Patrulha Estelar Yamato (ou Space Battleship Yamato) é sem dúvida um grande clássico dos animes, criado por Leiju Matsumoto e pelo produtor Yoshinobu Nishizaki. Quando falo de Yamato, não é a Yamato de One Piece, he he, mas daquela que provavelmente é a maior space opera nipônica. E quero abordar neste post especificamente o mangá de Yamato.
No
enredo, a Terra passou a sofrer ataques da raça alienígena dos Gamilas, que bombardeou
a planeta com radiação. A humanidade é obrigada a viver em abrigos subterrâneos
desde então. A tripulação do encouraçado
Yamato deve partir em busca do Cosmo Cleaner, um dispositivo que pode limpar a
radiação da Terra, disponibilizada pela imperatriz de Iskandar, Starsha. É
impossível não fazer uma comparação de Yamato com Star Trek, visto que há
influência direta, inclusive tanto Yamato quanto a Enterprise viajam em
velocidade warp de dobra. No entanto, se em Star Trek a Enterprise
simboliza a ONU e os klingons e os romulanos, os soviéticos e os chineses, em
Yamato há uma correspondência dos gamilanos com os norte-americanos. Porém, não
só com os norte-americanos, os gamilanos são como germânicos azuis. O líder
deles, Dessler, é chamado de Führer, por exemplo.
Yamato, como é um mangá antigo, pode causar
estranheza ao leitor moderno, pois a arte é simples, em comparação às artes
mais arrojadas dos mangás contemporâneos. A narrativa também é diferente das
narrativas atuais, um pouco "datada", apesar de achar esse termo um
tanto questionável. Entenda que “datado” não quer dizer necessariamente que
algo é ruim ou ultrapassado, nem que envelheceu necessariamente mal, mas que a
narrativa é diferente da atual. E o mangá não tem exatamente um final, pois vai
até a saga do Cometa Império, e houve uma briga entre Matsumoto e Nishizaki,
que afetou a produção do mangá.
Os personagens principais do mangá são o almirante
Juzo Okita, que é o responsável por liderar a nave Yamato, seria correspondente
ao capitão Kirk de Star Trek, mas mais idoso e experiente; Susumo Kodai,
que na realidade é o arquétipo do herói juvenil, que se torna membro da
tripulação da Yamato para vingar seu irmão, morto pelos gamilas; Yuki Mori, a
enfermeira e única mulher da nave, interesse amoroso de Kodai; Daisuke Shima, o
imediato e melhor amigo de Kodai; doutor Sakezo Sado, o médico veterinário que vive
bebendo sakê; e Gênio, o robô, estes dois últimos são o alívio cômico do mangá.
Há alguns eventos no mangá que não me recordo se acontecem no anime. Por exemplo, em um trecho, a tripulação da Yamato é abordada pela nave Arcadia, do Capitão Harlock, outras das criações de Matsumoto. No entanto, a versão do Harlock no mangá é bem diferente da que é conhecida. Não sei dizer se Yamato faz parte do “Leijiverso”, o universo compartilhado de Leiji Matsumoto, do qual fazem parte Capitão Harlock e Galaxy Express 999.
Há umas coisas no mangá que realmente não
entendi, como o fato do almirante Okita morrer e depois aparecer vivo, sem
maiores explicações. Alguns dos aspectos do mangá talvez fiquem mais claros
assistindo à animação, pois em algumas passagens do mangá fiquei com a
impressão de que faltaram informações. Na segunda parte do mangá, quando começa
a saga do Cometa Império, o clima fica muito mais melancólico, com a tripulação
de Yamato tornando-se mais depressiva e existencialista perante a imensidão do
universo. Nessa saga, Mera e Jura, a ex-mulher e a filha de Dessler, passam a atormentar
a tripulação de Yamato com alucinações.
A edição da New Pop está ótima, muito bem-feita e editorada. Um calhamaço de mais de 600 páginas. No entanto, há alguns erros de português que ficaram evidentes. Faltou um trabalho de revisão de textos mais cuidadoso. Por exemplo, no trecho em que se escreve “a forte radiação deixada pelas bombas aniquilou todas formas de vida da superfície”, faltou o artigo “as” em “todas as formas”; ou no trecho em que está escrito “enfim, o encouraçado especial Yamato revela toda sua extensão e imponência”, também faltou o artigo “a” em “toda a sua”. Há alguns outros erros de português e gramática que passaram. Também há uns erros de pontuação. Não destaco isso como crítica, porque também trabalho no meio editorial, e alguns erros passam mesmo. Porém, vi no expediente que apenas uma pessoa fez toda a revisão da obra. Esses erros talvez não passassem por uma segunda ou terceira leitura de outro revisor. No entanto, esses erros podem ser corrigidos em uma porventura segunda edição do mangá. A questão é que essa segunda edição pode demorar para ser impressa, visto que o público-alvo do mangá é quem assistia ao anime da Patrulha Estelar na TV Manchete, que hoje deve estar entre o final da casa dos 40 e o início da casa dos 50 em faixa etária. Eu mesmo tenho 44 anos e lembro-me meio remotamente de Patrulha Estelar na Manchete. Quem se recorda bem deve ser até mais velho.
A
tradução também ficou estranha e polêmica em alguns aspectos. No mangá, o vilão
ficou com o nome Dessler, mas ele também é conhecido como Deslock. Acredito que
Dessler seja o nome do original em japonês e Deslock, o traduzido para os EUA
e, por conseguinte, o Brasil. Em um trecho, o protagonista Susumo Kodai avista a
"nave preta" do Harlock. Creio que ficaria melhor "nave
negra". Está certo que não sou tradutor, mas sou um profissional da língua
portuguesa, e acredito que “nave negra” fica melhor que “nave preta”, porque se
faz uma alusão a “nau negra”, por exemplo. No português, no relativo a cor, há “negro”
e “preto”, mas há uma diferença sutil de tom. “Negro” tem um sentido semântico
mais nobre, mas ao mesmo tempo negativo; “preto” também serve para designar
cor, mas tudo depende do contexto. Dizemos "essa camisa é 'preta'”, e não 'negra'; "esse carro é 'preto'” etc. É diferente do “black” em inglês, que não tem essa
distinção. Acredito que não traduziram como “nave negra”, mas preferiram “nave
preta”, pelas razões que alguns de vocês devem estar pensando mesmo. No entanto,
a “eufonia”, como dizem, a forma que me soou, me pareceu esquisita.
Vale a pena ler Patrulha Esterlar Yamato?
Sim, vale muito, mas preciso fazer duas observações. A primeira é que o mangá
não tem final, quem quiser saber como termina vai ter de ir atrás do anime. A
segunda é que talvez a molecada estranhe a narrativa e a arte do mangá, porque
é uma obra dos anos 70. Não é nada impeditivo, mas vale avisar que talvez os
mais jovens sintam uma dificuldade de imersão. No entanto, estou ciente de que
muitos leitores jovens de mangás leem obras antigas e gostam. Apenas aviso isso
porque a edição da New Pop é cara, custa quase R$ 100,00, porém vale o
custo-benefício em vista da qualidade da encadernação, com capa dura, que ficou
muito boa, bem como do número de páginas. É uma obra que creio que todo mundo
deveria conhecer. Inclusive, influenciou outras space operas japonesas,
como Legends of the Galactic Heroes.
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