"Dr. David Banner, médico, cientista... Procurando descobrir a força oculta que todos possuem. Então uma dose maciça de radiação gama altera a química do seu corpo, agora quando David Banner é ultrajado ou enfurecido, ele se transforma e tem que enfrentar sua maldição".
Essa era a arrepiante introdução dos episódios da famosa série de TV do Hulk nos anos 70 que foi homenageada na abertura do filme O INCRÍVEL HULK com Edward Norton e com ela me tornei fã do Gigante Esmeralda. Como era pequeno na época, tanto a série como os quadrinhos só me chamavam a atenção pelo poder e as aventuras do super-herói. Depois comecei a conhecer melhor o personagem e ver que haviam mais coisas enterradas ali.
Com o passar do tempo, o Hulk ganhou maiores detalhes e sofreu mudanças, claro que para manter o interesse dos leitores, afinal ficaria difícil prender o interesse se ele até hoje fosse o monstro que quebrava malfeitores e se acalmava com crianças e bichinhos. Porém o que mais me intrigou foram suas mudanças psicológicas. O Hulk deixou de ser o monstro ingênuo que lutava com os vilões apenas percebendo que eles eram ruins e que iam acabar machucando pessoas com seus planos mirabolantes e armas esquisitas, com destaque para um dos seus mais antigos vilões: O Líder.
Antes do Hulk, Bruce Banner já era uma pessoa com graves problemas pessoais. Seu pai, o cientista atômico Brian Banner era um homem perigoso e complexado, a ponto de acreditar que suas experiências com radiação tinham alterado seu DNA e que Bruce era um tipo de mutação, além de sofrer de um ciúme doentio com relação ao amor de Rebecca pelo filho Bruce, no auge de suas crises matou a esposa e foi internado, levando Banner a ser criado por sua tia Drake, situação que foi explorada no filme HULK, de Ang Lee.
Então temos um homem que cresceu com traumas de violência na infância enraizados em sua mente que, por ironia ou concretizando os temores do pai, acabou se tornando um gênio e físico nuclear. Quieto e introvertido, Banner passou pela faculdade chegando ao departamento de defesa para desenvolver seu ambicioso projeto para o exército: A Bomba Gama. A história, todos conhecemos: Rick Jones invade a área de testes para ganhar uma aposta, Bruce avista o garoto e corre para salvá-lo da explosão, Rick é salvo, mas Bruce recebe o impacto da explosão e o Hulk nasce. Literalmente com um nascimento de ‘Som e Fúria’, o Hulk dá seus passos na Terra, ou seria a fúria e o rancor enraizados de Bruce Banner que enfim ganharam uma válvula de escape na forma do Gigante Esmeralda?
Mas ele no início era cinza! Na sua concepção, Stan Lee quis o Hulk cinza por achar que esse tom seria mais dramático e sombrio, porém falhas na impressão o deixaram verde em algumas páginas e a cor verde ficou oficialmente. Com o tempo a cor cinza voltou a ser usada para marcar a fase do Hulk Original: Menos forte e mais esperto, sarcástico. O roteirista Peter David usou essa temática quando assumiu o título do Hulk, explorando uma nova face do personagem resgatando um detalhe da sua origem: a transformação ocorria de noite, assim que o Sol se punha, essa mudança nos rumos do Hulk salvou a revista do iminente cancelamento e dando início as múltiplas personalidades do gigante. Infelizmente, houve uma possibilidade de vermos o Hulk Cinza em Vingadores – Era de Ultron lutando contra a Hulk Buster, mas acabou não se concretizando, uma grande chance de dar mais destaque e profundidade ao Hulk se perdeu.
Antes dele, em uma passagem breve e memorável pelo título, o especialista em renovar personagens John Byrne conseguiu separar fisicamente Bruce do Hulk, mas tiveram que ser rapidamente reintegrados para que Bruce não morresse e o Hulk tivesse de novo um moderador para sua fúria que ficou descontrolada sem sua ‘parte humana’, com isso a complexidade em cima do personagem só aumentou. Muita coisa foi mudando com o tempo como o fato de que Banner não lembrava o que o Hulk fazia ou tinha vagas lembranças, ficando em um estado de sonho ou semi-consciência e gradualmente essa distância da psique entre Banner e Hulk foi estreitando.
Hulk não era apenas a manifestação da raiva de Banner, ele era uma personalidade ativa dentro da mente de Banner que poderia se mostrar de várias formas diferentes na transformação: o Hulk poderia manter a inteligência de Banner ou assumir o controle com o lado mais irônico, sacana e matreiro de Banner a frente das ações, também quando no auge da disputa entre as duas personalidades, uma sessão de psicanálise e hipnose feita pelo Dr. Samson e o Mestre dos Picadeiros uniu os dois lados do Hulk, o selvagem irracional (verde) com o cínico astuto (cinza) para dar origem a um Hulk que era o melhor dos dois mundos no período onde ele se aliou ao grupo chamado Panteão, pretensos salvadores do mundo que procuravam manter a ordem mundial por baixo dos panos.
Republicado recentemente pela Salvat, o arco ‘Cães de Guerra’, que já ganhou um ótimo review no site, chamou a atenção dos leitores para essa grande fase que retratou de maneira empolgante o quanto a mente de Bruce Banner é frágil e a beira de um colapso iminente que pode libertar no mundo uma criatura muito pior do que qualquer manifestação anterior do Hulk, o que mostra o quanto um trauma pode machucar a mente de uma pessoa e fazer brotar os piores sentimentos. Não é a toa que o Hulk é um dos maiores heróis da Marvel, seu carisma e complexidade não deixam de empolgar os fãs de ontem, hoje e sempre.
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