... O pequeno órfão Billy Batson
recebe os poderes dos maiores deuses da mitologia e se torna o Capitão Marvel!
Opa, um minuto aí. Não posso me referir ao personagem como Capitão Marvel, mas
os leitores antigos o conheceram com esse nome, ou Capitão Trovão, para aqueles
que são bem mais antigos; logo vou tocar nesse assunto e no motivo dessa
mudança de nome, mas para quem o conhece não é nenhuma novidade.
Shazam é um dos mais carismáticos
personagens da DC Comics, com a proximidade da estreia do primeiro filme de
grande orçamento dedicado a ele para o cinema em 2019 tenho uma grande oportunidade
de fazer duas coisas: meu primeiro artigo original para o blog do Ozymandias
Realista, agradecendo o convite feito pelo próprio e o primeiro que dedico totalmente
à história de um dos heróis que mais admiro nos quadrinhos. Curiosamente minha
lembrança maior sobre o personagem vem de um desenho animado produzido pela
Filmation na década de 1980 e de uma saudosa série live-action dos anos 1970 realizada,
também, pela mesma empresa do desenho exibido no Brasil pelo SBT e não das HQs,
simplesmente pelo fato de que ele meio que estava no “limbo” dos quadrinhos
nesses tempos, portanto foram nessas duas formas que o conheci. Para entender
melhor vou voltar no tempo para falar sobre a criação de Shazam.
Com o boom do surgimento dos super-heróis nas HQs no final de década de
1930 nos Estados Unidos, mais especificamente com os sucessos de Superman e
Batman, o roteirista Bill Parker e o desenhista C. C. Beck criaram em 1939 o
Capitão Marvel, que estreou na revista WHIZ Comics #2 em fevereiro de 1940 e
nela somos apresentados ao jovem Billy Batson, um repórter de rádio que é
escolhido pelo mago Shazam como o novo campeão e protetor da humanidade, para
se transformar Billy só precisa chamar o nome do mago e um relâmpago mágico o
transforma no mortal mais poderoso da Terra, com um uniforme vermelho, botas
amarelas e um relâmpago no peito como símbolo do seu poder.
O poder de Shazam vem de seis
divindades cujas iniciais formam a palavra mágica, são estes:
Salomão – a sabedoria: age como um tipo de conselheiro mental para
o herói, ajudando-o a resolver situações complexas ou desvendar mecanismos
intrincados rapidamente.
Hércules – a força: assim como o semideus grego a força de Shazam é
quase ilimitada, fazendo dele um dos heróis mais fortes do planeta, batendo de
frente até mesmo com o Superman.
Atlas – o vigor: segundo a mitologia a resistência de Atlas é tanta
que pode suportar o peso do mundo nas costas, daí a invulnerabilidade e a
capacidade do herói em sobreviver a quase qualquer tipo de ambiente hostil e
resistir até a bombas nucleares, porém no final da saga do Reino do Amanhã ele
se sacrifica para destruir uma bomba ultrapoderosa.
Zeus – o poder: é desse que vem a formação do raio mágico e a
transformação de Billy para Shazam e, como contado nas lendas, Zeus podia mudar
sua imagem ao seu bel-prazer e é uma situação pouco explorada nas HQs do herói,
como se passar pelo pai de Billy uma vez.
Aquiles – a coragem: para enfrentar situações que qualquer pessoa
normal teria completo medo ou pavor a coragem de Aquiles faz com que ele supere
e vença, porém ele não tem um calcanhar vulnerável como o do herói das lendas.
Mercúrio – a velocidade: nada mais precisa ser dito sobre isso,
todos sabem que Mercúrio representa o poder da velocidade máxima, permitindo
que Shazam possa se deslocar a velocidades próximas a da luz.
