Batman: Cavaleiro Branco tem um enredo que não é exatamente novidade, o de o Coringa ficando são. Já houve uma história parecida, De Volta à Sanidade, de J. M. de Matteis e Joe Staton, que foi publicada por aqui na série Um Conto de Batman, da Editora Abril. Honestamente, creio que não dá para comparar com a história de Matteis, que é um escritor de HQs da velha guarda excelente. Cavaleiro Branco é roteirizado e desenhado por Sean Murphy, que, apesar de ser um ótimo desenhista, creio que não escreveu muita coisa.
Na história, depois de uma perseguição, Batman
tem um confronto violento com o Coringa, e ainda ouve umas "verdades"
do vilão. Então, ele desce o braço no Coringa, que apanha pra cacete. O
Cavaleiro das Trevas ainda faz seu arqui-inimigo engolir umas pílulas. Por
causa disso, a opinião pública volta-se contra o herói, e Gordon fica encrencado
e leva um esporro do prefeito. Asa Noturna e Batgirl vão questionar Bruce, para
saber porque ele pegou tão pesado, e descobrem que Bruce está meio transtornado
por causa do Alfred, que está morrendo e sendo mantido em coma pela tecnologia
de criogenia do Sr. Frio.
Essa HQ tem algumas coisas estranhas. Primeiro, todo mundo sabe o nome do Coringa, que é Jack Napier, o nome que o Coringa de Jack Nicholson tinha no Batman de 1989, de Tim Burton. Segundo, parece que o vilão "descolore" e perde a pele branca e os cabelos verdes, quando acorda do coma, provavelmente em razão das pílulas que tomou. E agora que está são, o Coringa, ou Jack Napier, está processando o Departamento de Polícia de Gotham por não prenderem o Batman. Aproveitando a oportunidade, Jack se proclama o novo "Cavaleiro Branco" de Gotham.
Dessa forma, depois de ter ficado são, o Coringa, ou melhor, Jack Napier, é solto e começa uma guerra midiática contra a "elite" de Gotham, que ele acusa de ter se aproveitado de sua condição de insano e criado sua persona de Coringa. Apesar do discurso de coitadismo, muita gente acredita nessa história. Gotham está parecendo até o Brasil. Jack então vai atrás de sua antiga namorada e parceira, Harleen Quinzel, a Arlequina. É interessante porque primeiro Jack encontra uma falsa Arlequina, que seria a dos Novos 52. No entanto, logo aparece a verdadeira Arlequina, já com seu uniforme clássico, com guizos e tudo.
Sean Murphy bebe muito do design da
série animada do Batman, e essa HQ é uma homenagem a ela. Tanto que o Sr. Frio
dessa HQ é bem o do desenho, e sua esposa Nora também fica em um cilindro. Nem
a tecnologia do Sr. Frio ajuda Alfred a sair do coma, o que deixa Bruce
desesperado. Isso além do fato de Jack Napier estar solto e fazendo das suas.
Outra referência à série animada é quando Bruce vai a uma festa e encontra um
casal de grã-finos, Pierce e Veronica. Esse é o mesmo casal que adulou o
Pinguim no episódio Pássaros Idênticos da série animada. Por sua vez,
Jack consegue controlar vários dos vilões do Batman com a tecnologia do
Chapeleiro Louco.
O próximo passo do Coringa ou Jack Napier é tornar-se vereador de Blackport, um dos bairros cortiços de Gotham. Acontece um confronto com a polícia, e Batman já chega dando uma chave de pescoço em Napier, o que pega mais mal ainda para o Cavaleiro das Trevas e configura abuso. Agora que Alfred morreu, Batman está mais imprevisível e errático do que nunca. E Napier tem a ideia de usar o tal Fundo de Devastação do Batman para a polícia. E ainda de sugerir que os vigilantes de Gotham trabalhem oficialmente para a prefeitura, bem como de compartilhar a tecnologia do Homem Morcego com a polícia. Até o Gordon fica balançado para o lado do Coringa dessa vez. Também há a polêmica transa do Coringa com a Arlequina; a versão original foi censurada porque mostrava os seios da Arlequina, e mamilos são polêmicos. Enquanto isso, a cópia carbono da Arlequina se une ao Chapeleiro Louco e ataca o Departamento de Polícia de Gotham, com os demais vilões de Gotham. A cópia carbono da Arlequina seria a versão dos Novos 52 da personagem, e a clássica é a da animação.
