Tia Harriet também ficou famosa por ser a musa do Coringa na antológica dublagem da Feira da Fruta. Tanto que o objetivo principal do Joker, do palhaço, do bobo, era “comer a tia do Bátema”. No entanto, o que nem todo mundo sabe é que ela não é a tia do Batman, era a tia do Robin! No entanto, a dúvida do Coringa é compreensível, pois tanto Bruce como Dick a chamavam de tia na série. E a tia Harriet inclusive é canônica nos quadrinhos, tendo sua primeira aparição em Detective Comics no 328. Trata-se de Harriet Cooper, irmã do John Grayson, pai do Dick.
A introdução da tia Harriet nos
quadrinhos foi bastante bizarra. Ela apareceu para substituir Alfred, que tinha
sido morto. Sim, foi uma ideia para lá de estúpida; já era uma estupidez matar
o Alfred, mas substituí-lo por uma tiazinha era a cereja do bolo de merda.
Apesar de que, do ponto de vista da personagem, fazia sentido ela ir morar na Mansão
Wayne. Afinal de contas, seria muito estranho deixar seu sobrinho adolescente morar
sozinho com um homem mais velho. O problema é que tiraram a tia Harriet do
reto; de uma hora para outra, Dick passou a ter uma tia.
Me pergunto se a tia Harriet teve certa influência da tia May do Homem-Aranha. Acredito que sim; há algumas semelhanças entre as personagens. Depois dizem que é só a Marvel que copia a DC.
A solução dos roteiristas e dos editores
foi “ressuscitarem” Alfred. Tia Harriet voltou a ficar dispensável (na verdade,
sempre foi), mas ainda assim ela permaneceria na Mansão Wayne por mais algumas
histórias, antes de partir de mala e cuia e não deixar saudades.
Entretanto, quando a série do Batman dos
anos 60 foi produzida, tia Harriet voltou ao holofotes. A diferença é que sua
personalidade agora estava “full” galhofa. Tinha se transformado em doce e
atrapalhada senhora, que parecia até uma autista e não percebia nada o que
acontecia na Mansão Wayne. Tia Harriet foi interpretada por uma grande atriz,
Madge Blake; deve-se fazer justiça à atriz, que viveu os primórdios de
Hollywood e faleceu em 1969, pouco depois de a série ser cancelada. Apesar de a
personagem continuar idiota na série, até que ela calhava bem, porque, a bem da
verdade, tudo era idiota na seriado, essa é a verdade, mas idiota na melhor
acepção possível. No clima galhofa e camp
da série, tia Harriet não ficava deslocada.
No entanto, fica a pergunta, por que a
DC quis criar tia Harry e substituir Alfred por ela? Tenho minhas teorias, mas
acho que a razão principal foi que porque acharam que, com uma tutora, Bruce e
Dick teriam o carma do homossexualismo amenizado. Sim, lógico que sei que eles
são heteros; porém, graças ao infame livro A
sedução do inocente, de Fredric Wertham, a sexualidade dos personagens
esteve muito tempo sob escrutínio. Na verdade, eternamente estará, pois a série
de TV dos anos 60 também não ajudou muito, e o anedotário gay sobre o Batman sempre existirá.
Inclusive, a bem da verdade, os
criadores da época contribuíram muito para a fama de homossexualidade da Dupla
Dinâmica. É só ver algumas das histórias da época. Acredito que alguns exemplos
realmente sejam mais de certa inocência, mas outros são mais descaradamente
maliciosos. Minha teoria é que os roteiristas e desenhistas gostavam de colocar
Bruce e Dick em momentos vexatórios como uma forma de vingança contra os
editores da DC Comics (à época, National Publications), uma vez que sabidamente
os criadores de quadrinhos não tinham muitos direitos naqueles tempos e muitas
vezes tinham seu talento criativo explorado.
