Jogo da Imitação - Um Retrato de Allan Turing

  



Alguns me conhecem pelas tradicionais teorias de filmes de quadrinhos, mas hoje gostaria de seguir um caminho no mínimo diferente,  ao analisar o filme Enigma - O Jogo da Imitação, conforme conhecemos uma das figuras mais emblemáticas da história da tecnologia e tbm dos memes, Allan Turing, o Ateu e Homossexual.

Sem mais delongas, vamos então ao texto:

“Homens fortes criam tempos fáceis, e tempos fáceis geram homens fracos; mas homens fracos criam tempos difíceis, e tempos difíceis geram homens fortes”.


Esse popular ditado resume de maneira concreto o panorama geral e define a realidade vivenciada durante o final dos anos 30 e todo a década seguinte no continente europeu, conforme, os ditos tempos difíceis acabam por se concretizar sob a forma da escuridão que se expandia pela Europa e pretendia engolir o mundo, as Forças Alemãs surgiam como uma grande ameaça impulsionada por Hitler, líder da nação ariana, que tinha sua visão pautada em um revanchismo histórico e um espírito nacionalista exorbitante, porém, como já dizia o mesmo ditado, é em meio aos tempos difíceis que surgem homens fortes, e força surgia no lugar mais inesperado, não o popular herói com o coração de ouro disposto a se sacrificar pelos outros, figura que ficou marcado nesse período com o Capitão América, que estrelava os quadrinhos americanos, temos aqui o completo oposto, um retrato histórico de Alan Turing, não um influente político ou soldado com renome, mas um matemático, alguém que até pouco tempo seria lembrado como uma nota de rodapé em livros de história, temos a história do pai da informática, e peça essencial na engrenagem que determinou o destino da guerra, assim, o filme Enigma: Jogo de Imitações, tira ele dos bastidores e nos permite conhecer melhor e entender a importância de Turing para a mundo. 


No longa, acompanhamos o já mencionado personagem, interpretado por Benedict Cumberbatch, responsável por desenvolver o projeto que foi o precursor do computador, colaborando não somente para a informática, mas também contribuindo significativamente para a matemática e meios analíticos, acabou por influenciar também no meio ficcional ao apresentar o conceito da consciência das máquinas, temática central de inúmeras narrativas, a exemplo de Westworld e outras produções cinematográficas. 


A história é apresentada de maneira acrônica, isto é, em tempos diferentes, agregando uma falta de linearidade à narrativa, o que garante uma imersão e um aprofundamento na persona de Turing, conforme acompanhamos três fases distintas da vida do personagem, a principal delas se passa em paralelo a guerra, sendo ela o contexto geral da narrativa, assim, o matemático ganha um destaque, conforme seus projetos salvaram cerca de 14 bilhões de vida, ao se voluntaria para um projeto secreto da Inteligência Britânica, que sofria cada vez mais baixas e sucessivas derrotas militares contra a Alemanha. 


Como já comentando, Turing pode ser considerado o Pai da Informática, assim, ao pegarmos a origem etimológica da palavra que o define, informática, é possível ver que a mesma deriva da junção dos termos “Informação” e “Automática”, com isso, podemos dizer que informação é o ponto crucial para seguirmos a jornada explorada na película, uma vez que na guerra, a comunicação militar era feita por meio de ondas de rádio, algo perceptível a todos, contudo, para evitar a interceptação das mensagens, entrava em cena a codificação, garantindo uma maior segurança ao que fosse transmitido, e tudo isso se devia ao papel do Enigma, maquinário criptográfico utilizado pelos nazistas na transmissão de seus soldados no campo de batalha, assim, surgia o grande problema e motor narrativo, uma vez que era esse elemento, o quebra-cabeça a ser resolvido pelos personagens.


Passando a integrar uma equipe de decodificadores que trabalhava constantemente em Bletchley Park, instalação secreta inglesa aos arredores de Londres. Turing passa a denotar dificuldades de interação social, suas relações e comportamento expõem um reflexo dos problemas da sua infância conturbada, como exposto através de flashbacks, vemos o jovem Alan lidando com sua timidez e conduta introvertida, resultando em apenas uma única amizade, Christopher Marcon, que enveredava-se por caminhos mais íntimos como fica explícito, esse vínculo acaba por ter um fim prematuro, mediante a morte do amigo, o trauma o levou a um caminho de isolacionismo, permanecendo até sua fase adulta, algo que a princípio, compromete a sua relação em grupo, gerando rixas internas e disputas em relação a liderança, ocasionadas geralmente por sua arrogância e  visão contrária a ordens e hierarquias, em demérito ao coletivismo necessário para resolver o Enigma, situação que somente é reestruturada com a introdução de Joan Clarke, que logo torna-se um contraponto ao ego e ao orgulho de Alan, uma vez que ela o torna mais sociável e permite uma suavização de sua personalidade, vemos um processo de humanização, por mais que ele ainda mecânico em certos momentos. Tudo isso foi essencial para o permitir avançar no caminho em prol de solucionar essa cruzada que tinha em mãos. 


E motivado por essa insaciável vontade de resolver o problema da criptografia das mensagens nazistas, ele acaba por ter a brilhante ideia de jogar no mesmo jogo do inimigo, partindo da ideia de que somente uma máquina conseguiria decodificar a complexidade da situação e descobrir a incógnita da equação, ele consegue, de maneira relutante, convencer o comando britânico a concede a verba necessária para pôr em prática o seu projeto de alto custo. Inicia-se assim a construção do equipamento capaz de decifrar as informações, temos então o nascimento do Christopher, apelido em homenagem a seu amigo de infância, denotando uma ligação particular do cientista com a sua máquina, uma intimidade, a base de comparações, podemos dizer que emula “A Criação de Adão” de Michelangelo, conforme fica claro um intimismo na linguagem utilizada, uma relação de pai e filho, este último descredibilizado, porém, Alan acredita em sua cria, ele tem fé que sua ideia irá funcionar, algo irônico diante a sua visão religiosa, mas sua fé acaba por se revelar decisiva no sucesso da missão, conforme ela muda os rumos do conflito, os Aliados passam a ter acesso prévio de todos os movimentos das tropas, frotas e esquadras inimigas, o que possibilita ataques surpresas em série, quase sempre fatais ao adversário desprevenido, uma vez que ao detectar o padrão de comportamento dos Alemães em sua comunicação, o grupo consegue interpretar a mensagem do Eixo e então mudar a maré a seu favor, existia ali uma esperança de garantir a vitória aos Aliados.  


Contudo, nem tudo é um mar de rosas, e Turing sofreu por sua sexualidade, por mais que tenha ajudado a definir o rumo do conflito, ele acaba por se tornar um inimigo do estado ao ir de encontro ao padrão moral propagado naquela época, em específico a respeito de sua orientação sexual, subtrama explorada ao longo do filme, que resulta em sua morte em 1954, após cometer suicídio. Mesmo diante de um final trágico, Alan Turing será lembrado por sua contribuição nas áreas da informática, matemática e por ter sido o ponto de inflexão da guerra, marcando a história de maneira única, um homem que se mostrou forte em tempos difíceis.

 

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