Por sua vez, Napier continua aprontando. Consegue controlar os outros vilões de Gotham com a tecnologia do Chapeleiro Louco e traça um plano para desacreditar Batman perante a mídia. Batman destrói a ponte de Gotham, fazendo a Arlequina falsa e os outros vilões escaparem; Gordon fica puto da vida e ordena a caçada ao Cavaleiro das Trevas. Até Asa Noturna se voluntaria a capturar o herói, mas com a condição de que sua máscara do não seja retirada. Santa ingratidão, Batman! Depois de uma perseguição à la Velozes e Furiosos, o Batmóvel tem um acidente, e Batman sai na porrada com Jack Napier. E pior que Napier vence. Corta-se então para a sequência dessa minissérie, quando o herói está preso no Arkham. No entanto, o ataque de um canhão congelante gigante, no qual a Arlequina falsa conseguiu pôr as mãos, construído pelo pai do Sr. Frio, deixa Gotham em estado de alerta, e a única opção para deter a vilã é Jack Napier voltar a ser o Coringa insano.
Na sequência final da HQ, Batman e Napier, agora novamente “coringado”, unem-se para enfim impedir que a falsa Arlequina e o Chapeleiro Louco, que está controlando mentalmente os outros vilões, usem o canhão criogênico do Sr. Frio contra Gotham. O curioso é que essa história tenta de certo modo redimir o Coringa, pois Napier, apesar de manipulador e usar de métodos questionáveis, tem boas intenções com relação a ajudar Gotham, principalmente os bairros mais pobres da cidade. Sean Murphy deve ter uma certa tara por Velozes e Furiosos, pois na sequência final é todo mundo da OTG motorizado contra os vilões.
Após conseguirem derrotar a Arlequina falsa e
os demais vilões, o último desejo de Jack Napier antes de voltar a ser o
Coringa em definitivo é casar-se com Harleen, com Batman e Gordon de
testemunha. Batman e Gordon voltam a se entender, mas como a confiança entre
eles foi muito abalada, o Cavaleiro das Trevas resolve entregar as chaves de
todos os Batmóveis para a polícia de Gotham e revela sua identidade de Bruce
Wayne. Aí fica a pergunta: o que vai ser do herói agora, uma vez que seus
sidekicks, Asa Noturna e Batgirl são praticamente membros da polícia, como
integrantes da OTG, e não é mais dono nem dos Batmóveis? Batman pode enfim pendurar
a chuteira e ir para o Caribe, curtir a vida como Bruce Wayne?
Sinceramente, Batman: Cavaleiro Branco
não é a obra-prima contemporânea do personagem, ao menos, não para mim. Ela é
uma boa HQ, mas o plot em si não é original. Essa história de o Coringa
voltar a ficar são, a meu ver, foi muito melhor trabalhada já na citada De Volta
à Sanidade. Cavaleiro Branco é sem dúvida mais ousada e até mesmo grandiloquente; porém, o enredo
de Sean Murphy é uma confusão de acontecimentos sobrepostos, e ele não consegue
costurar tudo muito bem. Há decisões de roteiro bastante corajosas, como matar Alfred
e fazer com que Batman revele sua identidade para Gordon, e, como é elseworld,
dá para relevar essas liberdades criativas. As referências à série animada do
Batman são bem legais, mas no fim das contas não passam mesmo de fanservice. O universo de Cavaleiro Branco é uma versão mais dark e
adulta da série animada, basicamente. Há ganchos para outras histórias desse
“Murphyverso” do Batman.
Os desenhos de Murphy são competentes, mas um tanto rebuscados e
poluídos, lembrando a arte de alguns quadrinhos da Vertigo. É uma história do
Batman com uma atmosfera meio diferente, representativa da linha Black Label,
mas é muito forçoso dizer que essa é uma HQ estilo Vertigo do Cavaleiro das
Trevas. Não chega a tanto, até mesmo porque a Vertigo já foi para o buraco há um
bom tempo. No entanto, vale sim a leitura. Ao menos, entretém. Batman: Cavaleiro Branco foi publicado pela Panini em oito edições. Quem não conseguir adquirir as revistas, pode ir atrás dos scans. Nota 7,5 de 10.
0 Comentários