O próprio Alfred foi introduzido nos quadrinhos um pouco tardiamente. Ele surgiu na série de matinê de Batman e Robin nos anos 40 e só depois foi ter seu debut nas HQs. Nas primeiras histórias, Bruce e Dick viviam sozinhos na Mansão Wayne, o que é uma coisa muito estranha de se pensar. Um homem adulto e um menino morando sozinho, não realmente sendo pai e filho. Com Alfred, meio que se estabeleceu o status quo dos moradores da Mansão Wayne e da Batcaverna: Bruce Wayne/Batman, algum dos vários Robins (Dick Grayson, Jason Todd, Tim Drake, Damien Wayne etc.) e Alfred. A única que tentou furar o clube do Bolinha foi a tia Harriet, e não foi bem-sucedida.
Tia Harriet não foi a única tentativa de
amenizar o carma gay da Dupla
Dinâmica. Houve a introdução da Batwoman e da Batgirl originais, Kathy Kane e
Bette Kane, mas os efeitos disso desencadearam mais galhofa, na verdade. O
puritanismo da Era de Prata arrefeceu o romance meio proibido de Batman com a
Mulher-Gato, um combatente do crime com uma ladra. Claro que esse não foi a única
razão para a criação de Batwoman e Batgirl; havia a intenção de converter as
meninas em leitoras de quadrinhos de super-heróis. Em tempos de lacração e representatividade,
nada disso é novidade. Inclusive, a Supergirl foi criada pela mesma razão. A
diferença é que, no fim das contas, a DC poderia prescindir desse público de
leitoras, se fosse o caso. Hoje em dia, não pode por razões políticas e
ideológicas.
Dessa forma, apenas conseguiram amenizar
a aura gay do Batman na fase de
Dennis o’Neil e Neal Adams, quando ele se tornou o macho alfa deus do amor sem
camisa, pegando a Talia e outras mulheres. Atualmente, Batman está o maior “pinto
louco”, conseguindo mais mulheres que o Oliver Queen, o Arqueiro Verde, e Hal
Jordan. Está certo que o objetivo do Batman não é pegar mulher, ele tem sua
missão, mas, aparecendo na frente, não perdoa. Apesar de que, nessa última fase
escrita por Tom King, o Cavaleiro das Trevas meio que foi transformado em um “mangina”
da Mulher-Gato. Dick Grayson depois também ficou pegador, passando o rodo na
Estelar, Barbara Gordon, Caçadora, Tarântula etc.
É estranha a ideia de que Bruce e Dick
devam ser tutelados por uma autoridade paternal ou maternal, mas essa é que a
verdade. Alfred na época era apenas um mordomo, mas isso mudou muito ao longo
dos anos. Atualmente, Alfred não é um simples mordomo, mas uma representação paterna
para Bruce. Ele na verdade não é nem um homem comum. Há versões de Alfred com
passado de agente do MI 6. Além de ele ter um talento dramático considerável e
quase ter sido um ator shakespeano, pois sua mãe era atriz de teatro. Alfred
ainda presta auxílio tático para o Batman. Em suma, Alfred é o personagem
coadjuvante mais importante das histórias do Cavaleiro das Trevas. Pode-se até
prescindir do Robin, mas não do Alfred.
Depois de tantos anos, tia Harriet foi propositalmente
esquecida, pois, vamos combinar, seria questionável que a única parente viva de
Dick Grayson permitisse que ele fosse adotado por um playboy ricasso solteirão. Ademais, ao contrário do Batman das
eras de Ouro e Prata, que decidiu adotar um órfão como sidekick porque sim, o atual precisaria de uma motivação melhor
para isso, que seria direcionar a raiva de Dick por não ter mais família. Isso
funciona também com Jason Todd, mas com Tim Drake é complicado, visto que,
apesar de a mãe dele ter sido logo assassinada pelo Homem Obeah, o pai de Tim
viveu muitos anos até ser morto pelo Capitão Bumerangue em Crise de Identidade, e é estranho que Batman permitiria que Tim
fosse o Robin tendo um pai que obviamente não aprovaria que ele arriscasse sua
vida como um sidekick.
Na verdade, tia Harriet ainda pode ser
vista em tempos mais recentes, mas apenas na HQ Batman 66, que homenageia a série clássica, e nas duas animações
que tiveram dublagem de Adam West e também referenciavam o seriado dos anos 60.
Enfim, esclarecendo a confusão, a tia
Harriet não é a ti
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