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ESTRATÉGIA E TÁTICA
“Tática é saber o
que fazer quando há o que fazer; estratégia é saber o que fazer quando não há
nada a fazer.”
- Savielly Grigoyevich Tartakower
Para fazer os
movimentos certos, temos de saber o que estamos buscando, do que estamos atrás.
Nenhuma quantidade de análise poderá nos fornecer a resposta para essa
pergunta. Como observamos, o xadrez tem um objetivo relativamente simples:
vencer o jogo. Para alcançar a vitória, estabelecemos estratégias de jogo e
escolhemos a melhor linha de ação para executá-las. As palavras “estratégia” e “tática”
são rotineiramente intercambiáveis, em desperdício de muitas diferenças
valiosas.
Enquanto a
estratégia é abstrata e baseada em objetivos de longo prazo, a tática é
concreta e baseada na descoberta do melhor lance para se fazer de imediato. A
tática é condicional e oportunista, caracterizando-se por ameaça e defesa. Se
você não explorar de imediato uma oportunidade tática, o jogo certamente irá se
virar contra você. Podemos também introduzir aqui o conceito de “jogada única”,
em que tudo o mais leva à derrota. Temos até um símbolo especial na literatura
de xadrez para anotar uma jogada que era absolutamente essencial. Nem boa, nem
má, nem fácil, nem difícil, mas simplesmente necessária para evitar a tragédia.
Quando seu oponente
comete um erro grave, uma tática vencedora pode surgir de repente e servir como
meio e fim. Imagine um jogo de futebol em que os técnicos tenham passado meses
treinando os jogadores em estratégias e jogadas estudadas complexas. Mas, se o
goleiro do adversário escorregar na grama, coloca-se a estratégia de lado e
chuta-se a gol sem hesitação, uma reação puramente tática.
Um tático sente em
cada reagindo a ameaças e aproveitando as oportunidades no campo de batalha.
Seu problema é como avançar quando não há movimentos óbvios, quando é
necessário ação, não reação. O Grande Mestre polonês do xadrez, o brincalhão
Savielly Tartakower, meio em tom de brincadeira, chamou isso de fase do jogo do
“nada a fazer”. Na realidade, isso é o que separa os embusteiros dos lutadores.
No xadrez, temos a
obrigação de avançar, não há a opção de pular a vez se você não consegue
identificar algo para fazer. Essa obrigação pode ser um fardo para um jogador
sem visão estratégica. Incapaz de formular um plano quando não há crise
imediata, é provável que ele mesmo precipite a crise, geralmente conseguindo
apenas prejudicar a própria posição. Aprendemos com Tigran Petrosian que
vigília inativa é uma estratégia viável no xadrez, mas a arte de espera útil
exige habilidade consumada. O que exatamente você faz quando não há nada a
fazer?
Chamados essas
fases de “jogo posicional”, porque o objetivo é melhorar nossa posição. Devemos
evitar criar fraquezas, encontrar pequenas alternativas de melhorar nossas
peças, e pensar pequeno, mas nunca parar de pensar. Há uma tendência à preguiça
em posições tranquilas, motivo pelo qual mestres posicionais como karpov e
Petrosian eram tão mortíferos. Eles estavam sempre atentos e faziam tudo para
passar longos períodos sem qualquer ação real no tabuleiro, se isso significasse
ganhar uma pequena vantagem, e depois mais uma. No fim, seus oponentes viam-se
sem nenhuma boa jogada, como se estivessem pisando em areia movediça.
Na vida, não há
essa obrigação de movimento. Se não conseguir encontrar um bom plano, pode-se
assistir televisão, continuar trabalhando normalmente e acreditar que a falta
de notícias quer dizer que está tudo bem. Os seres humanos são maravilhosamente
criativos para encontrar meios de passar o tempo de maneira inútil. É nessas
ocasiões que um verdadeiro estrategista se destaca, encontrando meios de
progredir, reforçar sua posição e se preparar para o conflito inevitável. E o
conflito – não podemos esquecer – é inevitável.
A Europa estava
basicamente em paz no início do século XX, e movimentos pacifistas faziam
progressos políticos notáveis nos parlamentos europeus. Enquanto isso, a
Alemanha se preparava para guerra, e o aumento de seu poderio naval igualava-se
e era provocado, em alguns casos, pelo da Grã-Bretanha. O responsável por isso
era o Almirante John (Jackie) Fischer.
A Grã-Bretanha
literalmente dominou os mares por mais de um século e, em 1900, políticos
britânicos e líderes militares encaravam essa superioridade como um fato
consumado. O almirante Fischer, contundo, insistia na modernização da Marinha
Real, construindo os primeiros encouraçados gigantes e incentivando a
construção de submarinos, o que os outros militares do almirantado julgavam
algo indigno e, o que é pior, “antiinglês”.
Fischer, cuja
personalidade guerreira não se adequava aos assuntos do país, teve de
pressionar duramente para realizar seu programa de modernização em tempos de
paz. Ele se reformou em 1910, exaurido não pelas batalhas marítimas, mas pelas
políticas. Foi re-convocado por Wiston Churchill na eclosão da Primeira Guerra
Mundial, em 1914, e, embora a discordância sobre a campanha de Dardanelos tenha
causado a renúncia de Fischer menos de um ano depois, seus anos no comando da
reforma da Marinha Real provaram-se muito importantes.
Hoje, Jackie é
reconhecido pelos historiadores como um dos mais notáveis almirantes da
Grã-Bretanha, e muitas das suas importantes contribuições aconteceram sem
disparar um único tiro. Ele era um estrategista que sabia que não ter o que
fazer não significava não fazer nada.
A tática deve ser guiada pela estratégia
Toda vez que
fazemos um lance, precisamos considerar a reação do nosso adversário, nossa
resposta a essa reação, e assim por diante. Uma tática provoca uma reação explosiva
em cadeia, uma sequência forçada de movimentos que leva os jogadores por uma
viagem delirante. Analisa-se a posição com maior intensidade possível,
calculando dezenas de variantes, as centenas de posições. Um deslize e você é
eliminado.
Podemos comparar
essa situação à de um investidor que precisa decidir entre “comprar ou vender”
uma dezena de vezes por dia. Ele olha os números, analisa o quanto pode, e toma
a melhor decisão de tempo disponível. Quanto mais tempo ele levar, melhor será
a decisão, mas, enquanto ele pensa, a oportunidade de tomar a decisão está
passando.
A tática envolve
cálculos muito difíceis para o cérebro humano, mas, quando você os sintetiza,
eles são a parte mais simples do xadrez e quase trivial quando comparada à
estratégia. São respostas forçadas, planejadas, basicamente uma série de
declarações “se – então”, que fariam um programador de computador sentir-se
inteiramente à vontade. “Se ele capturar meu peão, movo meu Cavalo para e5.
Então se ele atacar meu Cavalo, sacrificarei meu Bispo. Então se...” É óbvio
que, quando você chegar ao quinto ou sexto “se”, seus cálculos tornaram-se
incrivelmente complexos em virtude do número enorme de lances possíveis. A
probabilidade de errar aumenta quanto mais à frente se olha.
Todos nós tomamos
decisões baseadas em uma combinação de análise e experiência. O objetivo é ter
uma visão mais ampla, de modo que possamos avaliar as mais profundas consequências
de nossas decisões táticas. Em outras palavras, necessitamos de estratégia para
manter nossas táticas no rumo certo.
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