Há aquelas sequências que são realizadas que ninguém pediu, mas que no fim das contas são uma boa surpresa. Esse é o caso de Top Gun: Maverick, sequência mais que tardia de Top Gun de 1986, um clássico absoluto dos anos 80, que impulsionou a carreira de Tom Cruise e o tornou o astro que é hoje. Top Gun é aquele tipo de filme que o roteiro não é lá grande coisa, mas que foi bem marcante na época, graças ao elenco, que também tinha Val Kilmer e Meg Ryan, e a trilha sonora do período, como a banda Berlin, que é a responsável pela música-tema do filme, Take My Breath Away.
Mal comparando, o personagem de Tom Cruise Pete “Maverick” Mitchell, seria uma espécie de Hal Jordan, o Lanterna Verde, dos anos 80. Piloto da Marinha norte-americana, confiante, arrogante e mulherengo. Um cowboy contemporâneo, que não é ortodoxo e não segue o regulamento. E, após Top Gun, Maverick estacionou como capitão e trabalha como piloto de testes para a Aeronáutica. O enredo até dá uma forçada de barra para justificar porque ele continua a ser piloto até hoje, já na meia idade.
Após destruir um avião
supersônico durante um teste, Maverick é “recompensado” pelo general da Força Aérea
interpretado por Ed Harris a voltar a Top Gun, a escola dos melhores pilotos
dos EUA. Há uma missão a serviço da Otan, que envolve a destruição de um
laboratório de enriquecimento de Uranio em uma “nação pária”, e Maverick deve
treinar os pilotos de elite para uma missão praticamente suicida, a despeito do
descrédito de comandante interpretado por Jon Hamm. O drama é que um dos pilotos
é “Rooster”, vivido por Miles Terrer, o filho de “Goose”, seu melhor
amigo, falecido em um teste de voo em Top Gun. Além disso, Maverick também
reencontra uma antiga paixão, Penny, cujo papel é feito pela belíssima Jennifer
Connelly.
O roteiro de Top Gun: Maverick é um exemplo dos velhos roteiros “pipocões” de Hollywood, que misturam drama, romance, ação e até mesmo comédia. Alguns críticos de dois veículos de mídia (Omelete e Folha de S.Paulo) escreveram resenhas de mi mi mi dizendo que Top Gun: Maverick era filme de ação com “masculinidade tóxica”, mas a rigor o Top Gun original nunca foi filme de ação; no meu entender, é mais um romance misto com drama e um pouco de ação, mas apenas no último ato é que há a batalha aérea contra os soviéticos. No caso de Maverick, o gênero é sobretudo o drama do protagonista com Rooster, com o romance com Penny e a cena de ação no último ato, que realmente é uma cena de ação mais elaborada e maior que a do filme original, inclusive com muita suspensão de descrença, como na cena em que Maverick e Rooster roubam um caça do hangar inimigo na maior tranquilidade, sendo um caça idêntico a que Maverick pilotou em Top Gun.
Obviamente, Maverick é mais um daqueles filmes autorreferenciais e que são embalados na nostalgia dos anos 80. Não poderia ser diferente. Se é necessário ter assistido ao primeiro Top Gun para entender este? Na verdade, não, mas a bagagem emocional de ter visto o longa original faz muita diferença. É a mesma coisa que ter assistido a Homem-Aranha: Sem Volta para Casa sem ter visto os filmes de Tobey Maguire e Andrew Garfield. A melhor cena do filme é o reencontro entre Maverick e Iceman, interpretado por Val Kilmer, já bastante debilitado pelo câncer de garganta.
Apesar da acusação de “masculidade
tóxica”, Tom Cruise é um cara antenado com seu tempo. Se no Top Gun
original os protagonistas eram basicamente homens branco, em Maverick há
negros, latinos e até mesmo uma garota entre os pilotos, e um nerd também.
Tem até um Iceman genérico, o Hangman. Claro, ninguém vai roubar o protagonismo
de Cruise. Maverick tem um enredo em que a jornada é mais importante que
o destino, é mais importante resolver o drama entre Marverick e Rooster que a
missão final. Tanto que o inimigo é bem abstrato, uma nação párea que ameaça a Otan,
mas sem denominação. Na batalha final, inclusive, o visor dos pilotos inimigos
não mostra nem os olhos, o que os desumaniza. Não há maniqueísmo; os
norte-americanos são os mocinhos e ponto final, bem como um velho filme dos
anos 80.
Houve certa indignação quanto
ao fato de Kelly McGills, o interesse romântico de
Maverick em Top Gun, não ter tido nenhuma participação nesse novo filme,
mas infelizmente McGills não envelheceu muito bem para os padrões de Hollywood
e sua personagem foi limada, porém acho que poderiam tê-la aproveitado em algum easter egg.
Top Gun: Maverick é um blockbuster bem honesto, que entrega o que promete, sem grandes pretensões. Na verdade, o filme tem, sim, uma pretensão, que é ser um Top Gun exponencialmente maior, e consegue ser bem-sucedido. É uma sequência que é superior ao filme original em tudo. Deve-se destacar que o diretor de Maverick é Joseph Kosinski, velho conhecido de Cruise e diretor de Oblivion. Nota 9 de 10.
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