Lendo e respondendo os comentários do blog

 


Tem dia que eu abro a área de comentários como quem abre caixa de correio de prédio antigo. Não entro só no post mais recente, vou catando um por um para ver se pingou alguma coisa nova. Às vezes é só um “gostei”, às vezes é um relato de vida que poderia ser um post inteiro. E eu sinto, com bastante nitidez, a diferença entre escrever num caderno que vai ficar largado num armário e escrever sabendo que alguém respondeu de volta.

Crítica e concordância têm pesos diferentes, mas eu preciso das duas. Quem diz “é isso mesmo” me lembra que eu não estou delirando sozinha num canto. Quem discorda com argumento, não com espuma, me obriga a ajustar a mira, limpar exagero, ver onde eu estava só reagindo a coisa velha. Já teve vez de eu bater o olho num comentário e pensar “que idiotice”, e meia hora depois admitir, em silêncio, que metade do que a pessoa falou estava certa.

Claro que tem o lado chato. De vez em quando aparece alguém que não está conversando comigo, está brigando com o mundo inteiro usando a caixa de comentários como bandeja de spam emocional. Vem flood atrás de flood, texto que ignora o que eu escrevi e só despeja ressentimento. Isso me irritava antigamente, hoje eu olho, respiro, respondo uma vez se achar que ainda tem alguém ali dentro, e depois deixo o algoritmo e o tédio fazerem o resto. Nem todo grito merece eco.

O oposto disso é quando alguém volta e transforma o comentário numa parte 2 do post. Puxa referência, lembra de outro arco, conecta com coisa que escrevi meses atrás. É lisonjeiro perceber que o texto continuou vivendo na cabeça de alguém depois de fechar a aba, que virou ponto de partida em vez de fim de conversa.

Eu não achava que ia voltar a interagir em blog depois de tanto tempo, mas faz exatos seis meses que enfiei o pé na porta aqui. Lá no começo de junho eu entrei empolgada, escrevendo um ou dois textos por semana, cheia de ideia pra olhar quadrinho, filme e série por um ângulo que geralmente não vira pauta em site de cultura pop. Ozy já tinha dado o aviso branco: não se apaixone por comentário, porque muita coisa boa morre no zero, enquanto uma notinha rápida qualquer rende discussão de torcida organizada. Às vezes o texto longo passa batido e ressuscita meses depois, às vezes a "rapidinha" explode no mesmo dia. O que dava pra controlar, ele dizia, era só tentar não escrever tratados de 40 páginas sempre, senão muita gente nem se arrisca a clicar.

Mesmo assim, em agosto eu quebrei o ritmo. Tava saindo do fim de um fim de relacionamento, aquele limbo em que você não sabe se tá de luto ou só cansada, e a vontade de discutir qualquer coisa que não fosse sobrevivência foi pro ralo. A empolgação com lista, análise, top 5 e afins sumiu junto com a paciência de ver site grande transformando tudo em rumor vazio em briga de fã. Eu até pensei em escrever justamente sobre isso, sobre como o discurso ao redor da cultura pop virou fazendinha de engajamento, mas parecia mexer num vespeiro num momento em que eu mal segurava o próprio humor.

A virada veio no começo de setembro, quando eu sentei pra escrever um texto curto, quase sem pensar, que não tinha nada a ver com herói, filme ou trailer. “Funcional até desaparecer” nasceu assim, como desabafo que eu imaginava largar aqui e pronto, pra ninguém. Na prática, foi o meu começo de verdade no blog. Ali eu vi comentário que não vinha só discutir personagem; vinha dizer “eu também tô assim”, “eu também tô nesse automático”. Foi a primeira vez que eu senti que valesse a pena continuar abrindo a caixa-preta em vez de deixar tudo empilhado em rascunho de computador e caderno. A partir dali eu não virei máquina de texto semanal, mas fiquei mais produtiva, mais honesta e, principalmente, mais afim de escrever aqui do que em qualquer outro lugar.

Partilhar pensamento com uma comunidade, mesmo pequena, acabou sendo bem mais terapêutico do que eu esperava. Eu tenho dificuldade real de conhecer gente fora da tela, aquela coreografia de puxar assunto, rir na hora certa, manter interesse em voz alta sempre me soou artificial. Aqui, eu entro, escrevo, clico em publicar e pronto, quem chegar vai me ler antes de me ver. Não precisa saber quantos anos eu tenho, como é meu rosto, sexualidade. É uma bolha, claro, mas é uma bolha em que eu consigo existir sem ter que ficar me apresentando o tempo todo.

Nos bastidores o Ozy me deu uma força. Eu conheço esse desgraçado virtualmente desde a época em que Orkut ainda era lugar pra gente montar comunidade e discutir por mais de quatro linhas. Ele desenhava, inventava personagem, montava fanzine que nunca ficava pronto e postava páginas escaneadas com blocos de texto pra 3 gatos pingados lerem. Eu era a chata que aparecia pra dizer “isso aqui tá bom, mas esse quadro tá sobrando, essa fala estraga o impacto, essa página merecia mais espaço”. A gente já batia cabeça ali, agora ele me devolve o favor no blog (quando ele não some). Não é um editor bonzinho, é um amigo teimoso.

Esse aqui não é um texto muito elaborado, nem era para ser. É um extra, quase um bilhete, só para marcar esses seis meses aqui e agradecer de verdade todo mundo que leu, comentou, discordou e puxou conversa nesse período. Se tudo der certo, que venham mais seis meses, com mais textos e mais gente espiando a caixa de comentários junto comigo. Quem sabe no ano que vem eu já não esteja mais à vontade para sair um pouco dessa toca, voltar a ter alguma rede social além do blog, talvez até criar um novo Discord. Por enquanto, é isso. Obrigada por terem ficado por perto nesse meio tempo.