Reassisti a O Justiceiro de 1989, com o
astro dos filmes de ação Dolph Lundgren. Devo dizer que achei o filme até um
pouco melhor do que me lembrava. E olha que já vi esse filme outras vezes. Das
versões live actions do Justiceiro, ainda considero essa a melhor. Mas é
importante fazer um adendo. O personagem no filme é o dos quadrinhos daquela
época, escritos por Mike Baron e Carl Potts.
A questão é que a Marvel mudou muito
desde os anos 80, e quem manda na editora e no Marvel Studios hoje em dia é um bando
de bundas moles, e quem consome as mídias da Marvel atualmente é
preferencialmente um pessoal bunda mole também. É a isso que se reduziram os
fãs. E um personagem violento e politicamente incorreto como o Justiceiro
ofende a suscetibilidade dos millennials,
que acham o personagem fascista e tal, além de outras viadagens.
Criado por Gerry Conway para ser
coadjuvante nas histórias do Homem-Aranha, o Justiceiro é na realidade uma
cópia meio descarada de Mack Bolan, personagem dos livros de Don Pendleton.
Quem comparar os dois, perceberá que as características e o background são praticamente os mesmos. O
Justiceiro é fruto da cultura de violência da América dos anos 70, que também
gerou tipos como Dirty Harry, interpretado por Clint Eastwood, e Paul Kersey, protagonista
de Desejo de Matar, vivido por
Charlie Bronson.
A história de origem do Justiceiro é
conhecida por qualquer um que se interesse minimamente por cultura pop. A bem
da verdade, não é preciso ser leitor de quadrinhos para conhecer o personagem.
Ele teve duas adaptações para o cinema nos anos 2000; uma com Thomas Jane e
outra com Ray Stevenson, que, na minha opinião, ficam bem aquém do
material-fonte dos quadrinhos. Também teve a série da Netflix, que também não
teve um resultado final bom, a meu ver. Mas tudo isso ajudou a sedimentar o
anti-herói na cultura pop. Na Guerra do Iraque, os marines americanos gostavam
de pintar o símbolo do Justiceiro em seus carros. No Brasil, os bolsonaristas
desfilavam vestindo camisas com a caveira.
Frank Castle, ex-fuzileiro e veterano do
Vietnã, tem sua família assassinada perante seus olhos, porque testemunharam um
linchamento da Máfia, a cargo da família Bruno Costa. Castle sobrevive e,
diante do fracasso da Justiça em condenar os assassinos, assume a identidade do
Justiceiro, o terror da bandidagem vagabunda. Após fazer seu debut nas histórias do Aranha, o
personagem se tornou coadjuvante na revista do Demolidor de Frank Miller, que apresentava
uma versão mais fria e brutal. Jim Shooter, o editor da Marvel na época,
percebeu que os leitores gostavam de personagens violentos, a exemplo do Wolverine,
que já bombava em popularidade na época, e decidiu que o Justiceiro mereceria
um título próprio.
Após uma minissérie de debut, escrita por Steve Grant e
desenhada por Mike Zack, o Justiceiro ganhou seu título próprio, roteirizado
por Mike Baron e ilustrado por Klaus Janson e, posteriormente, por Wilce
Portacio. A revista vendeu muito bem e catapultou o personagem para o Olimpo de
popularidade da Marvel. Logo, o Justiceiro ganhava uma segunda revista, Punisher War Journal, com roteiros de
Carl Potts e arte de Jim Lee, que se tornaria um dos pica grossas da indústria
dos comics. É preciso entender que o Justiceiro do filme de Dolph Lundgren é
basicamente o escrito por Mike Baron e Carl Potts. Nessas histórias, ele
deixava de ser um maluco para ser um combatente do crime tático. Nos anos 80,
época de filmes como Rambo de
Sylvester Stallone e Comando para Matar com
Arnold Schwarzenegger, existia uma cultura da violência, e o personagem da
Marvel surfou nessa onda.
O filme começa com uma rápida retrospectiva
a respeito do assassinato da família de Frank Castle, nessa versão um
ex-policial que se torna um vigilante com o objetivo de vingar sua família. O
responsável pelo assassinato da família de Castle, Dino Moretti, é libertado da
cadeia. No entanto, o carcamano não tem muito o que comemorar, pois, quando ele
chega em sua mansão, o Justiceiro já está esperando. Nesse ponto da história, a
identidade de Frank Castle como Justiceiro não é conhecida por muitas pessoas.
