Kamen Rider Black Sun - Black mais dark, adulto, violento e "marvelizado" - Review com spoilers

 

Desde que foi anunciada a nova série reboot de Kamen Rider Black, Kamen Rider Black Sun, muito se especulou sobre qual seria seu tom e se ela agradaria aos fãs tradicionais de tokusatsu. Bom, assisti aos dez episódios da série disponibilizados na Amazon Prime Video e posso dizer que provavelmente dividirá opiniões. Pessoalmente, gostei dessa nova versão do Black, mas outros podem estranhar bastante.

Se cada Kamen Rider representasse um time de futebol, Kamen Rider Black seria o Flamengo, uma vez que ele foi o primeiro Kamen Rider a ser exibido no Brasil pela saudosa TV Manchete. Até mesmo no Japão, Black foi um dos poucos Kamen Riders a ter reboot e também um mangá homônimo, escrito e ilustrado por Shotaro Ishinomori. Então, não dá para dizer que o Black é um Kamen Rider qualquer. A série clássica, a série nova e o mangá têm enredos muito diferentes, a despeito de terem alguns plots e personagens em comum.

Kamen Rider Black Sun já se inicia com a operação em que Kotaro Minami (ou Issamu Minami, como chamado por aqui), interpretado por Hidetoshi Nishijima, ator protagonista do filme ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro Drive My Car, e Nobuhiko Akizuki, vivido por Tomoya Nakamura, sofrem para serem “aprimorados”, com a inserção das pedras Kingstone em seu interior. A diferença da série original é que nesta eles são submetidos pela operação ainda crianças e não pelos sacerdotes Gorgom, mas por uma equipe de cirurgiões em que seus próprios pais são integrantes.

No presente, Kotaro vive em um trailer afastado de Tóquio e vive de serviços sujos, com o objetivo de conseguir dinheiro para comprar medicamentos e tratar de seu corpo, muito ferido por um evento que será revelado nos episódios posteriores. Nesse início da história, Kotaro é basicamente um criminoso que faz qualquer serviço por dinheiro. Por sua vez, Nobuhiko está há anos prisioneiro dos Gorgom, que nesta versão não é mais uma organização ou seita, como no original, mas sim um partido político, o qual inclusive tem como membro o atual primeiro-ministro do Japão Shinichi Donami. Os três sacerdotes Gorgom, Danken, Baraom e Pérola também são membros do partido, interpretados por Nakamura Baijaku, Pretty Ohta e Yō Yoshida.

É importante destacar que nessa realidade da série, os kaijins, os monstros, são uma raça marginalizada que existe no Japão e que quer ter seus direitos reconhecidos. Sim, exatamente igual aos mutantes de X-Men. A impressão que tive foi que Kamen Rider Black Sun é uma tentativa da Toei de fazer uma séria de Kamen Rider internacionalizada, ou melhor dizendo, americanizada, para alcançar o espectador ocidental, principalmente o norte-americano, tanto que foi produzida em parceria com a Amazon Prime Video. Não é a primeira vez que tentam vender Kamen Rider para o público norte-americano; houve aquela desgraça do Masked Rider da Saban e Kamen Rider Cavaleiro Dragão. E essa americanização ou "marvelização" não é apenas pelo conteúdo de crítica social e política, referente à alegoria sobre o preconceito, ou pela alusão aos X-Men. Mais adiante, explicarei melhor.

O plot da série desenvolve em torno da menina Aoi Izumi, cujo papel é feito por Kokoro Hirasawa, uma ativista pró-kaijin claramente inspirada em Greta Thunberg. Após discursar da ONU pelos direitos dos kaijin, Aoi torna-se um alvo, e Bilgenia (também chamado Taurus aqui), interpretado por Takahiro Miura que nesse ponto da história é um capanga de Shinichi, manda o Monstro Aranha assassinar Aoi. Entretanto, Kotaro também tinha sido contratado para assassinar a garota, mas muda de ideia ao ver que ela tem um medalhão com uma das Kingstones e aniquila o Monstro Aranha, com direito a tripas e decapitação. Vale dizer que não aliviaram na violência na série, ela não é 18 anos à toa.

