O‌ ‌CIDADÃO‌ ‌ATIVO‌ ‌DE‌ ‌MARGARETH‌ ‌TATCHER‌ ‌VS‌ ‌O‌ ‌CIDADÃO‌ ‌ATIVO‌ ‌DE‌ ‌BOLSONARO:‌ ‌




 Nas últimas semanas tivemos a notícia de que o governo de Jair messias Bolsonaro estaria estudando investir em PPPs (parceria público privadas) para o sistema único de saúde (SUS), logo nas primeiras horas do dia que o edital foi colocado no diário oficial, a oposição e a mídia atacaram ferozmente com o jargão “governo quer privatizar o SUS”. 

Uma olhada rápida no edital do governo mostrava que não se falava de privatizar os serviços do SUS, como atendimento, distribuição de medicamentos, cirurgias ou até mesmo cobrar por consultas. O edital indicava estudos para investir em parceira junto com a iniciativa privada, nos campos de manutenção de infraestrutura e finalização de construção de unidades básicas de saúde (UBS), afinal não é segredo que nosso País está quebrado e caminha para um dívida pública que englobará 100% do PIB nacional. A ajuda para finalizar as UBs principalmente em um período de crise sanitária seria de grande ajuda, todavia em um ato de covardia e claro sinal de fraqueza diante do establishment do senso comum, da mídia e da oposição, Bolsonaro retirou o edital. Com a desculpa de que “havia sido dado muito conteúdo para a mídia atacar o governo”, no mesmo instante que o edital foi retirado me veio a cabeça um outro nome da direta no decorrer da história: Margareth Thatcher.

Não querendo entrar em todos os detalhes da história da dama de ferro, mas quem conhece o mínimo dos feitos do governo conservador de Margareth Thatcher sabe o quanto de oposição, ataques pessoais, e protestos que ela enfrentou, sem abaixar a cabeça e retroceder. 

É um paralelo um tanto quanto interessante de se fazer, para alertar a direita nacional sobre quem deve ser seu símbolo de liderança, mas vamos por partes. 


Comecemos pela década de 80 na Inglaterra: Em 5 de fevereiro de 1988, durante um discurso em Tamworth, o ministro do Interior do governo de Margaret Thatcher, Douglas Hurd, disse que os britânicos tinham que “encontrar, como os Vitorianos tinham achado, técnicas e mecanismos para alcançar aquelas parcelas da sociedade que sempre vão estar fora do alcance dos esquemas e alcances do Estado”, concluindo, que a “chave” para solucionar os problemas britânicos seria o desenvolvimento de um “cidadão ativo”, “inspirador e participativo” em todas as esferas da vida, seja ela pública, seja ela privada e até religiosa, Hurd sintetizaria a ideia de cidadania ativa como : “Cidadania ativa é a livre aceitação pelos indivíduos de suas obrigações voluntárias para com a comunidade”. 

Mas um caminho foi trilhado até que Thatcher e sua base de governo chegassem a lançar a ideia “cidadão ativo”. No período pós segunda guerra a Inglaterra viveu relativa estabilidade política e econômica, tudo porque basearam seus novos parâmetros de crescimento no famigerado  conceito de “welfare state”

A administração trabalhista do pós-guerra de Clement Attlee (1945-1951) foi a responsável por criar um sistema mais sofisticado e amplo de bem-estar social, baseado no “Plano Beveridge” de 1942. o famoso liberal William Beveridge defendia a necessidade de colocar no país um “sistema abrangente e forçoso de segurança social”, baseado em subsídios infantil, educação gratuita, saúde pública e manutenção do emprego. Essas ideias se tornaram a base de todo planejamento social e formulação de políticas públicas no período do pós-guerra. O Estado (e isso seria amplamente aceito) deveria ser usado como meio para implementar conquistas sociais sendo o responsável por ampliar a igualdade. 

Até aqui 0 surpresas todos lutam contra a desigualdade, mas os caminhos para se chegar na diminuição da desigualdade são diversos, e o estado de bem estar social é só um deles.