Quem suspeita disso é o ex-parceiro de Castle, Jake Berkowitz, interpretado por
Louis Gosset Jr., que, fora Lundgren, é o único ator mais famoso no filme.
Com Moretti,
despachado pelo Justiceiro, o chefão da Máfia, Gianni Franco, chega a Nova York
para liderar as famílias. O plano do bandido é unir as quadrilhas em uma
operação de narcóticos. Neste filme, o Justiceiro tem um sidekick que é seu informante, um ex-ator shakesperiano pau d’água,
que informar sobre a operação dos mafiosos.
No píer, o
Justiceiro está esperando para mandar os carcamanos para o Inferno. No entanto,
quem dá as caras é a Yakuza, que mela a operação. Castle é dado como morto, e
vários dos mafiosos são eliminados pelos membros da Yakuza. Engraçado é que os
mafiosos são caracterizados como tipos bem estereotipados. Não só a Máfia, mas
a Yakuza também.
Para lembrar que
esse é um filme de quadrinhos, há uns recursos meio excêntricos, como a porta
da sala de reunião dos mafiosos, que se abre estilo porta de vilão de filme de
James Bond. Por ela, chega a oyabun da Yakuza, a
cruel Lady Tanaka, com sua filha adotiva ocidental muda. Tanaka chantageia
Franco e o resto dos mafiosos. É óbvio que o capo não fica satisfeito com essa situação, e a guerra de gangues está
instalada.
O plano de Tanaka
é sequestrar os filhos dos mafiosos, inclusive Tommy, o filho de Franco. O
Justiceiro não quer se envolver, mas, como crianças estão em perigo, sua consciência
não permite, e ele resolve ajudar Franco no melhor estilo “o inimigo do meu
inimigo também é meu inimigo”.
Há algumas cenas
e diálogos antológicos no filme, quando, após ser capturado e torturado pela
Yakuza, o Justiceiro diz para Tanaka que quem o enviou foi o “Batman”. Naquela
época, podiam citar um personagem da DC em um filme da Marvel. Hoje, isso é
impossível.
Outro diálogo
muito bom é quando, após salvar as crianças e ser capturado, Castle diz a seu
ex-parceiro que os 125 mafiosos mortos por ele é “trabalho em progresso”. Quer
diálogo mais a ver com o Justiceiro que esse?
Ao final do filme,
o Justiceiro e Franco invadem o edifício da Yakuza para resgatar Tommy, e Lady
Tanaka está dançando kabuki. Antes, há uma cena dela tocando piano clássico. Eita,
mulher porreta! Castle e Franco acabam com a raça dos subordinados de Tanaka;
inclusive, a filha muda da Tanaka é morta por Castle. Lady Tanaka tenta fazer
com que Franco dê cabo de sua vida, ao ameaçar Tommy, mas providencialmente
aparece o Justiceiro, que mete uma faca na testa dela. Por fim, há aquela cena
clichê de Franco tentar trair o Justiceiro, os dois se engalfinharem e o
Justiceiro matar Franco na frente de Tommy. Ainda há a outra frase antológica
do Justiceiro para o garoto: “cresça e se torne um bom homem, porque senão eu
estarei te esperando”.
Reassistindo ao
filme, dá para notar que ele é B, quase C. Tem uma cara de filme que foi feito
para a TV, mas a gente nota que é tecnologia de película e que realmente foi
exibido nos cinemas. O diretor, Mark Goldblatt, até que tenta fazer seu feijão
com arroz. O filme é bem dirigido, mas nada excepcionalmente. No entanto, as cenas
de ação são muito boas, a exemplo dos efeitos práticos da época. Louis Gosset Jr.
está atuando bem, ainda que no piloto automático. Lundgren, a gente sabe que
não é um ator dramático, mas de filmes de ação, mas ele fica a vontade para
interpretar o Justiceiro no modo zumbi.
Ou seja, o filme
é uma boa diversão até hoje. Não envelheceu muito bem, mas é melhor que vários
dos filmes da Marvel atuais. E também vale como uma referência do Justiceiro
dos anos 80, que era mais raiz. Nota 7 de 10.
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