papai e mamãe lhe davam com prostitutas. Ele já estava envolvido com Magia dos mais diversos tipos desde os onze anos de idade, fruto dos ensinamentos do avô, Sir Harold Kent Langley X, um tipo de Merlin escocês da época, oculto para o grande público, conhecido da Comunidade Ocultista local na ocasião. O Harold neto aplicava o conhecimento na época apenas para dar prazer às prostitutas do país inteiro e hipnotizar virgens de dez a dezoito anos para poder estuprá-las. Mas, uma virgem naquela cidade, Kathleen Connor McIntyre, pobre, linda e estudante de Literatura Escocesa, também de dezoito anos, ele não conseguiu hipnotizar quando a encontrou na rua em uma noite de caçada noturna, encontrando-a na rua porque ela gostava de passear pelas madrugadas. Indignado, ele a espancou, arrastou até o cemitério e a violentou doze vezes, antes de matá-la por estrangulamento. Ele deixou o cadáver exposto, saiu correndo em direção ao conversível dado pelo papai e pela mamãe, jurando nunca mais pisar naquela cidade. A moça recebeu um enterro digno, financiado por todos os moradores da cidade, que pagaram um escultor para construir uma cripta em memória dela. E o meu amigo, comovido com o fim que ela teve e sedento de vingança, mudou-se para aquele cemitério deitando no caixão dela. Ele sabia que Harold voltaria suas intenções para a cidade algum dia. 


Eu menti para o desgraçado quando disse que meu amigo era um Elemental. Ele é muito mais do que isso, é o próprio Espírito Protetor daquela cidade, de imemorial origem. Não parece ter nascido neste mundo de tão Evoluído que é, mas se manteve feliz por milênios naquela região, cuidando de todos que nasciam e morriam naturalmente. O estupro e assassinato de Kathleen foi o primeiro crime praticado naquela cidade, repercutindo mundialmente e indignando milhões de pessoas. Harold jamais pisaria de novo naquele local porque sabia que o Vingador queria o sangue dele. Por isso, a construção do shopping, para poder dominá-lo e absorver-lhe a Energia, pouco a pouco, até matá-lo, como ele fez com outros Seres Antigos Planetários através de Encantamentos feitos nos materiais de construção dos shoppings, era a verdadeira razão da insistência dele com o empreendimento. Ele me chamou porque temia o meu amigo e eu trouxe este até ele, que reuniu todo o Ser que ele é na única parte física do corpo de Kathleen que sobreviveu ao tempo: o crânio. 


Ele se tornou o crânio, aguardando o dia de hoje. Outro Espírito Protetor em Scarfskerry nascerá através da Consciência Coletiva dos moradores dela dentro de pouco tempo. Eu tapo sutilmente os ouvidos do Chas e abro os meus sob camadas densas de proteção. Eu quero ouvir o último poema do meu amigo. Eu já o estou ouvindo… 


Entre os velhos

Livros anteriores 

Ao meu antigo

Livro Interior, 

Encontro-me com

O odor expansível

De todo o meu horror. 

O odor é de um imenso 

Ninho de intenso torpor, 

Caio nele rutilante, 

Assistindo-me espaçante

Por entre tenebrosos 

Rios gigantes. 

Sou sacrificado, 

Sou surrado, 

Sou cuspido, 

Sou tido no Limbo, 

Sou tido no lixo, 

Meu caixão ali pronto, 

Meu caixão ali erguido… 

Efêmero ridículo, 

Estou próximo de

Fatídico ataque cardíaco. 

Posso cair, 

Sim, 

Posso cair ali, 

Posso cair lá, 

Posso cair onde

A bruta passagem

De triste horizonte 

Possa me guiar… 

Guiar por mortal ar! 

Guiar por insuportável ar! 

Guiar por sufocante ar! 

Guiar por desesperador ar! 