O INÍCIO
Logo após a primeira publicação
de suas aventuras o sucesso veio rapidamente tornando o personagem um novo fenômeno
das HQs vindo a incomodar a National Comics (na época ainda não era DC Comics) quando
começou a competir diretamente com sua grande estrela: Superman. As aventuras
do menino que se transforma em um poderoso herói de uniforme vermelho e um
relâmpago dourado no peito após dizer a palavra mágica SHAZAM agradou aos
leitores, o artista C. C. Beck se inspirou no ator Fred MacMurray como base
para o herói, o rosto, a altura, tudo caiu como uma luva para formar a
aparência dele e funcionou perfeitamente.
Fora batizado como Captain
Thunder (Capitão Trovão) nos primeiros textos, mas o nome não pode ser
utilizado, uma outra editora tinha um personagem com esse nome e foi mudado
para Captain Marvel, que em inglês significa maravilhoso ou incrível,
dependendo do contexto. Sua revista de estreia também teve problemas com o
nome, iria se chamar Flash Comics ou Thrill Comics e esses dois títulos
pertenciam a outras duas empresas, DC Comics e Standard Comics respectivamente,
finalmente a publicação ganhou o nome de WHIZ COMICS e Shazam foi para as
bancas.
Como citei acima, o sucesso foi
rápido e estrondoso, um verdadeiro trovão. Não demorou nada para que a National
Comics abrisse um processo contra a editora e o personagem acusando-o de ser um
plágio descarado do Superman, creio que, se ele não tivesse feito todo esse
sucesso, teria passado batido e caído no esquecimento. Porém as vendas
cresceram, junto a ameaça de roubar os leitores do Homem de Aço, portanto uma
briga na justiça foi inevitável. A disputa durou doze anos e a Fawcett encerrou
não só as publicações do Capitão Marvel como ingressou em outros ramos
editorias se afastando dos quadrinhos, assim o herói caiu no esquecimento
durante vários anos, retornando somente na década de 70.
MARVELMAN
Nos anos 50 uma editora britânica
publicava uma série de quadrinhos de heróis em formato preto-e-branco,
reproduções de edições americanas, entre eles o Capitão Marvel, que fazia
bastante sucesso por lá também. Com o resultado da disputa e o cancelamento das
revistas do herói, o fornecimento de material foi interrompido, para que o
interesse nas publicações não morresse um escritor de quadrinhos britânico,
Mick Anglo, foi contratado para desenvolver uma versão do herói para os
leitores ingleses. Ele criou uma versão chamada Marvelman, substituindo a magia
pela energia nuclear, o personagem usava a frase KIMOTA para se transformar, o
termo é ATOMIK (atômico) ao contrário, até a Família Marvel ganhou variantes
inglesas: Capitão Marvel Jr. virou Young Marvelman e Mary Marvel, uma versão
masculina batizada de Kid Marvelman. A publicação foi cancelada em 1963,
retornando em 1985 escrito por Alan Moore e rebatizado como Miracleman, a
Marvel americana não permitiu o uso do termo Marvel no nome para evitar
associações com as suas publicações e a editora.
O RETORNO DO CAPITÃO MARVEL –
AGORA É SHAZAM!
Em 1973 a DC trouxe de volta o herói, mas a Marvel já tinha o seu Capitão Marvel desde 1967, portanto a revista teve de ser rebatizada e o termo SHAZAM! se tornou a referência definitiva ao personagem. Juntamente com ele retornou, também, seu ilustrador principal C. C. Beck, o universo das aventuras do herói foi colocado em um mundo chamado Terra S e a explicação para a falta de passagem de tempo desde a sua última aparição em 1953 foi a de que o Doutor Silvana havia colocado ele mesmo e toda a Família Marvel em animação suspensa por 20 anos. Uma medida para deixar o mundo das aventuras do Shazam a parte do restante do Universo DC, evitando envolvimentos com a cronologia ou aventuras com a Liga da Justiça, já que ele vivia em uma Terra paralela, assim suas aventuras poderiam seguir um ritmo totalmente próprio.