A Inglaterra chegou nos anos 50 até final de 60 alcançar a marca do pleno emprego, porém com os novos problemas da década de 70, e fator principal a crise do petróleo e o aumento da inflação devido as políticas keynisianas usadas nos últimos vinte anos, as coisas começarão a se tornar  insustentáveis. 

Em 1976, durante uma Conferência do Partido Trabalhista, o então resignado James Callaghan, primeiro-ministro trabalhista da época, declarou: “Nós costumávamos pensar que podíamos nos livrar da recessão e ampliar o emprego reduzindo os impostos e aumentando os gastos públicos. Eu digo a vocês, com toda a sinceridade, que essa opção não existe mais”. Os tempos eram outros.


Nisso abriu-se espaço para  a “nova direita”, A nova direita, não era formada apenas por um tipo de vertente de pensamento, abarcava na realidade,  diferentes perspectivas e visões, tendo suas bases comuns na ideia de evitar as tendências do consenso social liberal do pós-guerra, na recusa do estatismo assistencialista e na crença de que os mercados poderiam garantir melhor o acesso à riqueza e a liberdade, esses valores comuns compartilhados permitiram alianças pontuais entre essas diferentes vertentes de pensamento A novidade dessa nova direita firmava-se não em suas ideias sozinhas, em suas bolhas apenas, mas na forma como o movimento no geral juntava antigos argumentos e transformava-os, de forma prática e eleitoralmente viável, em um conjunto de ideias e conceitos que construía uma imagem alternativa do estado assistencialista, ou sociedade submissa e dependente do estado, não muito diferente do que se pode notar nos movimentos que levaram a eleição de Bolsonaro em 2018 aqui no Brasil.

 Vamos agora, ao cidadão ativo, fato é que o governo conservador de Margareth Thatcher teve que lutar com os problemas de desemprego, inflação, violência e até com um guerra durante seus anos no poder. E  pior que isso, era um governo que para economizar e melhorar as funcionalidades da máquina pública precisava cortar gastos, isso implicava de certo em retirar alguns serviços sociais dos plano de governo, mas como fazer isso em um sociedade já fragilizada economicamente, e com a mente sempre focada na ideia de ver o estado como um salva-vidas que imprime dinheiro ? 

Mesmo que o desemprego em massa na Inglaterra estivesse em ritmo de queda, queda desde 1986, ainda era muito alto no primeiro trimestre de 1987 (não diferente do que vemos no Brasil agora). O desemprego que reinava por tanto tempo se tornou uma doença como a peste negra por lá, ao passo que também impactava nas despesas públicas. Esse contexto levou á esquerda a agir, no final dos anos 1980, com um forte ataque contra as políticas “thatcheristas”, baseados na denúncia de que o governo empobreceu os mais frágeis e ampliava a desigualdade.

  A direita na Inglaterra olhava isso com outros olhos, para eles era um ganho os números de extrema pobreza terem diminuído exponencialmente no país uma vez que para a Nova direita a desigualdade nunca deixaria de existir, era necessário criar cidadãos ativos. Para Thatcher os problemas sociais eram vistos sob a ótica cultural e moral, e não socioeconômica apenas. Isso colocava um limite imenso entre as visões da esquerda para os problemas e da direita para os mesmos problemas, Thatcher enfatizava essa diferença: “Continuamos voltando à ideia de que a pobreza é a causa, e não o resultado de vários tipos de comportamentos irresponsáveis ou desviantes”. 

Apesar de todas as críticas e ataques ao governo  Thatcher seguia com suas reformas estruturantes, seguidas quase sempre de protestos de populares(nem sempre influenciados por políticos de esquerda ou sindicatos), Thatcher não parava pois sabia que por mais que o remédio fosse amargo, a bonança vindoura seria maior. 

