Straczynski começa sua excelente fase no Homem-Aranha com Peter e Mary Jane separados. Ela está em Los Angeles investindo em sua carreira artística e ele vai trabalhar como professor em seu antigo colégio, o Midtown. Ao tentar ajudar seus alunos dentro e fora da classe, Peter conhece o misterioso e bem-sucedido Ezekiel Sims que conhece sua identidade secreta e aparentemente possui seus mesmos poderes aracnídeos. Sua repentina aparição tem como objetivo salvar a vida de Peter das mãos do imortal Morlun, que absorve a essência da aranha do corpo de todos que possuem essas habilidades, incluindo Parker.
JMS sai da zona de conforto e faz a seguinte proposta que dá o que pensar: “Foi a radiação que possibilitou que a aranha desse poderes à Peter ou a aranha tentou transmitir seus poderes antes que a radiação em si a matasse? O que veio primeiro: a radiação ou o poder?”. Essa indagação terá repercussões futuras e faz com que a leitura das histórias do Homem-Aranha daqui pra frente se torne muito mais rica, quando levamos em conta essa pergunta. A criação de Morlun para essa trama só enriquece ainda mais a mitologia do Aranha. Um ser que precisa caçar e sugar a energia vital de pessoas com poderes de animais, como se fosse uma espécie de vampiro, poderoso e inabalável que testa a força de vontade do herói aracnídeo além de seus limites. A cada confronto entre eles, fica claro porque o Homem-Aranha é um herói tão querido, e precisa receber o devido respeito. Uma obra prima na longa história de altos e baixos da versão 616 do Homem-Aranha. Leitura imperdível.
Homem-Aranha #36-39, com roteiro de J. M. Straczynski e desenhos de John Romita Jr.
A edição #36 é um especial sobre o atentado terrorista sobre o 11 de setembro de 2001. Confira o comentário do Planeta aqui.
Depois do especial, JMS passa a mostrar as consequências dos acontecimentos do arco anterior. Tia May e Peter Parker em um conversa franca e emocionante sobre a descoberta dele ser o Homem-Aranha. E a edição #39 focaliza nos três principais personagens que Straczynski resolveu trabalhar – o dia-a-dia de Mary Jane em sua vida profissional, Tia May começando a tomar providências pelas calúnias do Clarim Diário e Peter em sua incansável luta pelo crime.
Mais uma vez, JMS mostra que não quer saber de comodismos. Revela a identidade secreta para Tia May, mas não só isso. Mostra de forma muito bem detalhada a maneira em que ela lida com essa situação. É interessante que Peter, como era de se esperar, não entende plenamente os sentimentos de sua tia com relação à descoberta de sua identidade como Homem-Aranha. Nisso, o escritor conseguiu mostrar que conhece muito bem os personagens que tem em mãos. A edição #36 investe no trabalho de Peter como professor tentando ajudar seus alunos, em particular a pequena Jennifer, cujo irmão mais velho é viciado em drogas. É um arco com poucos diálogos, tanto na edição especial sobre o 11 de setembro, quanto na edição #39, que foi uma iniciativa da Marvel em produzir histórias visuais e com praticamente zero de diálogos. Mesmo assim, os méritos dessas histórias são o impacto visual. Particularmente eu gosto da arte do John Romita Jr. e ele conseguiu se dar muito bem, já que precisava transmitir a história praticamente sem diálogos. Histórias comoventes de pessoas nas quais poderíamos nos identificar facilmente. Mais uma leitura imperdível.
Homem-Aranha #46-50, com roteiro de J. M. Straczynski e desenhos de John Romita Jr.
O que o Homem-Aranha fez enquanto esteve no Plano Astral acarreta em graves consequências, liberando a entidade Shathra que representa uma vespa-caçadora, predadora natural das aranhas. Somente com a ajuda de Ezekiel, Peter terá chances de não ser devorado pela fera selvagem. Além disso, MJ resolve voltar à Nova York e reatar seu casamento com Peter, mas antes, o Homem-Aranha precisa ajudar o Doutor Destino em pleno aeroporto!
JMS continua a desenvolver os elementos que ele introduziu no início de sua fase nas histórias do Homem-Aranha. Criar Shathra contribui para expandir essa mitologia aracnídea fazendo com que Ezekiel continue a ser um personagem de importância que terá uma forte influência em breve. Há até participações especiais do Doutor Estranho e do Capitão América. A maneira como o Homem-Aranha reage ao ambiente místico na presença de Stephen Strange e a história da edição #50 com Peter e MJ tentando se entender enquanto o Aranha precisa ajudar o Doutor Destino do ataque de terroristas são momentos imperdíveis. O ritmo continua em alto nível, sem perder o fôlego e esse arco também é leitura obrigatória.
Homem-Aranha #51-56, com roteiro de J. M. Straczynski e desenhos de John Romita Jr.