A publicação durou apenas 35
edições de tiragem bimestral, durante esse tempo a série passou por modificações
para se aproximar do seriado televisivo que o personagem havia ganho. Algumas
mudanças aconteceram, como o fato de que Billy agora tinha um aparelho especial
para se comunicar com as divindades que compunham a sua palavra mágica, foi
promovido a um repórter móvel com direito a um furgão para se deslocar pelo
país em busca de matérias, o Tio Marvel deixou o uniforme e passou a viajar com
ele sendo uma espécie de “Mentor”, tudo como na série de TV. O mago Shazam
ficou na Pedra da Eternidade, Capitão Marvel Jr. e Mary Marvel ficaram em
Fawcett City como guardiões da cidade. Mesmo assim o cancelamento foi
inevitável.
Depois disso permaneceu por um
tempo sem um título próprio, fazendo aparições em outros como Adventure Comics
e World Finest Comics, a situação durou dois anos até a chegada de Crise nas
Infinitas Terras e Shazam ser incorporado de vez ao Universo DC, dessa vez sem
uma família Marvel como foi mostrada em uma minissérie escrita por Roy Thomas e
com arte de Tom Mandrake, chegou a participar da nova Liga pós Crise formada na
mini Lendas, permanecendo um tempo na Liga Cômica de Keith Giffen e J. M.
DeMatteis. Sendo ironizado constantemente por Guy Gardner, que o chamava de
Capitão Fraldinha, devido a sua ingenuidade e pouca maturidade. Acabou saindo
da equipe pouco tempo depois por se julgar emocionalmente despreparado para a
responsabilidade de fazer parte do famoso grupo.
Em 1994 o escritor e desenhista
Jerry Ordway lançou Power of Shazam! reintroduzindo a existência da Família
Marvel e os seus personagens, apesar de ter sido um trabalho excelente do
artista com o herói usando de bastante humor e traços que resgatavam sua
originalidade e mesmo com sua participação em Reino do Amanhã e a graphic novel
O Poder da Esperança de Paul Dini e Alex Ross dedicada a ele, novamente seu
título regular não vingou e o personagem voltou a ser coadjuvante no Universo
DC. Elementos da sua família foram aproveitados em outros títulos, como o Adão
Negro na SJA, por exemplo. O trabalho de Ordway se destaca por trazer uma
versão contemporânea para o personagem com mais maturidade, a nova vida de
Billy é complicada, órfão, abandonado e vivendo nas ruas depois de ser expulso
da sua casa pelo Silvana logo após as mortes dos seus pais pelas mãos de Black
Adam durante uma expedição arqueológica no Egito; o pai de Billy é chamado de
C. C. Batson, homenagem ao artista criador de Shazam: C. C. Beck e o menino se
transforma em um herói com a missão de descobrir o que aconteceu a sua família
e levar justiça aos seus falecidos pais.
Outras aparições que destacaram o
personagem foram na segunda parte de Cavaleiro das Trevas, onde vemos a morte do
personagem, e na saga especial A Sociedade dos Monstros de autoria de Jeff
Smith, uma releitura cativante da origem do personagem, com roteiro e artes
incríveis o que aparenta ser um material infantil se torna um conto de magia e
ação que homenageia a história do herói, além de trazer uma nova visão sobre o
dilema da criança que se vê forçada a crescer rapidamente não só em tamanho
como em atitude para enfrentar os perigos do mundo carregando o fardo de ter
imensos poderes de um momento para o outro. Para os fãs do personagem é leitura
recomendada.
Os encontros com o Superman
também sempre foram memoráveis, se destacam o combate entre os dois no final do
Reino do Amanhã, em uma sequência de imagens feitas por Alex Ross que se
tornaram um dos melhores momentos da saga e uma mini chamada Superman/Shazam: O
Primeiro Trovão, mostrando o primeiro encontro dos dois heróis e passando a ser
considerada cronologicamente oficial no Universo DC. Também teve participações
nas séries animadas da Liga da Justiça, Batman e em Superman e Batman: Inimigos
Públicos, nos anos 80 teve uma série animada dedicada a ele e ao seu universo
pela Filmation, mesmo estúdio da série live action (aqui que realmente comecei
a conhecer o personagem e o seu universo) e mais uma parceria de animação com o
Superman em O Retorno do Adão Negro. Em Flashpoint, Barry Allen encontrou uma
versão diferente de Shazam e da sua família, agora um grupo de crianças
formavam o herói mágico.
