"Como os homens, cadeias mudam com o tempo. Fui testemunha ocular das transformações ocorridas nos últimos 28 anos."
O médico Drauzio Varella é uma das referências mais famosas do Brasil, seu livro mais recente é o "Prisioneiras", onde ele registra o que vivenciou e aprendeu em mais de uma década de trabalho voluntário em uma penitenciária feminina de São Paulo. Primeiro aviso importante: não gosta de coisas pesadas e chocantes em termos de violência, então fica longeeeeeeeeeee. É MUITÍSSIMO violento. O primeiro capítulo já tem uma prisioneira que esfaqueou a cara da namorada por causa de uma briga por ciúmes, e vai ficando realmente pior, então tenha esse fator em mente.
É interessante imaginar o Drauzio Varella todo nerdzinho trabalhando lá no meio de um monte de criminosas. Esse livro é o fechamento de uma trilogia, ele já havia escrito dois anteriores sobre o sistema penitenciário brasileiro baseado em suas experiências empíricas, o "Carcereiros" e o "Estação Carandiru", que foram até adaptados para filmes e séries. No início o escritor descreve detalhadamente como é a prisão, em uma questão física de arquitetura mesmo, quantidade de funcionárias, presas, celas, andares e afins, eu achei até meio difícil de visualizar, eu só ficava pensando "tá, é uma prisão, é uma prisão". Ele também vai descrevendo o dia a dia, como é a rotina delas, como é o funcionamento de tudo lá dentro. Ele explica tudo detalhadamente em pequenos capítulos.
De vez em quando se destacam histórias mais notáveis, às quais Varella dá mais atenção. É inegável que tem pessoas que entram no mundo do crime pra conseguir lucros fáceis, histórias que o livro aborda também, mas as mais marcantes são de pessoas cujas vidas se encontraram em pontos de pressão, sem opções de sobrevivência, onde o único caminho era recorrer ao crime; sem dúvida as mais impactantes, mostrando os pontos de vista mais tristes do mundo. Vários choques de realidade com o passar de páginas.
Explicado todo o sistema e o que costuma acontecer lá, crimes dentro das prisões, como o tráfico de drogas, as particularidades da hierarquia feminina dentro da cadeia e a forma que elas são tratadas pela família e se relacionam uma com as outras, nos últimos capítulos Varella vai contando algumas histórias de presas em particular que valem a pena. Há a violência chocante, que eu já ressaltei logo no início, e histórias muito boas. Nessas inclusas uma versão feminina do Justiceiro, a Negona e a Tia Maluca, que estou certo que poderiam render ótimos filmes e séries de TV sobre o mundo do crime.
"Doutor, para o bem da sociedade é mais seguro lidar com o crime organizado do que com o crime desorganizado."
Varella faz uma boa pesquisa, usando dados sobre a situação do sistema prisional, do crime e da segurança no cenário mundial, e na história do Brasil, onde tudo só tem piorado. Estando dentro do território há quase três décadas, Drauzio aproveita pra fazer algumas críticas bem embasadas quanto ao sistema. Uma boa leitura, recomendado! Assim como os últimos, esse livro já está sendo adaptado para a televisão, após o sucesso que foram as adaptações dos últimos.
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