<Texto da Tag “Escritor Convidado”, escrito por: A Doutora>
Existe
uma frase bastante famosa, e erroneamente atribuída à Voltaire, que diz o
seguinte: "Posso não concordar com o que diz, mas defenderei até o fim, e
morrerei se preciso for, para que tenha o direito de dizê-lo". O adágio,
muito conhecido (ainda que com algumas variações) é uma máxima sobre a
liberdade de pensamento e expressão, onde mesmo discordando do outro, não se deve
silenciá-lo. E infelizmente, parece que estamos desaprendendo esta postura tão
básica.
Não
sei dizer se é pelos efeitos das redes sociais, ou se simplesmente a humanidade
está involuindo, mas o fato é que muitas vezes uma simples discordância dá
margem para uma animosidade entre duas pessoas (ou grupo de pessoas) que
possuam opiniões diversas sobre certos assuntos. Brigas, discussões, agressões
e xingamentos estão cada vez mais comuns com o diferente, com o oposto.
Percebo
também que parece haver uma confusão enorme entre fato e opinião. Por incrível
que pareça, muitas pessoas trocam de conceito, querendo transformar um fato
numa opinião, e mais ainda, uma opinião, sua opinião, em um fato. Se você vai a
uma feira e vê um pimentão amarelo, isto é um fato. Se o pimentão amarelo é bom
ou ruim, isso é uma opinião. E não temos todos, direito a uma opinião, e de
expressá-la livremente? Não temos todos direito às nossas subjetividades?
Trazendo
essa reflexão para o nosso submundo nerd, percebo que muitas pessoas têm
dificuldades em entender e, principalmente, aceitar a opinião alheia. Elas
fazem de sua opinião um fato, se fechando para a possibilidade de que outros
enxergam e sentem o mundo com outros olhos, de um outro prisma, e que,
portanto, terá uma reação diferente da sua. E isso é natural. E é saudável. Um
exemplo recente que posso citar é o rage da comunidade nerd com a escalação do
ator Robert Pattinson como o novo Batman. Você pode até não gostar do ator ou
de sua carreira, isso é um direito seu. O que não dá é para você transformar
sua opinião em um fato de que automaticamente o próximo filme do Homem-Morcego
será uma bosta simplesmente porque você não gosta do ator. Assim como tem gente
que gosta e é fã dele, e que gostaram da escalação. E existe uma opinião
"mais certa" do que a outra nesse caso?
Diversos
atores já interpretaram o Batman nas telonas, e você tem todo o direito de
escolher aquele que mais te agrada. Parece haver um consenso de que o Bale fez,
até agora, a melhor versão nas telonas. Mas e se tiver uma pessoa que
genuinamente acha que, sei lá, George Clooney foi o Batman mais legal? Ela
merece ser execrada por isso?
Quando
falamos dessa área nebulosa e cinzenta que abrange a arte e bens culturais, não
existe certo e errado. Existem coisas que nos agradam e outras que não. Você
pode até analisar uma obra tecnicamente, passando pelos critérios avaliativos a
que cada uma é submetida dentro do seu nicho, mas não se ignora o olhar do
observador. Não é incomum um filme, por exemplo, fazer tudo certo tecnicamente,
ser perfeito até (se é que existe tal coisa) e ainda assim não se comunicar com
o espectador. Enquanto outros, mesmo meio tortos, com várias e visíveis falhas,
acabam despertando algo em quem o assiste. Usando um exemplo recente, o novo
Hellboy tem sido massacrado pela crítica como um filme ruim. Isso significa,
necessariamente, que todo mundo que for assistir tem que automaticamente
odiá-lo? E se uma pessoa genuinamente se divertir com o filme, achá-lo bom,
até, ela está errada?
Não
entendo pessoas que sentem a necessidade de atacar ou menosprezar quem pensa
diferente de si, como se fosse o dono da verdade absoluta. Ainda mais nessa
área que estou me propondo a discutir, onde não há isso de verdades absolutas.
Você consegue imaginar duas pessoas brigando porque uma gosta de, voltando ao
exemplo anterior, pimentão, e a outra não? Ou porque uma gosta da cor amarela e
a outra não. Num caso desses, as pessoas tendem a aceitar a opinião do outro
com muito menos ferocidade. Por que não fazer o mesmo se uma gosta do Tom
Holland como Homem-Aranha e você gosta mais do Tobey Maguire, por exemplo? A
postura nesses casos deveriam ser rigorosamente as mesmas.
Eu
sempre defendo que o equilíbrio está no meio. Em todas as áreas. Se formos
racionais demais, corremos o risco de sermos frios, robóticos, sem empatia.
Porém se nos deixamos dominar pelos nossos sentimentos, se não conseguimos
domá-los, nos tornamos passionais, irracionais, voláteis. E ambas posturas são
muito perigosas. Quando ouvimos uma opinião que discorde da nossa, em vez de
atacarmos como se fôssemos o centro do mundo e só nós estivéssemos corretos,
devemos buscar a racionalidade para entender o outro ponto de vista, junto com
a empatia para aceitarmos (não necessariamente concordarmos com) o outro. E
nunca devemos nos esquecer da lição atribuída a Voltaire: Posso não concordar
com você, mas brigarei pelo seu direito de se expressar livremente.
Ufa,
fazia tempo que não escrevia textão assim aqui no canal. Me digam aí: Concordam
comigo? Falei bosta? Deixe sua opinião nos comentários. Ela será muito bem
vinda, mesmo que destoante.
Respeitosamente,
A
Doutora.
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