Aliás, essa rivalidade entre os
dois personagens, Superman e Shazam, sempre foi mais uma questão de
popularidade entre os fãs e da guerra de vendas entre as editoras na época,
ambos possuem poderes similares, mas origens bem distintas: enquanto um é filho
de um mundo alienígena extinto e tem a origem dos seus poderes de forma
biológica e explicada cientificamente, o outro é um órfão que ganhou os seus
poderes através da magia ancestral e aí reside uma vantagem do Shazam sobre o
Superman: a magia é uma conhecida vulnerabilidade do Homem de Aço.
Nos Novos 52 Shazam ganhou mais
notoriedade tendo participações importantes nas sagas da Liga da Justiça:
Guerra e Trono de Atlântida, e foi nessa época que Geoff Johns junto com o
desenhista Gary Frank fizeram a sua nova origem pós Flashpoint. Dessa vez Billy
é um órfão problemático que vai para em uma casa cheia de outros párias como
ele, paralelo a isso o mago Shazam está buscando um novo campeão para assumir
os seus poderes e lutar pela humanidade. Após testar vários candidatos em busca
da perfeição sem sucesso, ele acaba encontrando Billy que, com um argumento
sutil, convence o mago a lhe dar uma chance de se tornar o herói: Simplesmente
o mago buscava algo quase impossível na humanidade, a perfeição. Billy
explicou-lhe que não tem ninguém perfeito, apenas pessoas que se esforçam para fazer
o melhor possível para si e para os outros, assim o mago viu nele a semente que
precisava para passar seus poderes, pronunciando seu nome o menino se
transformou no herói. Porém a novidade para o personagem não parou por aí:
Antigamente Billy se transformava no Shazam, uma versão adulta de si mesmo, com
atitudes de gente grande e um coração e alma de menino, dessa vez era o menino
no corpo de um homem, com todo o deslumbramento que uma criança teria ao se
descobrir adulta de um momento para o outro e com superpoderes!
Nessa tacada genial de Johns se
fez o sucesso desse Shazam moderno, o humor e o drama nessa nova fase da vida
de Billy Batson, a formação de uma totalmente nova Família Marvel, seu
comportamento mais malandro das ruas e menos ingênuo fizeram dessa a melhor
versão criada para o personagem. Curiosamente não ganhou um título próprio nos
Novos 52, sua nova origem foi lançada em histórias secundárias no título da
Liga, creio que a editora ainda tinha receios de apostar no personagem dado o
seu histórico irregular nas bancas. Agora a chegada da produção obviamente
inspirada nos Novos 52 e estrelada por Zachary Levi como Shazam, Asher Angel no
papel de Billy Batson e acompanhado de perto pelo novo amigo fã de heróis Freddy
Freeman (Jack Dylan Grazer) que o guia na nova vida de super-herói, a DC volta
a apostar em um título capitaneado por Johns, onde podemos perceber a admiração
e o carinho que o autor tem com relação ao personagem. Depois do sucesso de
Aquaman e dada as recentes reações dos críticos à produção, a empresa parece
ter um novo campeão de bilheterias nas mãos, deixando para trás o universo
sombrio criado para Batman e Superman de Zack Snyder e a malfadada — para não
dizer péssima — tentativa de trazer a Liga da Justiça para os cinemas. Pelo
visto uma nova e brilhante era para os heróis DC no cinema está começando. Diga
a palavra, sinta o poder!
Shazam!
Agradeço ao material coletado no Wikipédia que me ajudou a relacionar a cronologia do personagem.