Envolvendo meus olhos internos com a mesma segurança de minha audição interna, me volto para o nobre Sir Harold pego de surpresa pelo Ato do meu amigo. Nos olhos dele, percebo que o mesmo se deu conta do que ocorreu e abro um sorriso ao ouvi-lo agora gritar… 


— JOHN CONSTANTINE!!! 


As Conjurações dele não funcionam e um Portal se abre, o que Chas vê, fazendo-o gritar de medo. Não dou atenção, quero continuar olhando o velho se fodendo todo. A mansão toda se torna uma prisão e o crânio que deixei na escrivaninha da biblioteca se expande por cada centímetro dela. Todos os Encantamentos Protetores do lugar inteiro, postos em pontos secretos da morada pelo próprio dono, são apagados e a única coisa que Harold não poderia fazer é correr para dentro de onde mora para alcançar a biblioteca. Um Mago imbecil é um Mago morto, do Dicionário Das Canalhices de John Constantine. Ele, no entanto, não tinha como se livrar do meu amigo, de um jeito ou de outro, resolvendo ir para o tudo ou nada. A casa está começando a ser engolida pelo Portal e ouço meu amigo se despedir de mim. Ele deixa Harold chegar à biblioteca e o paralisa, deixando-o de quatro, rasgando-lhe toda a roupa. A vingança do meu amigo no lugar de onde ele veio será eterna, Harold é um Imortal. Um Imortal que começa a ser enrabado, primeiro, pelos livros. Pelo que percebi, toda a casa estuprará o velho sem limite para ter um fim. Eu somente tenho que rir de tudo isso e rio bem alto! Se pode me ouvir, Harold, adeus! Um Imortal sodomizado em uma Dimensão onde ninguém ouvirá os seus gritos viverá em um estado muito pior do que o Inferno! 


A mansão desaparece e o Chas está tremendo. Parece que se mijou, Santo Deus… 


— Constantine… o que… 

— É algo que você deve guardar para você, ninguém vai acreditar, Chas. A Escócia tem um novo local livre para um belo cemitério. Vamos embora, voltemos para casa. 


O medo deixa Chas calado, ele liga o carro e partimos. O espaço vazio onde era a mansão parece agora assombrado e é bom que seja, foi a residência de um ser humano que fez jus ao título de monstro. Os negócios dele foram junto com ele, acionistas não investirão em mais nada ao souberem do desaparecimento dele junto com a mansão. Ricos babacas tem a tendência de serem supersticiosos demais. Todos os negócios legais serão dissolvidos e seus capitais absorvidos por empresas privadas e estatais. Os negócios ilegais continuarão… Eu queria poder derrubar cada um deles de cada monstro do mundo, mas não sou Deus ou uma espécie de Deus como meu amigo de outra Dimensão é. Me contento em acabar com um monstro de cada vez, é o suficiente para mim. 


Meu amigo não tem nome e se aproveitou das lembranças do espírito de Kathleen, que ele ajudou a encontrar um bom lugar para se recuperar até o retorno ao Samsara. Ela pesquisava antes de ser morta a história escocesa de um poeta desconhecido cujos poemas chegaram até esta nossa época intactos. Pretendia publicar um livro com o resultado da pesquisa e seu sonho era que o poeta fosse reconhecido sem que fosse necessário ter um nome. A pesquisa se perdeu porque estava com ela no momento do último passeio noturno. Ao ser arrastada em direção ao cemitério, as folhas com os poemas que ela conseguiu coletar e anotações pessoais se espalharam pelas ruas, sendo levadas pelo vento. Meu amigo se comoveu também com o destino do poeta desconhecido e adquiriu a partir das memórias de Kathleen a personalidade poética do mesmo. Meu amigo não tem um nome, mas se apresentou para mim como O Poeta Sem Nome. Nunca mais o encontrarei, amigos assim eu sempre perco para os diversos nomes que me perseguem. 


Mais alguns cigarros, algumas sonecas e, ao acordar, estarei de volta a Londres com todos os seus nomes e sobrenomes. Saudades daquela porra de cidade… 



Inominável Ser

UM POETA

SEM

NOME



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