Mas as coisas tornavam-se demasiadas insustentáveis, a mentalidade do povo ainda estava estática na praga do welfare-state, foi feita uma pesquisa de opinião pública que verificou a tendência  na opinião popular que a partir da segunda metade dos anos 1980  era  fato  o crescente apoio ao Estado de bem-estar social e à política de gastos públicos era intensa. Isso  que iria influenciar profundamente o surgimento do discurso de active citizenship, juntamente com o novo plano de Thatcher o Social Security Act o plano Além dos atos de corte em gastos públicos, buscava desencorajar o estado de dependência em que se encontravam os usuários dos serviços sociais do estado. De acordo com Thatcher, a administração percebeu, no final dos anos 1980, que o sistema precisaria enfrentar uma reforma ainda maior do que a originalmente planejada, que deveria ser direcionada para um “novo equilíbrio” baseado em um combate direto ao “estado de dependência”, vale notar que o próprio partido trabalhista havia percebido que o modelo de welfare state combatido por Thatcher e os conservadores era realmente insustentável, logo rapidamente, queriam tomar partido da narrativa do “cidadão ativo” ( caso eventualmente chegassem ao poder no próximo pleito). Afinal No início de 1988, a tensão ideológica estava inflada. 

As reformas sociais introduzidas por Thatcher, em notável referência  o Social Security Act, além de intensificarem a luta ideológica, conduziria essa disputa à importante arena de discussões em torno do tema “cidadania.” (temos aqui senhores um verdadeiro exercício da democracia) A reforma foi responsável por direcionar o debate sobre a relação entre Estado e o indivíduo, bem como sobre importantes ideias relacionadas ao conceito de cidadania, sendo alguns destes as linhas tênues entre os “direitos”, “deveres”, “benefícios”, “obrigações”, “garantias”,. O uso do termo active citizenship se deve A luta ideológica em torno do papel do Estado, intensificada e moldada pela introdução do Social Security Act e de outras reformas do governo de Thatcher, estas foram o gatilho para o surgimento do discurso de “cidadania ativa”.

Conclui-se que apesar de levar “surras” da oposição , opinião pública e até aliados, Margareth Thatcher foi a líder que levou a Inglaterra a ter um verdadeiro debate sobre o exercício de democracia e cidadania, o que leva as pessoas a questionarem se realmente precisam do Estado ou não.

 Recuar na primeira oportunidade de mostrar que algo pode funcionar sem a mão do estado, não gera debate algum. A ideia deve ser a de insistir, até fazer o povo pensar sobre o que ele quer, sobre o que ele acha que é bom ou ruim, e criar efetivamente cidadãos ativos. O governo de Thatcher viu que o problema para levar a cabo as reformas era a mentalidade geral do povo e buscou maneiras de mudar isso, conquistando sucesso ao ponto de até a oposição querer usar o plano do governo para se promover. Isso foi possível porque Margareth Thatcher em 11 anos de primeira ministra raramente recuou, colocou sua popularidade abaixo de seus ideais, seu nome abaixo do que era certo se fazer. 

Bolsonaro em poucas horas recuou de um ato que faria a médio prazo o povo se questionar sobre os serviços do estado, e o povo por si acabar escolhendo o que achava melhor ou não, se seria melhor a mão do estado ou a mão de uma empresa privada, claro que tudo isso se deve a praga que é o populismo no brasil, pois onde existe populismo não existe virtude e consequentemente não existe coragem , que é um braço da virtude. A falta de coragem de Bolsonaro não é vista apenas no ato de retroceder várias vezes diante de medidas impopulares aos olhos dá oposição e da mídia, está no fato de que ele envia sem remorso reformas tímidas para o congresso, prefere ouvir a ala desenvolvimentista “fura-teto” do que os critérios técnicos do ministério da economia, e nos ministérios de educação e segurança onde poderia avançar com as pautas conservadoras, coloca dois ministros “tímidos” na frente de pastas fundamentais para a sempre adorada pelos conservadores “guerra cultural”. 

O cidadão ativo de Margareth Thatcher foi ensinado, ao longo de árduos anos a pensar e questionar, o cidadão ativo de Bolsonaro ( e com isso digo o cidadão ativo brasileiro) é coagido apenas a aceitar, e jamais questionar.




Mais textos dele podem ser lidos em seu Instagram: https://www.instagram.com/maskaracientistapolitico/


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