Quando descobre que o Black Sun está vivo, Nobuhiko enfim consegue fugir da prisão dos Gorgom e procura Kotaro para que juntos eles possam enfim matar o Grande Rei dos Gorgom. Vale dizer que Nobuhiko se manteve jovem enquanto Kotaro envelheceu graças ao heavens, produzido a partir de um extrato do corpo do Grande Rei. O enredo da série também se passa em dois tempos diferentes, 1972 e 2022. No passado, Kotaro e Nobuhiko são membros da associação de ativismo pró-kaijin, ao lado de Danken Baraom, Pérola e Taurus, e também se envolvem com a bela Yukari, interpretada por Haruka Imou.

Vale destacar que Kamen Rider Black Sun não foge da raiz do tokusatsu quanto ao uso de trajes e máscaras de monstros, nem como o uso de efeitos práticos. Há alguns efeitos digitais também, claro, principalmente na representação de sangue durante as lutas, mas o grosso mesmo é por conta dos efeitos práticos. Há muito fanservive também; em determinado ponto da série, Black Sun grita seu “henshin” e tem uma evolução de design. Isso acontece também com Shadow Moon. Obviamente, é para vender bonecos, porque a Toei não é boba e tem parceria com a Bandai. A forma original do Black Sun inclusive lembra a do mangá, mais monstruosa. E na luta final entre Black Sun e Shadow Moon, Black faz uso de seus famosos Rider Kick e Rider Punch, mas sem nomeá-los. Há também uma reprodução da morte e ressurreição de Black, que também ocorre na série clássica, bem como as participações dos monstros Morcego e Baleia, tradicionais monstros da série original. E o início do último episódio, com Black Sun dirigindo sua moto na estrada, é idêntico à abertura da série clássica, com a mesma música-tema.

A caracterização dos personagens está bem diferente da série original, até os vilões foram humanizados e entendemos porque agem assim. Dá para dizer que os personagens foram “marvetizados”, ninguém é totalmente mau ou bom, com exceção do primeiro-ministro Shinichi, que é canalha mesmo. Até Taurus, que tem seus momentos de muita crueldade, principalmente quando transforma Aoi em uma kaijin e assassina sua mãe diante de seus olhos, também tem suas motivações e tem sua redenção em determinado momento da série, com seu Sabre Satã. Apesar disso, Taurus foi um dos poucos personagens que no meu entender ficou a dever para o da série original, muito mais imponente.

O final de Kamen Rider Black Sun, creio que também dividirá muitas opiniões e acredito que alguns não apreciarão. No meu entender, me lembrou até esses filmes e séries atuais da Marvel, em que o protagonista homem é “nerfado” e é substituído por uma protagonista mulher. Black Sun morre e agora seu legado ficou com Aoi, que até solta um henshin no último episódio para se transformar. E Aoi percebe que só ficar falando de paz não resolve nada e forma um grupo terrorista com outras crianças. Final polêmico igual mamilos.

Enfim, vale a pena assistir Kamen Rider Black Sun? Na minha opinião, sim. É uma série adulta, dark, violenta e política, nem melhor que a maioria das séries da Marvel, a despeito de ter sofrido uma “marvelização” para agradar ao público ocidental. Terá uma segunda temporada? Não sei, mas acho difícil, visto o final, apesar de este terminar com várias pontas soltas e com desenvolvimentos em aberto. Para quem se interessar, eis dois links com reviews que já escrevi sobre as séries clássicas de Kamen Rider Black e Kamen Rider Black RX, e longa vida ao Black Sun.

https://ozymandiasrealista.blogspot.com/2021/04/kamen-rider-black-uma-peca-sombria-do.html

https://ozymandiasrealista.blogspot.com/2021/10/kamen-rider-black-rx-evolucao-comercial.html