SENHOR MILAGRE – Armadilha Sem Fim? Parte 01 de 02


A edição encadernada da primeira parte da minissérie do Senhor Milagre demorou um tempo para chegar às bancas. Depois de um episódio ainda nebuloso sobre ela ter sido, ou não, uma tentativa da Panini de iniciar vendas somente pela sua loja virtual sem enviar para os pontos de venda físicos. Polêmicas à parte a edição acabou indo para as bancas, mas em uma tiragem bem limitada pelo que pude apurar pelos vários comentários enviados por leitores, que procuraram por esse lançamento em diversos estados do país. 

O importante é que consegui a edição praticamente em uma corrida do tipo “cheguei primeiro!”, sorte a minha pois é um material muito bom, escrito pelo atual roteirista-sensação dos quadrinhos: Tom King e ilustrada pelo artista Mitch Gerads, ambos foram responsáveis por “O Xerife da Babilônia” para o selo Vertigo. Além de roteirista, King foi também agente contraterrorismo da CIA durante sete anos, logo após o 11 de setembro, e podemos sentir o tom das suas experiências de vida através dos seus trabalhos, que inclui uma breve e elogiada passagem pelo Visão na Marvel e lhe rendeu um contrato de exclusividade na DC assumindo o título do Batman.



Mas o objetivo desse texto é a reformulação de um dos mais antigos e queridos personagens da DC para os novos tempos: Senhor Milagre. Scott Free é filho do Pai Celestial de Nova Gênese e foi mandado para Apokolips ainda bebê devido a um acordo feito entre seu pai e Darkseid, eles trocaram de filhos para dar fim a um conflito que se arrastava por gerações. Assim Órion, filho de Darkseid, foi para Nova Gênese crescer no paraíso e Scott foi mandado para um lugar que se não é o inferno nas estrelas, é algo bem próximo conhecido como o Mundo de Darkseid. Chegando lá foi enviado para o Orfanato da Vovó Bondade (nome mais irônico do que esse é difícil) e cresceu debaixo das piores situações possíveis, o que lhe aprimorou mente e espírito para se tornar um especialista em fugas. Com o tempo conseguiu chegar a Terra acompanhado da Grande Barda, uma das Fúrias Femininas da Vovó, bela e feroz guerreira de impor respeito até a Mulher Maravilha e sua atual esposa. Aqui conheceu Thaddeus Brown, escapista à moda Harry Houndini (um dos mais famosos ilusionistas da história dos espetáculos), e seu ajudante Oberon; Thaddeus se tornou um mentor e uma espécie de segundo pai para Scott, tanto que ele adotou a alcunha de Senhor Milagre após a morte do seu amigo ficando com o nome, uniforme e show sendo sempre acompanhado por Barda e Oberon.


Aqui termina a origem clássica do personagem que todos conhecemos. Nessa saga escrita por King vemos que as coisas não são tão preto no branco assim e algo muito sombrio está acontecendo na vida de Scott. 
Darkseid É
Tudo começa com uma chocante tentativa de suicídio de Scott, ele vai parar em um hospital às portas da morte após cortar os pulsos, para desespero de Barda e apreensão dos milhares de fãs que acompanham seu mundialmente famoso show de fugas. O que levou o herói a cometer um ato tão desesperado assim? Depressão? tormento? Um mistério que fica mais complicado a medida que a história avança e ficamos com a impressão de estar vendo algo nas entrelinhas, parecendo uma manipulação.


Como se não bastasse explode uma guerra em Nova Gênese, Darkseid enfim consegue os segredos da Equação Antivida, o Pai Celestial morre e Órion assume o comando. Scott e Barda são convocados imediatamente para a batalha, o problema para o herói é que ele precisa entender o que está acontecendo com a sua realidade enquanto precisa lutar para defender seu mundo natal contra a ameaça do mundo que o criou. 
Darkseid É
A situação se desenrola entre momentos da vida do casal na Terra, sua rotina de shows e a necessidade de tomar uma posição sobre o grande conflito que está acontecendo no espaço, as batalhas são viscerais, sangrentas, vemos porque Barda é considerada uma das melhores Fúrias e Scott se sai bem como um comandante das forças de Nova Gênese. Temos até um embate sinistro entre eles e a famigerada Vovó Bondade cujo desfecho é, no mínimo, chocante e mostra que a situação não está para brincadeira: é guerra. Entremeado a isso ainda tem um problema sobre o fato de Órion se tornar o sucessor do Pai Celestial levando em consideração o feroz guerreiro que ele é, situação que leva o Senhor Milagre a constantes e violentos embates contra seu, por assim dizer, irmão e novo governante.


Tom King ficou famoso por ter um estilo de escrita denso, forte e que apela para algumas facetas sombrias dos personagens com o qual trabalha. Sua atual passagem pelo Batman mostra isso em arcos como "Eu Sou Suicida" e "Eu Sou Bane"
Darkseid É
O argumento tem apoio na bela arte de Mitch Gerads, diferente de muitos artistas da atualidade que vem usando com bastante regularidade recursos como splash pages para ilustrar grandes sequências, ele faz uso de uma narrativa linear, quadro a quadro a ação se desenrola e é preciso olhar cada um atentamente para não perder um detalhe sobre o que estamos vendo na saga, aqui a arte é parte essencial da narrativa, é a extensão do argumento, ela mostra para você que algo a mais está acontecendo nos bastidores, a todo momento podemos perceber que existem forças maiores em movimento do que o drama que está sendo narrado. Um mistério que parece ameaçar não só a vida do Senhor Milagre, como a integridade de todo o Universo. Em determinados momentos fica a dúvida sobre o que estamos vendo durante a história: Milagre está agindo por conta própria ou sendo marionete de uma grande manipulação?  Constantemente vemos uma presença narrativa como se estivéssemos assistindo a mais um espetáculo de fuga e tudo soa como se fosse parte de uma grande armadilha ou será que não?



Por todos esses méritos a HQ foi considerada a melhor de 2017, marcando o nome de Tom King no mundo dos quadrinhos. Lendo o material fica muito fácil de entender o motivo e é uma leitura altamente recomendada não só para os fãs do personagem como para os apreciadores de uma boa história em quadrinhos de heróis, mistério e suspense. O lançamento da segunda parte promete maiores esclarecimentos, o final do primeiro encadernado é enigmático e sensacional.

E se ficou curioso com o termo “Darkseid É” que apareceu durante o texto, eu não posso explicar, somente lendo a história para entender. Me perdoem o enigma para quem não leu, mas não resisti à tentação. Até a continuação no próximo post.

Darkseid É!





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