O arco principal envolve o Homem-Aranha ajudando o veterano mafioso Forelli, ameaçado por uma criatura feita à base de raios Gama e os corpos de vários mafiosos enterrados na década de 50. Após cumprir seu trabalho, é hora de voltar à rotina no Colégio Midtown, onde Peter conhece Melissa, uma aluna com muito potencial, mas com uma vida marcada pelo sofrimento, órfão de pai, e seu irmão mais velho preso pelo próprio Aranha num esquema de roubo de carros. Depois de ser solto da prisão, ele desaparece e, quando o Homem-Aranha sai em sua procura, descobre que Ezekiel está ajudando vários ex-condenados a se ajustarem na sociedade fazendo parte de um projeto secreto de reabilitação.
Esse poderia ser considerado o arco mais “tranquilo” do Aranha, ou uma espécie de interlúdio, e mesmo que tenha sido encarado dessa forma, JMS não esconde o quanto conhece o herói. Suas motivações são colocadas em cheque quando precisa ajudar um velho mafioso que cometeu muitos assassinatos em seu passado, mas que agora corre perigo de vida. Além disso, ter prendido o irmão mais velho de Melissa leva Peter a começar a pensar melhor sobre as consequências de seus atos. As histórias continuam com sua dose certa de ação e combates exigindo o máximo do aracnídeo e as questões morais são mais profundas do que aparentam ser, basta ler com atenção que elas serão encontradas. Mais uma leitura imperdível
Homem-Aranha #503-508, com roteiro de J. M. Straczynski e desenhos de John Romita Jr.
Homem-Aranha #57-502, com roteiro de J. M. Straczynski e desenhos de John Romita Jr.
Esse arco começa dois dias antes do aniversário de Peter Parker. Ele continua lecionando em sua antiga escola, está casado com Mary Jane, a Tia May conhece sua identidade secreta e ele continua a combater o mal e defender as pessoas de sua amada Nova York. Até que, à noite, ele vai prestar ajuda a outros heróis e acaba se envolvendo numa batalha entre o Dr. Estranho e Dormammu. Uma das consequências dessa batalha é que os dois heróis ficam presos num fluxo cronológico temporal, onde o Aranha se vê numa situação em que ele poderia escolher mudar seu passado, e assim, alterar seu futuro, que aparentemente será bem sombrio. Para voltar ao presente, o Homem-Aranha tem que reviver grandes confrontos e situações em sua vida que sempre exigiram muito dele, e ele acaba enfrentando um dilema que, no fim das contas, é seu verdadeiro presente de aniversário.
Não é a primeira vez que Peter Parker vive questões de ordem existencial, principalmente quando se trata da morte do Tio Ben, mas Straczynski o mostra de modo bem sensível, sem ser melodramático demais, e ainda com uma dose certa de humor que é característico do aracnídeo, provando que é um autor que conhece o personagem. John Romita Jr. é um artista sem meio termo, amado por alguns, odiado por outros, mas a verdade é que nesse arco, ele desenhou uma página dupla com o Aranha enfrentando todos os seus principais (e até secundários) adversários – um belo trabalho na edição 500.
Há duas histórias intermediárias nas edições 501 e 502. A primeira é um conto sublime e sensível narrada pela Tia May, onde ela passa suas tardes em companhias agradáveis falando de suas preocupações com Peter combatendo o crime, até a emocionante cena final da edição. A segunda, conta a história de Leo Zelinski, alfaiate oficial de vários heróis e vilões, o que é a parte cômica da história. Ele pede a ajuda do Homem-Aranha para impedir um de seus clientes vilões de cometer assassinato, e ainda tentar manter o anonimato. Essa é a parte tocante onde um cidadão comum tenta fazer o que é certo.
Homem-Aranha #503-508, com roteiro de J. M. Straczynski e desenhos de John Romita Jr.
A dupla JMS e Romita Jr. concluem seu longo arco que começou com a aparição de Morlun e Ezekiel. Afinal de contas, quem realmente é Ezekiel Sims, qual a sua relação com Peter Parker e quais suas verdadeiras intenções? Antes desse desfeche espetacular, o Homem-Aranha ajuda (ou é ajudado?) por ninguém menos do que... Loki, o deus da trapaça para deter o ataque de uma de suas filhas, Tess Black. Esse é JMS mostrando toda a essência que faz do Homem-Aranha, um herói tão conhecido e querido por tantos. Imagine um diálogo entre Homem-Aranha e Loki?! Pois é isso que as edições #503 e 504 mostram de maneira sensacional.
Depois desse arco, JMS continuou por muito tempo nos roteiros de Amazing Spider-Man, mas com outros desenhistas. Houveram arcos controversos como os filhos de Gwen Stacy, que pelo fato de eu não ter lido, ainda não posso comentar e também o pacto com Mefisto que acabou com o casamento entre Peter e MJ, esse arco sendo mais uma imposição editorial do que o desejo do próprio escritor, tanto é que ele parou de escrever a revista depois dessa história. Enfim, nada disso deve apagar essa fase memorável e de altíssimo nível que a dupla JMS e Romita Jr. presentearam os verdadeiros fãs do Homem-Aranha, aqueles que realmente entenderam o que Stan Lee propôs no início da década de 60 para o aracnídeo e toda a sua mitologia formada por personagens coadjuvantes inesquecíveis e vilões ameaçadores. Se você leu as histórias do Homem-Aranha até o arco passado – Feliz Aniversário – então tenha o prazer de ler essa conclusão sem medo de errar. Leitura imperdível.
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